13/02/2022

LUÍS NEWTON

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A hora da reflexão

O PS habituou os portugueses a uma arrogância desmedida, a um desprezo pelos outros partidos, que de prática democrática pouco terá.

Passadas que estão as eleições autárquicas e decidida que está a maioria absoluta do Partido Socialista, a reconfiguração da geografia parlamentar apresenta-nos uma nova realidade com que teremos de conviver nos próximos (previsíveis) quatro anos e muitos meses.

Muitos discutem o futuro do PPD/PSD, um dos derrotados na noite de 30 de Janeiro, perante um resultado que ninguém imaginou. E se é verdade que a reflexão no partido terá de ser profunda, a discussão interna terá de se fazer e novos caminhos terão de ser traçados para uma rota segura, também não é menos verdade que todos os outros partidos deveriam igualmente refletir.

Começando pelo partido que alcançou a maioria absoluta.

Se é certo que António Costa, atual e futuro primeiro-ministro, afirmou na noite eleitoral que a maioria absoluta não significava poder absoluto, será interessante verificar se a declaração terá adesão à futura prática.

Sem maioria absoluta, o PS habituou os portugueses a uma arrogância desmedida, a um desprezo pelos outros partidos, que de prática democrática pouco terá. 

Na autarquia de Lisboa, apesar da derrota eleitoral de Setembro, essa postura não se modificou, como se aperceberá quem acompanhar, mesmo com mediana atenção, a atuação dos vereadores socialistas. O mesmo se aplicando aos deputados da Assembleia Municipal de Lisboa. A lição parece difícil de interiorizar.

Por isso será tão interessante acompanhar a atuação do futuro governo, agora com uma real maioria absoluta. Será uma maioria dialogante? Tenho as minhas dúvidas.

Os partidos à esquerda do PS sofreram uma erosão, talvez fácil de explicar. Por motivos diferentes.
O PCP, porque vai perdendo a sua base eleitoral sem conseguir captar o interesse dos jovens, que não se revêm no discurso de operários e camponeses de tempos passados e não partilham do seu conservadorismo ortodoxo. 

O BE, tendo nascido como um partido de protesto iludiu-se com um crescimento para que, de facto, nunca esteve preparado. Deixou-se inebriar pela ideia de que, apesar da sua relativamente fraca expressão eleitoral, podia governar e ditar os destinos do país, com uma irracional arrogância. No fundo, a tal rã que queria ser boi, citada pela sua própria líder.

Na esquerda surge ainda o Livre, que já muitos apelidam de “esquerda fofinha”, pelo discurso utópico que, inexplicavelmente (ou não), nos leva a imaginar unicórnios a saltitarem em campos de margaridas.
Com o sonho da “eco gerigonça” a esfumar-se antes de nascer, veremos o que nos reserva.

Quanto à direita, desapareceu da AR um dos partidos fundadores da democracia e consolidaram-se dois.
Um, o Chega, partido de protesto, umas vezes de extrema-direita outras só com a esperteza de dar voz a conversas de café, reuniu à sua volta o descontentamento dos que se sentiram abandonados, por um motivo ou outro.

O IL, democrático e bem mais estruturado, conseguiu atrair muitos jovens pela mensagem de esperança no futuro que transmite, mas as preocupações sociais mostram-se demasiado ausentes do seu discurso e obrigarão a uma adequação ao país real.

Por fim, o PAN, partido que demonstrou ter uma forte tendência proibicionista e uma estranha incapacidade de se posicionar assumidamente à esquerda ou à direita, apesar da convicta defesa da atuação do PS, regressou à casa de partida.

Motivos de reflexão não faltarão aos partidos, aos responsáveis políticos e, no fundo, a todos os cidadãos. 

* Presidente da concelhia do PSD/Lisboa e presidente da Junta de Freguesia da Estrela

IN  "iN" - 10/02/22

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