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Violência no namoro
São demolidores os dados apresentados na
sexta-feira pela UMAR (União de Mulheres Alternativa e Resposta) acerca
da violência no namoro. 67% dos jovens que inquiriram consideram normal
que suceda, e cerca de 58% afirmam já ter sido vítima. Claro que vamos
continuar a especular acerca da economia mas, de alguma maneira, se não
cuidarmos disto não há muita razão para mais nada. Toleramos uma
patológica versão da sociedade: a desumana.
Uma
vez já é demasiado. Urge trabalhar a autoestima dos jovens para que
saibam que uma vez já é demasiado. Sem prepotências nem melindres, a
autoestima tem de ser sobretudo lucidez em relação ao que se espera de
uma companhia. Como é possível que saiam os jovens de casa sem
recomendação fundamental de cuidado, não entendo. Ainda acredito que nos
possamos reconhecer como uma vasta multidão de brio que julga educar
para o respeito, conhecimento e cultura. Se isso acabou e os jovens
estão a ser criados para se digladiarem até à miséria, então já não
entendo nada.
O estabelecimento de uma
relação afetiva é a assunção de uma circunscrição de paz. Mais do que
afirmar o amor, a relação tem de ser um acordo de paz. Porque as paixões
mudam, a vida atribui cansaço e magoa de qualquer jeito. O que
justifica o par e o que glorifica a família é a sua tácita valentia
contra agressões externas, como se o afeto pudesse aludir a uma barreira
erguida para defesa.
Não pode ser uma barreira para confinar os que
amam à agressão. Essa é a perversão absoluta do seu propósito.
Não
basta que o Estado lance campanhas de sensibilização para esta
desgraça. É preciso que nos mobilizemos em todos os gestos, em todas as
conversas, para mudar os discursos embrutecidos que convencem que a
cidadania hoje é ressabiamento e retaliação. É preciso que em todas as
situações nos coloquemos como essa multidão de brio, sem prepotência nem
melindres, apenas a lucidez de que isto valerá a pena se continuarmos a
ser um projeto verdadeiramente humano. Senão, vale mais que permitamos o
regresso das matas densas e dos bandos de pássaros que usam as
estações.
Quando falo com alunos em
escolas que visito sempre insisto na ideia de que me parecem bravos os
que elogiam. Covardes são os que menorizam os outros. De facto, poucos
são os que, de imediato, conseguem escolher um colega para assumir
admiração e respeito. É pior do que triste. É a pessoa a crescer ao
contrário. Só se explica se vierem de casa com o mesmo padrão de ataque e
incapacidade para a declaração de um franco, límpido, afeto.
* Escritor
IN "JORNAL DE NOTÍCIAS"
16/02/20
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