18/10/2024

ANTÓNIO LIMA

 ,


Pelas mãos do PSD
              vem aí a conta
                   da liberalização

Sempre que se deixa ao mercado áreas estratégicas, apesar das medidas mitigadoras, um dia os mesmos que entregaram ao mercado este serviço essencial para as pessoas, gritam que ele é insustentável e que por isso as pessoas têm de pagar mais. Esse dia chegou.

O governo da república decidiu na semana passada impor um limite máximo ao valor do subsídio social de mobilidade. Nada que não fosse esperado. Desde que o ministro das Infraestruturas, Miguel Pinto Luz, disse na Assembleia da República que a imposição de um teto máximo de 600 euros ao preço elegível para reembolso das viagens entre os Açores e o continente que se percebeu que a decisão estava tomada: quem iria pagar a conta eram as açorianas e os açorianos.

A criação de um grupo de trabalho, como tantas vezes acontece, serviu mais para acalmar as reações e deixar a ideia tornar-se, aos poucos, inevitável. Tanto assim é que, ainda sem resultados do grupo de trabalho, a decisão que era preciso tomar foi tomada e publicada em portaria com efeitos imediatos, sem aviso prévio. Que se amanhem passageiros e agentes de viagem!

Os mais crédulos terão talvez sido surpreendidos com esta decisão. Para isso terão ajudado as afirmações (ainda que contraditórias) do ministro das infraestruturas de que nenhum açoriano "pagará mais de 134 euros". Compromisso subscrito pelo governo regional e pelos partidos da coligação.

Lembro-me bem da proposta que o Bloco apresentou no parlamento dos Açores que pretendia que o parlamento se pronunciasse contra quaisquer medidas restritivas à mobilidade, incluindo tetos máximos ao valor do bilhete elegível para reembolso.

A direita chumbou a proposta. Segundo o PSD, pela voz de João Bruto da Costa, já estava garantido pela aprovação de uma proposta do CH que "nenhum açoriano pagará mais de 134 euros para viajar para o continente" e que o Bloco estaria a inventar fantasmas.

O governo, através da secretária regional da mobilidade, Berta Cabral, defendeu o mesmo, recusando que fossem necessárias quaisquer recomendações e tomadas de posição do parlamento sobre o assunto. Tudo estaria garantido e a andar bem, mas mãos dos confiáveis governos da república e regional da AD.

Todos esses compromissos tão sólidos de junho, desmoronaram em setembro e caiu a máscara da mentira que sustentaram esses meses. A intenção de atacar a mobilidade dos residentes nos Açores foi concretizada, o parlamento nem foi ouvido pelo governo da república, um desrespeito pela Autonomia, e a direita impediu que o parlamento se pronunciasse por sua iniciativa.

No dia seguinte, o presidente do governo regional lá veio anunciar possíveis e duvidosas medidas de melhoria do modelo de subsídio social de mobilidade, mas enquanto as que castigam vieram depressa e com aplicação imediata, as outras são promessas que valem tanto quanto as promessas do PSD de que nenhum açoriano pagaria mais de 134 euros. Valem zero.

Perante a fraude recorrente e o astronómico aumento de custos que a liberalização das rotas entre os Açores e o continente decidida em 2015 trouxe ao Orçamento do Estado - por opção do governo da república do PSD e do CDS - eis que se começa o caminho para apresentar a conta aos passageiros residentes.

Sempre que se deixa ao mercado áreas estratégicas, apesar das medidas mitigadoras - como é o subsídio social de mobilidade - um dia, os mesmos que entregaram ao mercado este serviço essencial para as pessoas, gritam que ele é insustentável e que por isso as pessoas têm de pagar mais. Esse dia chegou.

* Deputado do Bloco de Esquerda na Assembleia Regional dos Açores e Coordenador regional do Bloco/Açores

IN "ESQUERDA" - 13/10/24.

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