28/11/2023

JOSÉ PAULO DO CARMO

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Uma aula chamada
'Os Sopranos'

Quem pensa que é uma série apenas e só sobre um grupo de mafiosos é por isso naturalmente surpreendido, pelos diálogos intensos e mensagens subliminares que nos prendem a cada momento.

Há quem descreva a série sobre a máfia italo-americana como a melhor de sempre, mesmo gravada já lá vão mais de 20 anos. Mas a mesma é muito mais do que um simples programa de televisão. É uma aula sobre a sociedade contemporânea que por mais anos que passem se mantém atual. A relação entre as famílias e os problemas com que cada vez mais pessoas se deparam a nível emocional, as depressões e as dúvidas existenciais, a forma inteligente como a mesma desconstrói já na altura esse dilema da ida ao psicólogo, sobretudo nos homens ou pequenos pormenores como a maneira ardilosa como se tentava escapar à justiça invocando problemas de memória, como no caso do Tio Corrado “Junior” Soprano (será que nos faz lembrar algum caso aqui bem perto?). Um autêntico manual de pequenos casos do nosso dia-a-dia que vamos vendo replicados na vida real e que de uma forma ficcionada nos ajudam a entender um pouco do que nos rodeia, sobretudo a nível comportamental.

A série criada por David Chase para a HBO, acompanha a vida de Tony Soprano e a sua família pouco ortodoxa, viaja pelos seus problemas existenciais, pelo drama do racismo e a desconfiança existente para com os muçulmanos. Retrata de forma clara as desavenças entre pais e filhos e as guerras entre grupos rivais e disseca exaustivamente relações conjugais por entre traições, paixões momentâneas e crises tão típicas entre nós. É por isso difícil, mesmo em programas do género mais atuais, a sociedade ser tão bem retratada nos seus dilemas mais complexos mas sobretudo nas coisas mais simples com que quem a vê se acaba por identificar de uma forma ou de outra. Quem pensa que é uma série apenas e só sobre um grupo de mafiosos é por isso naturalmente surpreendido, pelos diálogos intensos e mensagens subliminares que nos prendem a cada momento.

A gastronomia italiana é outra das particularidades que nos aguçam o apetite e que estão exemplificadas de uma forma absolutamente maravilhosa através das idas ao restaurante Nuovo Vesuvio do melhor amigo de Tony Soprano, Artie Bucco, onde a máfia habitualmente se reúne para jantar mas também nas refeições de família, confecionadas pela sua mulher Carmela. Para quem viu recentemente, com as funcionalidades da internet é recorrente pararmos a série para ir ver ao Google o que é um Ziti no forno, manicotti ou cannoli e de que forma eles fazem a lasanha. A mim cada prato ia-me deixando água na boca, por ser um amante da comida italiana mas pelo aspeto delicioso que nos entra quase “pela boca dentro”. Lembro-me de ficar surpreendido com uma sanduíche Lincoln Log que é uma espécie de cachorro ou com o bife Pizzaiola que não é mais do que um suculento pedaço de carne com mozarela e tomate por cima e que vai ao forno depois de grelhar ligeiramente.

Quem não viu devia obrigatoriamente ver. Vamos sempre a tempo de ver o que vale a pena, sobretudo quando nos aparece algo tão marcante e intemporal. É uma autêntica aula da vida e de cinema com atuações brilhantes de James Gandolfini mas também de Michael Imperioli ( que aparece recentemente no The White Lotus ) e que faz de Christopher Moltisanti ou de Steven Van Zandt o famoso conselheiro de Tony.

* Cronista

IN "iN" - 28/11/23.

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