Duas palavras-chave têm percorrido esta campanha. Do lado da coligação PàF (PSD/CDS), "estabilidade". Do lado do PS, "confiança". Ora, nem a coligação está em condições de garantir estabilidade depois de 4 de outubro nem os socialistas, relativamente a eventuais acordos pós-eleitorais, inspiram confiança.

Repare-se bem: António Costa tem sido bombardeado pela repetição da pergunta: "Se o PS não conseguir maioria absoluta, com quem pretende chegar a acordo para um Governo de maioria?" Por acaso, ninguém se lembrou de fazer a mesmíssima pergunta aos partidos da coligação. E, no entanto, as sondagens, que persistem no prognóstico de empate técnico, estão longe de sugerir que a atual maioria o continue a ser depois das eleições. O absurdo é tal que, conforme desenvolvemos na página 34, o PS até pode ficar em segundo lugar e, não obstante, ser o partido com mais deputados eleitos. Porque tanto o PSD como o CDS terão de constituir grupos parlamentares autónomos. Ora, a confirmar-se que o Presidente convidará a formar governo a força política com maior número de mandatos, veja-se o "molho de brócolos".

Para ter ambições de regressar ao Poder, o PS tem de conquistar votos dos descontentes à sua direita - os tais que tanto votam PS como PSD - e pescar o voto útil da esquerda. Ora, um eleitor de esquerda não tem a mínima garantia de que, em caso de necessidade, o PS não se coligará com um dos ou ambos os partidos à sua direita. Do mesmo modo, o eleitor do centro, que não quer ver bloquistas nem comunistas na órbita do Poder, deverá pensar duas vezes antes de confiar o seu voto ao PS, partindo do princípio que Costa pode voltar-se para o Bloco ou para a CDU. E, neste caso, ambos os eleitores tenderão a votar à esquerda ou à direita, respetivamente. Não têm nada a perder - e ainda podem contribuir para obrigar o PS a entender-se com um dos lados.

Os socialistas não esclarecem, porque o que querem é forçar, contra todas as sondagens (de que, devido a exemplos internacionais, legitimamente desconfiam ...), uma maioria absoluta ou uma vitória ampla. Por isso, ganham tempo. Oficialmente, admitem governar em minoria, estabelecendo, caso a caso, à esquerda e à direita, acordos pontuais. A solução não é bem-vista pelo PR, mas Cavaco está manietado: a menos de seis meses de ser substituído em Belém, o PR não pode dissolver a AR e chamar, de novo, os portugueses às urnas (tivesse convocado as eleições para junho...). Da mesma forma, o seu sucessor estará, durante os primeiros seis meses de mandato, igualmente inibido de o fazer. Resulta daqui que qualquer governo terá de durar, no mínimo, cerca de um ano. Paralisado na sua ação ou governando para eleições. Perdendo por poucos, Passos Coelho manter-se-á, na liderança, à espreita, na esperança de que a ingovernabilidade do País faça os eleitores voltar ao seu redil. (António Costa, perdendo por poucos, desaparece...). Por seu turno, um PS a governar em minoria, espera dar aos pobres o bodo de algumas medidas populares, cruzando os dedos para que a conjuntura económica lhe seja favorável. Exatamente como fez Cavaco no seu primeiro governo (1985/87) antes de arrancar para a sua primeira maioria.

A atitude de ambas as partes é a de que "no dia 5 logo se vê". Escondem-nos as condições do Tratado Orçamental, que impõem uma troika sem troika. É por isso que o tema "Europa" tem estado ausente da campanha. Ora, o que nos espera são tempos de instabilidade. E o que se recomenda aos portugueses é que desconfiem.

IN "VISÃO"
24/09/15