Mais uma vez,
é o emprego
Os discursos catastrofistas são, além de
manifestamente exagerados, perigosos. Quer isto dizer que tudo vai bem
no reino da Segurança Social? Não, nem por isso. O caminho é duro e os
ventos não sopram a favor. Separemos os problemas, para que não nos
percamos na confusão - quase sempre propositada - do debate.
Foquemo-nos
no sistema previdencial, responsável pela distribuição de rendimentos
com base profissional - as pensões (velhice, invalidez, sobrevivência) -
assente em dois princípios, solidariedade e coesão intergeracional.
Quem hoje trabalha paga a reforma dos seus pais, esperando que os seus
filhos paguem a sua.
Vários fatores pressionam este esquema. O
aumento da esperança média de vida faz com que paguemos hoje mais anos
de pensões. Mas também é verdade que o aumento tendencial dos salários
deveria tornar essa tarefa mais fácil. Depois há a mudança estrutural do
funcionamento da economia, em que a produção é tendencialmente mais
intensiva em tecnologia e capital que em trabalho. Por isso o Bloco
defende, há anos, que parte do financiamento da segurança social deveria
provir de uma taxa sobre o valor acrescentado das empresas, e não
apenas sobre o número de trabalhadores. E chegamos, finalmente, à pedra
de toque da discussão. A sustentabilidade do sistema pressupõe que
tenhamos hoje um número de pessoas a trabalhar e contribuir que seja
suficiente para compensar aqueles que estão reformados.
Durante os
últimos 4 anos nenhum dos pressupostos acima mencionados foi cumprido. A
média dos salários para novos trabalhadores é de 581 euros, brutos.
Havia, em 2014, menos pessoas empregadas que em 1988, e nada foi feito
para diversificar as fontes de financiamento do sistema.
Enquanto
estes três problemas se mantiverem, a discussão será sempre como cortar
hoje para compensar os cortes de ontem. Não é retirando 600 milhões às
pensões de hoje, penalizando ainda mais as condições de vida, que se
resolve o problema de amanhã.
O verdadeiro objetivo da proposta é
safar o défice de agora, mesmo que isso custe rasgar o contrato entre
gerações. Diz muito sobre as escolhas de quem invoca o seu (e nosso) bom
nome para cumprir à letra o contrato de pagamento de dívida pública,
custe o que custar.
O efeito colateral é ir abrindo caminho para o
sistema alternativo: um sistema de capitalização, parecido a um PPR,
gerido por fundos privados, em que cada um poupa para a sua velhice. E
quem não teve salário para isso? Bom, para esses há sempre a caridade.
Para os outros, resta a esperança que a bolsa nunca desça e não arruíne a
reforma de milhões de trabalhadores.
IN "JORNAL DE NOTÍCIAS"
09/06/15
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