09/11/2022

LUÍS OSÓRIO





 
Postal do dia

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Há muitos anos um jornalista apanhou François Mitterrand nas escadarias do Eliseu. Para surpresa do Presidente francês perguntou-lhe se confirmava que Mazarine era a sua filha ilegítima.

Mitterrand travou o passo, sorriu sem sorrir, e num quase silêncio respondeu com uma outra pergunta.

"E então?".

Continuou o seu caminho e nunca mais ninguém lhe perguntou acerca da sua vida privada.

Como é óbvio, nunca escolheria para tema o filho de Nuno da Câmara Pereira, um bebé que nasceu fora de um casamento de quase 50 anos.

É do domínio da sua vida privada.

Não há nada de mais sagrado do que isso. É um assunto que deve resolver com a sua família, os seus filhos e com quem quiser.

Só que Nuno da Câmara Pereira é um personagem que faz muitos juízos de valor sobre o mundo e sobre os outros.

É porque as mulheres não podem usar saias curtas ou por achar excessivo que Cuca Roseta use a roupa que usa.

É porque os homossexuais só o são por moda - recordo que chegou enquanto deputado a propor a abolição do dia contra a homofobia.

É porque a família é sagrada, assim como o respeito pela palavra de Deus.

É porque nas suas redes sociais faz menção a ciganos ou à cor da pele do primeiro-ministro português e inglês.

Nuno da Câmara Pereira irrita por fazer com os outros aquilo que agora não gosta que lhe façam a si.

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Mas ainda assim, nunca escreveria este postal apenas por estas pequenas contradições, pecadilhos, paradoxos.

Aliás, até me parece que Nuno procedeu bem ao assumir o nascimento do filho, ao registá-lo com o seu nome. Fez bem e mostrou estar à altura do que a vida lhe pedia.

Só que Câmara Pereira é uma pessoa coerente. E a coerência, como o sabemos, não é uma boa notícia se as pessoas defendem coisas absurdas e irracionais. Quando as pessoas coerentes pensam mal, a sua coerência não é uma boa notícia.

Conto-lhe também, num importantíssimo aparte, que Nuno da Câmara Pereira é agora Bragança e Bourbon. Nuno anunciou que a mudança era de uma enorme justiça em relação aos seus direitos, desígnios e obrigações históricas.

Percebi que talvez possa aspirar ainda a ser rei, quem sabe?

Estou a desviar-me.

Quero falar-vos do texto que publicou nas redes sociais a propósito do nascimento do seu quarto filho, fruto de uma relação com uma mulher 40 anos mais nova.

Passo a citar.

"Alegria e vida são e sempre serão o cerne da felicidade. Meu exemplo maior é o futuro que me aguarda. E se a natureza me proporcionou pôr à minha disposição o bem maior que é a vida e a vitalidade, só tenho de agradecer e ser reconhecido por Deus. Bem haja, Pai Nosso que estás no Céu!!!!. Amém".

É mesmo verdade.

Nuno da Câmara Pereira, perdão Nuno de Bragança e Bourbon, aproveitou a ocasião para falar da sua virilidade, a que chamou vitalidade. E aproveitou também para legitimar as suas ações com a aprovação e o beneplácito divino.

Repito: "Bem-haja, pai-nosso que estais no céu". "Só tenho de agradecer e ser reconhecido por Deus".

Esta malta, e só por isso escrevi o postal, julga-se superiora e ungida por Nosso Senhor. Fala de Deus, da família, do respeito pelos filhos, da importância das missas, das comunhões, da moralidade, dos incensos, mas depois é um ver se te avias.

O que Nuno quis dizer foi que a obrigação de um homem como ele, de sangue azul e virilidade comprovada, é espalhar a boa nova, a semente do patriotismo, dos bons valores e do sangue dos ungidos.

Perdoai-lhes Senhor. Porque não há mesmo paciência.

* Jornalista

IN "TSF"-03/11/22 .

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