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IN "DIÁRIO DE NOTÍCIAS"
01/07/19
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Um ministro que arde,
não inflama,
mas pode romper
Se o pior cego é o que não quer ver, o pior político é o que não
aprende nada com o passado. A arrogância do poder e de umas quantas
sondagens que deixam o PS cada vez mais confortável nas intenções de
voto ajudam a explicar o discurso inenarrável de Eduardo Cabrita na
última semana. Mas cuidado com o excesso de confiança. Ele pode ser
fatal.
Num país ainda traumatizado pelas tragédias de 2017, se há
tema que devia estar a ser tratado com pinças é este, o dos incêndios.
Naquele ano, não foram apenas as vidas que se perderam, foi a confiança
dos cidadãos no Estado que caiu para mínimos, que vão demorar anos a
recuperar. Isto já para não falar da gestão política desastrosa
protagonizada à época por Constança Urbano de Sousa e pelo próprio
António Costa, que só terminou quando o Presidente da República demitiu a
ministra em direto, naquela que foi a maior humilhação política que
este Governo já sofreu. Quem não se lembra das declarações ora frágeis
ora irritadas da ministra? E do primeiro-ministro em direto nas
televisões a virar-se contra os jornalistas, numa estafada tática
política de fuga para a frente?
O episódio das golas que não são
inflamáveis, mas ardem - como assim? - seria apenas uma patetice do
governo e mais um exemplo de dinheiro público mal gasto, se se resumisse
a uns brindes que vão acrescentar ainda mais lixo à casa dos
portugueses.
O grave nesta história é que ela é uma espécie de metáfora da forma como o Partido Socialista se comporta quando está no poder. Tudo
serve para alimentar a grande família socialista e é preciso aproveitar
enquanto se está no Governo, que a seguir podem vir outros e a torneira
fecha-se.
Quando são apanhados, têm uma espécie de guião que
seguem à risca: primeiro ficam em silêncio, pode ser que a coisa passe
sem provocar grandes danos; depois indignam-se e atiram as culpas para
alguém. Quem ousa colocar em causa a competência e as boas intenções do
Governo? Segue-se a irritação com os jornalistas, esses chatos que não
os largam a fazer perguntas. E, por fim, quando já não é possível
escapar, sacrificam um peão qualquer, numa tentativa já desesperada de
estancar a polémica e evitar que os verdadeiros responsáveis políticos
tenham de assumir as suas responsabilidades.
No caso das golas, Eduardo Cabrita seguiu este guião à risca. Primeiro
fez-se de morto e ficou horas sem dar qualquer explicação. Depois
atirou as culpas para a Proteção Civil, como se esta entidade não fosse
tutelada por ele. Como nem a primeira nem a segunda estratégia
funcionaram, atirou-se à jugular dos jornalistas, mas acabou a cair num
ridículo ainda maior. E, no final, lá demitiu o adjunto do secretário de
Estado, que as golas - que não são inflamáveis, mas ardem - já lhe
estavam a queimar as mãos.
O que Eduardo Cabrita parece ainda não
ter compreendido é que há responsabilidades políticas que continuam por
assumir e, desta vez, não adianta dar uns toquezinhos nos microfones dos
jornalistas em tom irónico. No Ministério da Administração Interna
continua em funções um secretário de Estado que foi o principal
responsável por este episódio lamentável e não é a demissão de um
"técnico" que resolve isso.
Cada dia que José Artur Neves
se mantiver em funções, é o ministro que se queima mais um bocadinho e é
o Governo que continua a arder em lume brando. Bem sei que a
arrogância de quem acha que tem as eleições no papo e não sente sequer
uma leve brisa de oposição dá nisto. Mas as pessoas não são estúpidas.
Ou, pelo menos, eu quero continuar a acreditar que não são.
IN "DIÁRIO DE NOTÍCIAS"
01/07/19
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