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* Politóloga, ISCTE-IUL
IN "O JORNAL ECONÓMICO"
02/03/20
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Da esperança na Democracia
Um argumento interessante a reter: a distribuição igualitária de recursos dentro dos Estados não é o que verdadeiramente importa, mas sim um reforço da posição da classe média dentro da sociedade.
No mundo que nos rodeia, e nas suas intrínsecas contradições, ao dia
de hoje, penso que mais do que nunca é importante falar de esperança.
Talvez por ser nestes momentos, de tantas contradições, em que para se
ter força se impõe ter esperança.
Aí reside a essência, aí reside a
dificuldade. De certa forma, a história da(s) democracia(s) também é um
conto assente em esperança. Nada mais anda de mão dada com a ideia de
esperança do que os valores democráticos. Pelo menos é essa a minha
perspectiva. A esperança constrói-se no passado para se projectar no
futuro.
Ainda em 2019, surgiu um livro (mais um) sobre a
Democracia e merece ser referido por várias razões, entre as quais
porque se alicerça no passado. Estou a falar de “Democracy and
Prosperity: Reinventing Capitalism through a Turbulent Century” dos
conhecidos académicos Torben Iversen e David Soskice. Este livro é sobre
esperança e, independentemente do posicionamento ideológico de cada um
de nós, a sua argumentação é, no mínimo, relevante.
Resumindo de
forma muito simplista, os autores argumentam que a resistência das
democracias se baseia no capitalismo, como se o capitalismo fosse o
alimento para a Democracia como a conhecemos. Este argumento é ainda
mais interessante quando vemos tanta literatura produzida sobre as
reacções “não democráticas” daqueles que, sendo prejudicados pela
globalização e logo pelo capitalismo, começam por apoiar líderes e
movimentos não democráticos.
Concordemos ou não com a abordagem
dos autores, não deixa de ser bastante elucidativa a análise histórica
feita pelos mesmos, como se a democracia direccionasse o capitalismo
desenvolvido no último século, e vice-versa.
As mudanças sociais
dos últimos tempos, porém, possibilitam outras interpretações do que
está a ocorrer no mundo. Talvez devêssemos falar numa deterioração do
capitalismo. Mas quer seja verdade futura ou não, a ideia que os autores
assinalam como particularmente relevante em Democracia não deixa de ser
importante: a distribuição igualitária de recursos dentro dos Estados
não é o que verdadeiramente importa, mas sim um reforço da posição da
classe média dentro da sociedade.
Hoje em dia tudo me parece um
teste à democracia como tem sido idealizada no mundo ocidental, desde a
presidência de Trump nos EUA ao Brexit, até à forma como alguns países
têm lidado com a propagação do coronavírus. Esperança, há, mas não sei
bem se baseada numa certa interpelação entre um “bom”(?) capitalismo e a
Democracia, ou em acasos que vamos acabar por perder de vista.
* Politóloga, ISCTE-IUL
IN "O JORNAL ECONÓMICO"
02/03/20
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