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HOJE NO
"PÚBLICO"
A fórmula certa para recuperar solos pobres foi criada por portugueses
Vinte variedades de plantas dão nova vida a solos. As Pastagens Semeadas Biodiversas sugam mais dióxido de carbono do ar, enriquecem a terra e alimentam o gado. Projecto ganhou prémio europeu ambiental
Os agricultores precisam de ver para crer, diz-nos Tiago Domingos. O
professor de engenharia ambiental do Instituto Superior Técnico, em
Lisboa, e director da empresa de serviços ambientais Terraprima
conseguiu que mil agricultores lhe dessem ouvidos. Hoje, em Portugal, há
muitos terrenos onde as pastagens biodiversas crescem. A maioria está
nos montados alentejanos, fortalecendo os sobreiros e prestando um
serviço ambiental a todos.
Estas pastagens capturam uma quantidade anormal de dióxido de carbono,
evitando a acumulação de parte do gás que mais contribui para o efeito
de estufa, responsável pelo aquecimento global. Essa foi uma das razões
para o projecto da Terraprima Pastagens Semeadas Biodiversas ganhar o concurso da Comissão Europeia "Um Mundo Que me Agrada", entre os 269 projectos concorrentes.
Sempre que Tiago Domingos fala sobre este projecto, o nome de David
Crespo surge imediatamente. No púlpito do Teatro Real Dinamarquês, em
Copenhaga, quando na quinta-feira à noite lhe foi atribuído o prémio,
voltou a contar a história do engenheiro agrónomo que, na década de
1960, começou a pensar nas pastagens biodiversas.
David Crespo é hoje director do programa de investigação e
desenvolvimento da Fertiprado, a empresa que fundou em 1990. Em 1966
trabalhava na Estação Nacional de Melhoramento de Plantas. Inspirado
pelas pastagens que os australianos semeavam, onde utilizavam duas ou
três variedades de plantas, o engenheiro começou a pensar como poderia
resgatar os solos pobres portugueses.
"Em Portugal temos imensos solos diferentes. No mesmo hectare, cada
pedaço de terra muda", explica Tiago Domingos. Os topos dos montes são
mais secos e têm menos solo, a terra debaixo das copas das árvores é
mais húmida. A geologia, fundamental na natureza dos solos, é variada no
território português.
David Crespo pensou numa solução holística. O engenheiro agrícola
desenvolveu uma fórmula de 20 variedades diferentes de plantas que,
quando semeadas, respondem localmente. Algumas tornam-se mais dominantes
consoante as condições da terra onde crescem.
O cientista escolheu espécies de leguminosas e de gramíneas. As
primeiras, como o trevo-subterrâneo, têm uma relação simbiótica com
bactérias que se desenvolvem em nódulos nas raízes. Estas bactérias
captam azoto do ar, metabolizam e disponibilizam o azoto à planta. Desta
forma, este nutriente entra no ecossistema sem ser necessário usar
adubos, é depois absorvido pelas gramíneas, que se tornam uma parte
importante do pasto dos animais.
Esta mistura tem uma série de benefícios. Como as espécies são anuais,
resistem ao clima mediterrânico, produzem sementes e criam no solo um
banco de sementes que pode manter a pastagem por décadas. As raízes das
plantas, que também morrem anualmente, alimentam o solo com nutrientes.
Passados uns anos, estes solos triplicam a matéria orgânica. As
pastagens alimentam mais cabeças de gado e captam mais dióxido de
carbono. Também se verificou que os sobreiros que crescem nestas
pastagens são mais saudáveis, e o solo é mais húmido, resistindo à seca.
Estes benefícios foram bem quantificados na última década pela equipa
de Tiago Domingos. Foi assim que se descobriu que as pastagens
biodiversas captam cinco toneladas de dióxido de carbono por ano por
hectare.
A partir de 2008, a Terraprima obteve financiamento do Fundo Português
de Carbono (FPM) para três projectos que envolveram mil agricultores.
Estes tinham de comprar sementes para a pastagem, de aceitar cuidar
delas segundo as regras da Terraprima e recebiam o apoio dos seus
técnicos. Desta maneira, podiam ganhar entre 150 e 130 euros por
hectare, pelo dióxido de carbono que as suas pastagens captam. É uma
ajuda que seduz os agricultores, mas o trabalho só compensa a longo
prazo, com todos os outros benefícios.
Os projectos do FPM já terminaram, mas Tiago Domingos espera envolver
empresas para assim compensarem as suas emissões e a indústria alimentar
para que os alimentos produzidos nestas pastagens tenham uma marca
distintiva. O prémio europeu "pode ajudar a expandir este sistema dentro
de Portugal e em muitos países".
* INTELIGÊNCIA PORTUGUESA
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