12/12/2012

ANA CRISTINA CORREIA GIL

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This is the end 

Paira no ar um sentimento de final de ciclo, de fim anunciado de qualquer coisa – ou de tudo. Faz lembrar a ambiência típica do fim-de-século (tanto do fim do século XIX, como do fim do século XX), em que proliferaram anúncios do Apocalipse, a par do surgimento rápido de seitas religiosas que prometiam proteção divina a quem a elas se juntasse. O espírito finissecular tem, de facto, esta característica dupla: com o derrotismo, o tédio de viver e a decadência coexistem a euforia e a esperança em dias melhores.
Curiosamente é num início de século que estamos a assistir ao regresso deste espírito. No fim do século XIX era o fim da Monarquia em Portugal, a “morte de Deus” nietzschiana, a desilusão com os ideais do Positivismo, e simultaneamente os alvores da República, o reforçar da crença em Deus (veja-se os milagres de Fátima). Não é por acaso que são do fim de Oitocentos obras como “O fim”, de António Patrício, “Finis Patriae”, de Guerra Junqueiro.

Ora neste dezembro frio tem pairado de modo mais intenso esta sensação de fim, que parece tocar todos os campos da nossa vida. É o fim do jornal “A União”, é o fim do “Câmara Clara” (anunciado para o final deste mês), é o fim da vida (só nesta semana deixaram-nos Joaquim Benite, Dave Brubeck e Oscar Niemeyer) e, “last but not least”, até o fim do mundo. É evidente que estes factos não estão todos ao mesmo nível, nem podem ser perspetivados da mesma maneira.

As mortes de Benite, Brubeck e Niemeyer são perdas irreparáveis para o teatro, a música e a arquitetura, mas perdas involuntárias, que não dependem da vontade de terceiros. É sempre triste quando homens que deram tanto à Cultura nos deixam. Mas outros virão, como nos ensina a lei da vida e como atesta a existência de tantos novos talentos que por aí vão despontando. É o renovar natural das gerações. Para além disso, a obra que estes homens nos deixam nunca morrerá, o que é uma garantia da sua perenidade nos nossos corações e na nossa vida cultural.

Já o fecho do jornal “A União” e o fim do programa “Câmara Clara” da RTP 2 são atentados ao direito à informação e à cultura, já que significam mais uma atrofia – voluntária – no cada vez mais exíguo panorama jornalístico português. Tanto o jornal angrense como o programa de Paula Moura Pinheiro prestam (prestavam) um serviço inestimável na divulgação e na informação – uma regional, outra cultural – de um público a quem a partir de agora passa a ser recusado este verdadeiro serviço público que é o de fazer chegar aos sítios mais recônditos aquilo que se passa nos Açores (na Terceira e não só), bem como o que “mexe” na Cultura, portuguesa e não só. O “Câmara Clara” é dos poucos programas na televisão nacional que dá protagonismo e voz aos agentes culturais. Por ele têm passado artistas, ensaístas, críticos, pensadores, que nos têm enriquecido com o seu saber e com a sua experiência profissional e pessoal. Tirar-nos isto é tirar-nos o acesso à Cultura e a quem a faz, a apoia, a mantém viva. É, portanto, tornar-nos mais ignorantes. O serviço público de televisão fica assim inaceitavelmente mais pobre.

O fim do Mundo não me preocupa tanto, tantos têm sido os anúncios gorados. Interpreto-o simplesmente como um sinal dos tempos, um sinal do desespero, da incerteza e da ansiedade que grassam nos dias que correm.
IN "AÇORIANO ORIENTAL"
10/12/12
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