05/06/2020

ALEXANDRA VIEIRA

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Da distância que 
é mesmo distante

Nem a preocupação de tornar o distante perto nem a aproximação dos portugueses e portuguesas que se encontram em diáspora, parece ser uma preocupação do Instituto Camões e até do Ministério da Educação que tutela as escolas portuguesas espalhadas pelo mundo.

Da distância que se faz perto já muitos versaram. Das saudades que se esbatem através de novos modos de comunicar a distância já todos os conhecemos. No entanto, nem a preocupação de tornar o distante perto nem a aproximação dos portugueses e portuguesas que se encontram em diáspora, parece ser uma preocupação do Instituto Camões e até do Ministério da Educação que tutela as escolas portuguesas espalhadas pelo mundo.

Em má hora e má memória, os portugueses e portuguesas foram convidados a emigrar. Muitos fizeram-no na mesma senda de sempre: procurar melhores condições de vida. Porém, se na década de 60 e 70 do século passado, quem emigrava era quem vivia na mais extrema pobreza, à qual estava associado o analfabetismo, hoje a situação é muito diferente.

Esta última vaga migratória deu-se pelos mesmos motivos, mas os netos dos que ficaram e não “deram o salto”, são muito diferentes: já tinham vivido bem e tinham muito mais escolaridade que os seus pais e avós. Eram e são, na sua maioria, licenciados. Não entanto, tiveram de partir para sobreviver. Se na vaga migratória de 60 e 70 os empregos eram na construção civil e nas limpezas, nesta, que aconteceu nem há dez anos, as ocupações são as que requerem formação superior.

Paradoxalmente, a geração portuguesa melhor formada de sempre foi obrigada a partir para outros países em busca de emprego. No seu país, Portugal, cortes e austeridade assoberbavam de trabalho uns e despediam outros. Que alternativa se não emigrar? Houve quem tivesse o desplante de lhe chamar oportunidade! E, mais uma vez, os portugueses e portuguesas abandonaram o seu país, deram o seu melhor nas mais diferentes profissões e, para satisfação de todos nós, até ajudaram a salvar a vida de personalidades de vulto na atual situação pandémica.

E o que tem feito o Instituto Camões para manter a ligação dos filhos dos emigrantes a Portugal, à língua e à sua cultura: eterniza a austeridade. Será o fim da presença da língua e da cultura portuguesas nas comunidades de emigrantes? De asfixia em asfixia, assim será.

De há muito que o Bloco de Esquerda chama a atenção para os problemas do ensino de português no estrangeiro (EPE) proporcionado pelo Instituto Camões. Além de os pais terem de pagar uma propina e de suportar o custo dos manuais, os tempos semanais foram reduzidos a 50 ou 90 minutos, aos sábados, com necessidade de um número cada vez menor de professores. Este modo de atuação indicia desinvestimento na manutenção da dinâmica de tornar o distante um pouco mais perto e, sobretudo, desincentiva, quer a manutenção dos laços, quer o desenho de estratégias de fazer regressar a geração melhor preparada de sempre e bem como os seus filhos, já nascidos na diáspora, antes que seja tarde de mais, a um país a braços com o problema do envelhecimento populacional.

E o que faz o Ministério da Educação? Não mostrou o menor cuidado em diligenciar que o canal Memória, através do qual está a ser divulgada a telescola, mais conhecida como “estudo em casa”, seja transmitido por cabo noutros países e deu indicações vagas e sintéticas de como deveria ser o EPE [Ensino de Português no Estrangeiro] no regime de ensino a distância. Registe-se que os filhos dos portugueses que emigraram já têm idade para frequentar o primeiro ou segundo ciclos do ensino básico.

Podemos dizer, sem grande margem para erro, que estes pais e mães são zelosos das aprendizagens dos seus filhos e filhas na sua língua de origem, mas sentem que na situação de crise pandémica foram completamente abandonados pelo Estado português, a última entidade que deveria fazê-lo.

Ambos abandonaram aqueles que dizem que querem fazer voltar. Nada indica que esteja a ser feito um levantamento do número de alunos que deixaram de aprender português desde março, quantos professores pertencem aos grupos de risco, se há outras dificuldades e lacunas. Parece que o que não ficou por esquecer foi a cobrança da propina dos alunos já inscritos no próximo ano letivo, que ainda não se sabe em que moldes funcionará, incluindo os procedimentos concursais para o recrutamento de professores.

Ainda assim, a maior perplexidade de todas continua a ser a separação entre os alunos que aprendem português através do Instituto Camões, que pagam propinas e manuais e têm aulas uma vez por semana e que está sob a alçada do Ministério dos Negócios Estrangeiros e os que frequentam as dezenas de Escolas Portuguesas que existem nos países de língua oficial portuguesa, sob alçada do Ministério da Educação. Segundo dados de 2019, no conjunto total das escolas portuguesas, estudam cerca de 6.000 alunos de várias nacionalidades e lecionam cerca de 500 professores.

 Para preservar os laços das pessoas em diáspora com Portugal, a aprendizagem da língua e da cultura portuguesas são essenciais. Mas também o são a democracia, para a cidadania e para a participação. Vivemos um tempo excecional para o qual ninguém estava preparado. Porém, passado o choque, é tempo de tornar a distância mais perto e de não deixar ninguém para trás.

* Professora

IN " plataformamedia.com"
03/06/20 

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