O desporto e o lazer
É
lugar comum dizer-se que o evento da industrialização determinou a
eclosão do desporto moderno e a sua extensão a um fenómeno quase
mundial. A atividade desportiva saiu dos estreitos quadros onde estava
confinada, de alguns meios privilegiados e de algumas manifestações
populares e tradicionais, mas episódicas. A sua expansão foi criada
também pelas condições promovidas pela civilização técnica.
O
século XX foi palco de transformações tecnológicas e sociais que
alteraram a vida dos homens (no domínio tecnológico: o automóvel, o
avião, a comunicação sem fios, os progressos médicos, o nuclear civil e
militar; no domínio social: a emancipação das mulheres e dos
adolescentes).
Neste processo de alterações, o lazer
assume um papel importante. Entrámos numa sociedade de lazeres, com
mecanismos particulares. Em França, Joffre Dumazedier, na década de 60,
faz notar esta questão. A partir de 1980 o tempo livre tornou-se o tempo
de vida mais longo, que ganhou sobre o tempo de trabalho e o tempo
requerido a satisfazer as obrigações diversas (sociais, administrativas,
higiénicas, familiares, domésticas, etc.). O trabalho não foi
destituído socialmente. Ele continua organizador. É a partir do trabalho
que se continua a distribuir as temporalidades sociais. O trabalho
ritma e determina os modos de vida; dos ativos, bem como dos inativos. É
o trabalho que continua a organizar o dia, a semana, o mês e o ano.
Retirando
a questão profissional, os praticantes desportivos e não desportivos
procuram aproveitar o lazer. Na sua continuidade, o fenómeno desportivo é
inteiramente lazer. É isso que lhe dá sentido e lhe confere a sua
especificidade. Sem o lazer, sem o surgimento de uma sociedade de
lazeres, o fenómeno desportivo não existe. E, se existe, é de outra
forma. O tempo livre tornou-se o primeiro tempo de vida nos países
desenvolvidos. Uma tendência se afirma: consiste em compensar um
trabalho cada vez mais intenso pelas atividades de lazer com uma
intensidade correspondente.
Ouve-se dizer que o desporto
reclama capacidades físicas. É verdade para o nível de alto rendimento,
mas não o é para todas as práticas desportivas. A simples saúde permite
amplas possibilidades de praticar desporto. O leque de práticas
desportivas é também ele rico para a diversidade de gostos e de
aptidões. Mas uma única parece inegável: o desporto tem a incomparável
faculdade de preencher o tempo livre.
* Sociólogo,
Doutor em Educação Física e Desporto, Ramo Didática. Investigador
Integrado do Centro de Estudos Interdisciplinares de Educação e
Desenvolvimento (CeiED), da Universidade Lusófona de Lisboa
IN "A BOLA"
04/08/19
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