14/08/2023

NILZA RODRIGUES

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O Silicon Valley das favelas

Chama-se G10 e foi inspirado no G7 e no G20, dos países ricos, com duas nuances: este é sobre favelas e não sobre países, e traz em destaque os pobres, e não os ricos.

Gilson Rodrigues, brasileiro crescido em Paraisópolis, a grande favela de São Paulo que faz paredes-meias com o luxuoso bairro do Morumbi, é o percursor desta ideia. Porque ninguém sonha morar numa favela, porque ninguém gosta de crescer com rótulos - muito menos o de “bandido” -, criou o projeto G10 Favelas, que abraça as dez maiores favelas do Brasil. Juntas, elas têm um potencial de consumo de cerca de 1,4 mil milhões de euros.

A missão é simples: mudar a perceção negativa que associa estes bairros à violência e à marginalidade, catalogando de imediato os seus moradores e castrando as suas ambições de ter uma vida mais digna no futuro.

A grande batalha, diz Gilson Rodrigues, é fazer com que “os nossos dez dólares na favela sejam tão importantes e valham tanto quanto os dez dólares de outro bairro qualquer”.

Parece simples, mas não é mesmo nada. Decidiram por isso desenvolver negócios dentro da própria favela, em setores como a gastronomia, a moda, a comunicação, a logística, o meio ambiente, a sustentabilidade e o urbanismo. E até criaram um banco. O G10 Bank, inspirado no Nobel da Paz e pioneiro do microcrédito, Muhamad Yunus.

Além de fazer com que o crédito chegue à população a juros baixos, o principal objetivo da instituição financeira é ajudar no desenvolvimento das comunidades, por isso tem o compromisso de que 33% do lucro da instituição seja destinado para ações de assistência social precisamente nas favelas.

E a última palavra será sempre do Presidente de Rua - iniciativa na qual um morador voluntário cuida de cerca de 50 famílias e que é um exemplo de como o projeto procura colocar o morador no centro das decisões e garantir que a assistência chegue de forma eficiente a quem precisa mesmo.

E se extrapolássemos esta ideia genial para outros cantos da lusofonia, nos quais as favelas têm apenas nomes diferentes, como musseques ou bairros de lata, onde a economia informal explode, onde somos definidos pelo ambiente em que nascemos, onde a criatividade é potenciada pela falta de recursos.

Sei que sim. Que é nos ambientes de adversidade que mostramos quem somos, o que valemos e como damos a volta por cima. Mas é preciso coragem para tirar este coelho da cartola. Você, que decide, tem?

* Directora da Forbes Portugal e Forbes África Lusófona.

IN "NOVO" - 05/08/23..

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