14/11/2018

ANA PAULA LABORINHO








Era dos extremos

A semana foi pródiga em boas notícias, sobretudo se preferirmos a versão otimista dos acontecimentos. A grande cimeira tecnológica regressou a Lisboa e a organização já revelou alguns grandes números: 69 304 pessoas de 159 países, 1200 oradores, 1800 startups, 1500 investidores, 2600 jornalistas.

Existem alertas de que as tecnologias e a inovação apresentadas são, na sua maioria, superficiais e não permitem, por isso, criar valor de forma sustentada, mas a Web Summit coloca Portugal numa rota internacional que serve de impulso interno. A principal advertência foi, contudo, para esta nova forma de desigualdade que, se nada fizermos, cavará um fosso ainda maior entre ricos e pobres.

Boa notícia foi também o resultado das eleições intercalares nos EUA, com uma vitória dos democratas no órgão legislativo, o que talvez permita moderar a ação de Trump na sua fúria belicista. 
Não é apenas a guerra comercial ou a retirada do acordo relativo às alterações climáticas, mas sobretudo o deliberado afastamento dos mecanismos de consenso e solidariedade internacional. Que acontecerá nos próximos dias aos milhares de migrantes, na sua maioria hondurenhos, que caminham em direção à terra da esperança? Além dos militares que os esperam, o presidente dos EUA anunciou que vai diminuir a ajuda à América Central, contrariando a solução de apoiar o desenvolvimento dos países de origem.

Outra boa notícia foi a declaração do presidente eleito do Brasil, na sessão comemorativa dos 30 anos da Constituição, de que esse é o único norte da democracia. Claro que a Constituição não impede a nomeação da nova ministra da Agricultura, conhecida como "musa do veneno" pelo empenho na liberalização dos pesticidas, conforme exigido pelo setor do agronegócio. A lei seguirá agora sem obstáculos, como aliás o candidato prometera na sua política dos três bês: bíblia, boi, bala.

Mas talvez a melhor notícia foi ter reencontrado o livro do historiador Eric Hobsbawm "Era dos extremos", em que analisa o breve século XX que situa entre 1914 e 1991 e divide em três eras: a catástrofe das duas grandes guerras com origem no descrédito das democracias, os anos dourados do pós-guerra plenos de renovação e, a partir dos anos 70, a brutalidade destrutiva do domínio financeiro. 

A vantagem da História é que nos ensina a relativizar o presente e compreender que atrás de tempos vêm tempos e outros tempos hão de vir.

* PROFESSORA UNIVERSITÁRIA

IN "JORNAL DE NOTÍCIAS"
11/11/18

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