29/12/2022

JORGE CONDE

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Mudar o Estado...
a que isto chegou

A última semana foi dominada pela notícia que levou à demissão da Secretária de Estado do Tesouro. Nem o facto de estarmos no Natal desviou as atenções de um caso que chocou a opinião pública. Ainda que esteja alguma tinta para correr, parece que, do ponto de vista legal, nada (ou pouco) haverá a assinalar aos acontecimentos que compõem o caso, como seja a saída da senhora da TAP, a sua nomeação para a NAV e a sua posterior nomeação como Secretária de Estado, tudo em 2022.

Parece-nos que é precisamente aqui que reside o caso. Portugal optou por um modelo misto de gestão do Património do Estado e dos seus serviços: os serviços da Administração Direta do Estado, que podem ser centrais e periféricos e que, pelas suas competências e funções, devem estar sujeitos ao poder de direção do respetivo membro do Governo; e o setor empresarial do Estado, constituído pelo conjunto das unidades produtivas do Estado. Nos primeiros, em princípio, vigora o regime de carreiras/remunerações do Estado e aplica-se o princípio de que ninguém ganha mais que o Presidente da República. O sistema remuneratório é claro e definido em Orçamento de Estado.

Nos segundos, aplicam-se as leis de mercado e a comparação deixa de ser com o salário do Presidente da República, para ser com as congéneres nacionais e internacionais e, logo, o salário, nas suas diversas componentes: remuneração, prémios, subsídios, regalias em género, pretende ser suficientemente competitivo para recrutar ou segurar quadros de grande qualidade.

Para quem nada sabe de economia, podemos traduzir que o setor empresarial do Estado concorre com os privados e, para isso, paga como eles. Nada a opor aos direitos dos que no setor trabalham, antes pelo contrário, não fora o seu desajuste para com os deveres.

O cidadão comum continua sem perceber como pode o Estado pagar (sim o Estado) muito acima da média a gestores que têm a obrigação de fazer lucro com as empresas que lhes são entregues e estas continuarem a dar prejuízo dia após dia.

O cidadão comum não percebe que os prémios sejam indexados ao exercício financeiro anual, recebendo os gestores prémios por terem feito melhor que no ano anterior, mesmo que esse melhor seja, tão só, menos prejuízo.

O cidadão comum, que nada sabe de economia, de gestão, de finanças, de cotações em bolsa, continua a não perceber que uma empresa dispense um gestor que não serve os interesses da companhia e para isso lhe tenha que pagar mais do que a lei prevê para o comum dos mortais.

O cidadão comum não percebe que alguém com competência para Secretário de Estado possa ser dispensado de uma das empresas do Estado que muito prejuízo deu nas últimas décadas, com uma indemnização que um português que ganhe o ordenado médio demora 21 anos a receber.

Um governo de maioria absoluta, com ainda quatro anos de mandato pela frente, pode e deve mudar o Estado: a administração direta do Estado, o setor empresarial do Estado e o estado a que alguns fizeram isto chegar...

* Presidente-Instituto Politécnico de Coimbra

IN "DIÁRIO DE NOTÍCIAS" - 29/12/22.

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