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IN "O JORNAL ECONÓMICO"
20/09/19
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Feios, porcos e maus
Não sei
se algum dia alguém fez as contas aos milhões que se perderam em actos
de corrupção e desconheço se existe interesse público em tal.
(Por
ocasião da publicação de uma entrevista rápida que dei a um jornal
desportivo, entrevista esta em que o tom era de brincadeira e de
trocadilhos, fui novamente objecto de um chorrilho de disparates, vindos
de alegados membros do mesmo clube que eu. Uns dias antes o alvo foi o
Presidente da Comissão que integrei, igualmente por causa de uma
opinião, com a qual, aliás, não concordo. As pessoas desaprenderam de
esgrimir argumentos e limitam-se a chamar nomes e a apregoar mentiras.
Se as redes sociais se tornaram um esgoto a céu aberto, onde, a coberto
da liberdade de expressão, as pessoas acham que podem ofender os outros,
o que é certo é que há quem não se deixe intimidar e olhe com uma certa
complacência para os mortais que, à laia de outros argumentos, se
assemelham a personagens que estariam bem no Portugal dos Pequenitos ou
lá como se chama aquela ode ao Antigo Regime. A paciência, contudo, um
dia esgota-se.)
Na apresentação de um livro do meu pai,
António Pedro Vasconcelos proferiu diversas frases que, pelo seu acerto,
assumem contornos de intemporalidade. Permito-me destacar uma delas:
passamos a vida a falar de corruptos e nunca ouvimos falar dos
corruptores.
O nosso país tem várias particularidades e uma delas é
existirem corrompidos sem corruptores, sendo que os exemplos abrangem
todos os sectores de actividade, começando na política e acabando no
futebol.
Na exacta manhã do dia em que escrevo estas linhas
acordei com a notícia das buscas tanto no MAI quanto na Protecção Civil e
dei por mim a pensar que, de facto, o realizador tem toda a razão. Se a
justiça funcionar, e tantas vezes não funciona, no caso daquelas golas
ridículas que não serviram para nada (isto é, nem para a própria
“sensibilização” com que se justificou aquele absurdo ajuste directo)
teremos uma condenação qualquer, preferencialmente de pena suspensa, de
uns anónimos funcionários. O cérebro escapará, como sempre tem sucedido,
sendo que as diligências em curso obviamente não levarão a grandes
conclusões. Para mostrar serviço bastará uma acusação, ainda que eivada
de erros que não resistirão ao primeiro embate.
Não sei se algum
dia alguém fez as contas aos milhões que se perderam em actos de
corrupção e desconheço se existe interesse público em tal. Sei, apenas,
que, entre nós, a complacência que tento dirigir aos que me tentam
insultar é a mesma com que estas pessoas, corrompidos e essencialmente
corruptores, são tratados. Se os primeiros têm, muitas vezes,
comportamentos feios e, direi mesmo, porcos (no sentido ordinário do
termo), os maus são os que desviam milhões do erário público para as
suas contas. Não tenho dúvidas sobre quais são os mais nefastos mas
também não me deixo enganar pela (só) aparente energia de uma justiça
que raramente sabe ser forte com os mais poderosos.
IN "O JORNAL ECONÓMICO"
20/09/19
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