12/03/2022

FELISBELA LOPES

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Os verdadeiros heróis

Por estes dias, olho as imagens da guerra na Ucrânia a muito custo, mas preciso muito de as ver para me aproximar de um sofrimento que sei que está muito para lá do imaginável. Nunca vou entender como é possível ir tão longe nas atrocidades cometidas... Aquilo que os jornalistas e os próprios ucranianos mostram traz para perto de mim a dureza de um tempo que julgava ultrapassado. Como estava enganada!

O depoimento de uma mulher russa deixado nas redes sociais nos primeiros dias deste conflito é recuperado pelo escritor francês Emmanuel Carrère que, esta semana, faz a capa da revista L"OBS. "Quando era pequena", escreve essa mulher de nome agora oculto, "sonhava que me escondia na cave de uma casa bombardeada. Aqueles que nos atacavam eram os nazis. Tinha medo que me encontrassem e que me matassem à semelhança do que fizeram à minha família. Depois do início desta guerra recuperei este tipo de sonhos. Mas agora sou eu a nazi". Este trecho é terrível. Todavia, destapa muitos lados da atualidade: o medo do povo russo em falar publicamente, o desalinhamento com Putin, a identificação com o povo ucraniano...

Na revista Courrier International, declara-se que os verdadeiros europeus são os ucranianos, porque nos relembram a existência de coisas em relação às quais vale a pena sofrer. Como a liberdade e a democracia. Os ucranianos inspiram-nos, escreve na mesma edição o escritor e jornalista eslovaco Martin Milan Simecka. Sentimos uma enorme admiração em relação àqueles que ficam e àqueles que partem de um país despedaçado. Porque ambos os lados precisam de muita coragem. E de uma colossal resiliência. Eles são, na verdade, os heróis desta guerra. Claro que também admiramos a determinação de Volodymyr Zelensky. A revista Time assegura que este homem não uniu apenas o seu país, mas aproximou mais a Europa de si própria e criou pontes num Ocidente que se enchia de brechas.

E quando acabará este inferno? Eis a pergunta cuja resposta ninguém ousa avançar.

Os média internacionais colocam alguma esperança numa revolta vinda do interior da própria Rússia que poderia ser urdida pelos oligarcas que veem agora as suas fortunas a fugir do controlo devido às pesadas sanções impostas em vários países. Talvez fosse mais assertivo olhar para a força dos cidadãos que estão a mergulhar numa crise económica por uma guerra que nunca quiseram defender. É verdade que essa gente não tem liberdade para falar, nem tão-pouco os média russos conseguem rasgar o espartilho do controlo da informação, mas a revolta de um povo nem sempre pode ser reprimida...

*  Prof. Associada com agregação da UMinho

IN "JORNAL DE NOTÍCIAS" - 11/03/22.

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