19/03/2024

SANDRO MENDONÇA

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Militarismo keynesiano

A Europa afasta-se cada vez mais do seu modelo fundador de coordenação para a paz, ao colocar o foco numa ‘economia de guerra’.

Palavras do Comissário Thierry Breton esta semana, 11 de Março de 2024: “Todos mobilizados com vista a uma ‘economia de guerra’ na nossa indústria de defesa.” Antes, a Presidente Von der Leyen falou do fim das ilusões quanto a uma “paz permanente”. Se não forem os tambores da guerra, ouviremos o leve repicar numa tarola.

Algo que é possível reconhecer nos tempos actuais é a emergência de uma agenda de política pública pró-belicista. Vejamos.

Em primeiro lugar, os novos anúncios vindos de Bruxelas podem ser lidos no contexto de uma marcada estagnação. Como é preciso fazer alguma coisa, então estimular a economia por via das despesas militares oferece uma saída. Neste caso, muitos dos proponentes, outrora fundamentalistas do mercado livre, têm de argumentar que estas despesas públicas não são uma carga nefasta, mas que, pelo contrário, permitem gerir o ciclo económico e ser factor de arranque.

Em segundo lugar, a competitividade na Europa força os decisores a encararem os gastos em defesa como um enorme risco adicional às contas externas, pois a maior parte do material no Ocidente é procurado junto dos ponderosos fornecedores da América do Norte. Como a economia europeia perde nas tecnologias de fronteira (IA, carros eléctricos, etc.), então, ainda há aqui um valor seguro para um mercado doméstico muito abrigado e determinado por discricionariedade.

Em terceiro lugar, há muitos custos aqui e são especialmente sombrios. A Europa afasta-se ainda mais do seu modelo fundador de coordenação para a paz. As despesas de Bruxelas serão centralizadas e viradas para os grandes países, já muito preocupados com a sua desindustrialização. Alimenta-se o peso político de uma máquina a que o Presidente Eisenhower chamou “Complexo Industrial Militar”. Geram-se incentivos para encontrar ameaças externas, ao mesmo tempo que, internamente, se identificam já esforços de “controlo social” para forçar consensos em torno do desvio dos orçamentos que iriam para bens públicos.

Tudo isto quando a contestação nas ruas aumenta e os movimentos da direita radical (ou “partidos soberanistas”, o rebranding está em curso) se aproximam da governabilidade, os quais ficarão eximiamente apetrechados de meios securitários quando lá chegarem.

Dizem que se a história não se repete é porque rima. As eleições europeias estão aí, recomendo livros sobre os anos 20 e 30 do séc. XX para o “dia de reflexão”.

* Professor da Iscte Business School

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