05/01/2019

GUSTAVO PIRES

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Para uma Política do Absurdo: 
Os Jogos Olímpicos 
da Península Ibérica

Advogar a organização dos Jogos Olímpicos em Portugal, um país com de menos de dez milhões de habitantes com um dos piores Índices de Desenvolvimento Humano entre os países europeus (41º lugar), cujos cidadãos estão sujeitos a um esforço contributivo sem precedentes e, devido às cativações orçamentais do Governo, ainda se confrontam com serviços públicos a funcionarem abaixo da linha de água é, simplesmente, entrar no domínio da gestão do absurdo. É desvirtuar os valores ético-sociais que devem presidir ao desenvolvimento do Olimpismo nacional enquanto filosofia de vida que coloca o desporto ao serviço do desenvolvimento humano. É acentuar o jogo de soma nula que já resulta da dinâmica económica e social do País. É uma decisão absurda, quer dizer, o resultado de um processo através do qual um indivíduo ou um grupo actua de uma forma persistente e radical contra um fim que devia procurar atingir.

Por um lado, segundo os dados mais recentes da Rede Europeia Anti Pobreza (2017), 2.4 milhões de portugueses estão em risco de pobreza ou em situação de exclusão social. Quer dizer, mais de 1/5 da população (23.3%). O risco de pobreza monetária atinge 18.3% da população, cerca de 1.9 milhões de portugueses. Acresce que 8% da população, 599 mil pessoas, vive em agregados familiares excluídos do mercado de trabalho o que se traduz numa situação em que 18% está em situação de privação material. Pelo que, Portugal continua com níveis elevados de desigualdade, superiores à média europeia. Em 2017, o rendimento dos 10% mais ricos era dez vezes superior ao rendimento dos 10% mais pobres. Os grupos mais vulneráveis são as crianças e as mulheres. Mais de 24% das crianças e 18% das mulheres correm o risco de pobreza e exclusão social.

Por outro lado, de acordo com o nº 2.1 da Carta Olímpica, o papel dos Comités Olímpicos Nacionais (CONs) é o de “promover os princípios e valores fundamentais do Olimpismo nos seus Países, em particular, nos domínios do desporto e da educação, através da promoção de programas de Educação Olímpica a todos os níveis nas escolas, instituições de educação desportiva e física e universidades, bem como encorajar a criação de instituições dedicadas à Educação Olímpica, tais como as Academias Olímpicas Nacionais, os Museus Olímpicos e outros programas, nomeadamente culturais relacionados com o Movimento Olímpico”. Quer dizer que não consta na Carta Olímpica que os CONs tenham qualquer obrigação de se candidatarem a receberem a organização dos JO. Relativamente aos JO, os CONs estão, tão só, obrigados em fazerem participar uma missão dos respetivos países nos JO.

Qualquer decisão relativa a uma candidatura à realização de uns JO obriga à assunção de uma enorme responsabilidade ético-social por parte dos dirigentes políticos e desportivos sob pena de se entrar no domínio das decisões absurdas que, no fundo, não passam da mais pura demagogia em busca de um qualquer protagonismo político.

Como refere a generalidade da literatura, os resultados da realização de grandes eventos desportivos, de uma maneira geral, são muito menos positivos, para não dizermos negativos, relativamente aos antecipados e irritantes discursos cor-de-rosa, quer dizer, super-otimistas, proferidos à partida dos processos de tomada de decisão. Quer dizer, uma candidatura custa muitos milhões sem qualquer garantia de significativos efeitos benéficos para os países, a generalidade das populações e o desporto. Por exemplo, Tóquio, desde 2009, despendeu $225 milhões para vencer a candidatura para 2020.
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Por isso, é de fundamental importância perguntar ao presidente do COP: Portugal tem cerca de cento e cinquenta milhões de euros para despender numa candidatura ao JO? Os contribuintes estão dispostos a pagá-los e, em caso de vitória, a suportar os cerca de quinze a vinte mil milhões de euros que custa recebê-los?

O mínimo de bom-senso diz-nos que, no actual quadro económico e social do País com uma dívida pública de mais de 250 mil milhões de euros e uma dívida total (pública + privada) de mais de 700 mil milhões, com os serviços públicos a rebentarem pelas costuras e uma Situação Desportiva com uma das mais baixas taxas de participação da Europa, uma candidatura a receber os JO entra no domínio do mais completo absurdo. Todavia, em Portugal, já é longa a tradição do nosso nacional olimpismo de, face à falta de objectivos e projetos que tenham verdadeiramente a ver com as necessidades dos portugueses, anunciar uma eventual candidatura à organização de uns JO a fim de, tanto à esquerda quanto à direita, impressionar a oligarquia que, para além das políticas de educação e cultura, o que mais gosta é de ver o povo divertido. E hoje, o Movimento Olímpico (MO) está transformado num palco da mais primária demagogia onde os extremos políticos se encontram a fim de, com estratégias oportunistas  semelhantes, instrumentalizarem o desenvolvimento do desporto através da constituição de um “exército de atletas” para participarem nos grandes eventos desportivos para “honra e glória” do regime, em prejuízo de políticas públicas de generalização da prática desportiva (do ensino ao alto rendimento) que, verdadeiramente, tenham a ver com as necessidades dos portugueses e, na relação massa elite, melhorem o Nível Desportivo nacional.

Em consequência, as pessoas estão a deixar de confiar nos dirigentes políticos e desportivos. Até um país como o Japão, como refere o jornal “The Diplomate – Asia / Pacific”, com uma previsão de custos de mais de 25 mil milhões de dólares, a gestão financeira dos JO de Tóquio (2020) tem decorrido à margem da confiança pública, quer dizer, daqueles que, depois, vão suportar o custo dos jogos não só em termos financeiros como em termos de detioração da cultura democrática do país porque se existe setor social onde mais se tem permitido a existência de caudilhos tem sido, precisamente, o do desporto. Eles sabem, como afirmou Carl Jung, que o género humano não é capaz de suportar demasiada realidade e, aproveitando-se disso, afastam os críticos e aqueles que incomodam, apropriam-se do poder e, em nome da democracia direta, passam a gerir as organizações de uma forma autocrática.

Felizmente as populações também começam a acordar pelo que em diversas cidades dos países mais desenvolvidos estão a deixar de acreditar no discurso dos dirigentes políticos e desportivos uma vez que, para além dos enormes prejuízos que deles decorrem, ainda acabam por ser um justificativo para a ocorrência de inaceitáveis atentados aos direitos humanos. E, assim, está a aumentar o número de cidades que se rebelam contra a realização dos JO dentro das suas portas porque o poder político tem vindo a ceder cada vez mais às exigências do caderno de encargos do COI que cada vez coloca mais exigências sem que daí advenham os correspondentes benefícios para as populações. Quer dizer, os JO revelaram-se o negócio (a vaca leiteira) da segunda metade do século XX mas, agora, começam a ser postos em causa pelas populações que os têm de pagar. Os países pagam a organização, os artistas e o enquadramento humano trabalham de graça e o COI recebe os proventos do marketing e das transmissões televisivas. Entretanto, como acabaram por concluir no Brasil, relativamente ao Rio (2016) o COI ficou com os lucros e os brasileiros com os prejuízos. Quer dizer, o COI no Ciclo Olímpico do Rio (que inclui os JO de Sochi (2014) arrecadou a maior receita de sempre que atingiu $5,7 bilhões e os brasileiros ficaram com uma dívida que vai, certamente, levar as próximas duas ou três décadas a pagar.

Embora, na fase de projecto das candidaturas, os políticos garantam o contrário, o preço dos JO acaba sempre por ser suportado por dinheiros públicos que acabam por sair diretamente do bolso dos contribuintes. Sydney (2000) custou $4,6 biliões dos quais os contribuintes tiveram de pagar $11,4 milhões.  Atenas (2004) custou $15 biliões pelo que os contribuintes ainda estão a pagar, anualmente, cerca de $56,6 milhões. Pequim (2008) custou $42 biliões de dólares e pouco mais se sabe a não ser que muitos chineses das classes mais desfavorecidas, com as deslocalizações forçadas das áreas de residência acabaram por ser muito mal tratados. Londres (2012) custou $14.6 biliões dos quais 4,4 biliões foram pagos pelos contribuintes e, depois, ainda tentaram convencê-los que os JO tinham dado lucro. Quanto ao custo dos JO do Rio (2016) o último número conhecido é de 41,3 biliões de dólares para além de um parque desportivo na mais completa e confrangedora degradação e um país numa situação de descalabro social.

Perante estes factos e números há muito conhecidos, foi com um sentimento de incredibilidade que, através de uma entrevista ao jornal desportivo O Jogo (21-06-2018), ficámos a saber que a atual chefia do COP “veria, com muito bons olhos, uma candidatura ibérica à realização de uns Jogos Olímpicos.”! E o chefe do COP acertou em cheio na medida em que, passados que foram menos de cinco meses, quer dizer, em princípios de Novembro de 2018, os portugueses, incluindo os do Governo, foram surpreendidos pela notícia de que o primeiro-ministro espanhol havia proposto ao rei de Marrocos a organização de uma candidatura a três ao Mundial de 2030 em que Portugal seria o terceiro parceiro! Muito embora António Costa, posteriormente, tenha deitado água na fervura (noblesse oblige) pela atitude do Primeiro-ministro espanhol podemos aquilatar o que seria uma organização conjunta de uns JO em que Portugal passaria, certamente, a ser tratado por Espanha à semelhança do tratamento que Madrid reserva para as regiões autónomas espanholas. Por isso, para além das relações bilaterais que devem ser excelentes e da amizade que deve existir entre os portugueses e os espanhóis, uma coisa que os portugueses nunca se devem esquecer é que a história há muito que nos ensinou que “de Espanha nem bom vento nem bom casamento”. E a chefia do COP devia saber disso. Por isso, um casamento olímpico com Espanha significa potencialmente o risco de ver os portugueses de bandeja na mão e guardanapo no braço a serem tratados como pessoal do catering.

O obsessivo desejo por parte dos chefes do COP em receberem a organização dos JO não é nova. Direi mesmo que tal obsessão deve ser um dos fetiches mais queridos dos nossos dirigentes olímpicos porque entra no domínio de uma tragicomédia que, felizmente, de flop em flop, tem vindo a acontecer desde os princípios dos anos noventa. Vejamos a linha temporal dos acontecimentos.

O “Público” em 13/11/93 anunciava que os dirigentes do PSD durante a campanha para as autárquicas, logo secundados pelo PS, prometeram a realização dos JO no Porto em 2004! No frenesim em que transformaram a campanha, bem poderiam ter prometido o elixir da vida eterna pois seria a mesmíssima coisa.

Passado o prazo para os JO de 2004, surgiu a candidatura para 2008. E a 30 Outubro de 1999 (Público, 31/19/99), (note-se que a decisão sobre a cidade que receberá os JO é realizada sete anos antes) foi o próprio Presidente do Comité Olímpico Internacional (COI) a anunciar que 13 cidades eram candidatas à realização dos JO de 2008 entre as quais Lisboa! Contudo, poucos dias depois, o Governo e o COP anunciaram não existirem condições para que tal pudesse acontecer. O secretário do COP justificava-se perante o País: “Portugal precisa, primeiro, de se afirmar no plano desportivo, com obtenção de grandes resultados” (Record, 3/2/00).

Seis meses depois o problema estava resolvido! Armando Vara, Ministro do Desporto, acabadinho de tomar posse a 14/9/00, ofuscado pelo fogo-de-artifício de Sydney e embalado nas palavras dos nossos olímpicos dirigentes, portanto em perfeitas condições para tomar uma decisão de, ao tempo, pelo menos sete mil milhões de euros, deu “luz verde à candidatura de Lisboa 2012” e afirmou: “Há uma grande vontade de todos em avançarmos com o projecto” (Record, 1/10/00). Os resultados, passados que estão dezanove anos, estão à vista.

José Lello que substituiu Armando Vara emendou a mão e afirmou ao “Record” (1/7/01): “Temos de ter a noção do que podemos fazer e eu acho que lançar uma candidatura aos JO (…) é continuar a investir no discurso da retórica e não no discurso do rigor”. Ao tempo, José Sócrates, que havia sido Ministro-Adjunto do Primeiro-Ministro (e responsável pela pasta do desporto) do XIII Governo Constitucional presidido por António Guterres, numa entrevista ao desportivo Record (28-07-2001), secundou a posição de José Lello e disse: “… achei sempre ridículo e caricato alguém falar disso. (…) Acho megalómano”.

Mas o ex presidente do COP não se deu por vencido. Depois de ser recebido pelo primeiro-ministro António Guterres informou solenemente a comunicação social (Público, 31/7/01): “Fiz a proposta utópica e irrealizável de Portugal receber os Jogos Olímpicos (JO). Não é importante em que ano, 2016 ou 2020...”. Rui Cartaxana expressou magistralmente a sua opinião no “Record” (1/08/01): “Totalmente de acordo, quanto à proposta. Quanto ao ano, sugiro antes 2442, que é uma capicua”. Perante tal derrocada prospetivo-epistemológica a comunicação social entrou em ação e foram vários os políticos que tiveram de expressar a sua opinião acerca da realização em Portugal (eventualmente em Lisboa ou no Porto) de uma edição dos JO. Entre outros, Carlos Carvalhas, respondeu a “A Bola” (13/3/02): “Nas condições atuais essa candidatura não faria sentido e poderia ser mesmo uma irresponsabilidade”. E Durão Barroso esclareceu: “Primeiro temos que atingir padrões europeus de prática desportiva, depois poderemos pensar em outros desafios” (A Bola, 14/3/02).  Marcelo Rebelo de Sousa na TVi (22/8/04) pôs um ponto final no assunto afirmando que “quem defende a organização dos JO em Portugal não sabe o que está a dizer”.

Todavia, aqueles que julgavam ter sido posta uma pedra sobre o assunto estavam completamente enganados. Na abertura dos JO de Atenas (2004), tal qual tragédia grega, foi preparado o enredo para, de uma forma maviosa, envolver o Presidente da República (PR) na candidatura aos Jogos de 2016. Para que tudo parecesse perfeito foi fundeada a Sagres no porto de Pireu, a fim de fazer de residência oficial do PR. Contudo, Jorge Sampaio não foi no canto das sereias do nacional olimpismo. E, numa espécie de Ulisses à portuguesa, fez-se amarrar ao mastro principal da Sagres, quer dizer, à nossa realidade sócio-desportiva e recusou a hipotética candidatura: “Trata-se de um empreendimento demasiado avultado” (Record, 13/8/04). Não se sabe quem foi a Circe de Jorge Sampaio, o que, sem sombra de dúvidas, se constatou foi que os portugueses tinham de continuar atentos aos olímpicos devaneios dos dirigentes desportivos porque, se não o fizessem ficariam a braços com uma dívida de quinze ou vinte mil milhões para pagar. E não era para menos na medida em que, a 30 de Agosto de 2004, o presidente do COP, num programa da RTP1, voltou à carga argumentando que a realização dos JO, para além de ter viabilidade económica, exemplificando com Atenas, contribuiria para ultrapassar a “falta de profundidade” do desporto nacional. Entretanto, no rescaldo dos JO de Atenas o então presidente do COP avançou com a ideia de uma “candidatura aos Jogos…para perder” (Record, 22/9/04). Por sua vez, o edil de Lisboa, muito provavelmente, deslumbrado com o cenário mitológico da abertura dos Jogos de Atenas a que havia assistido, declarou: “…apercebi-me do tipo de preocupações, de necessidades e investimentos que tiveram de ser feitos, e seguramente Portugal está à altura do evento” (Correio da Manhã, 27/11/04).

Felizmente, os portugueses acabaram por perceber a extraordinária incoerência económica e desportiva dos JO de Atenas (2004). As estimativas iniciais de seis mil milhões de dólares, dispararam para nove mil milhões para o custo dos Jogos ter ficado em mais de catorze mil milhões. Os resultados foram impressionantes na medida em que se a dramática situação socioeconómica dos gregos se ficou, também, a dever à organização dos JO no que diz respeito à “profundidade desportiva” o desenvolvimento do desporto grego também deixou muito a desejar uma vez que, ainda os Jogos não tinham começado, já a Missão Olímpica grega estava envolvida em questões de doping que geralmente é o que acontece quando no desporto se quer dar um passo maior do que a  perna.

Cerca de dois meses depois perante uma centena de figuras ligadas ao desporto, José Sócrates, já na qualidade de líder socialista afastou a hipótese de uma candidatura, alegando que as condições económicas e financeiras “não permitem ao país entrar nessa aventura” (TSF, 18/1/05). Mas o presidente do COP não desistiu e, em Julho de 2005 fez a proposta “sui generis” de se apresentar uma candidatura já com a intenção de se perder. E dizia: “não há que ter medo de perder porque se trata de desporto e só um pode vencer.”! (Record, 7/07/2005).

No ano seguinte, durante a Gala (2006) do 97.º aniversário do COP o presidente da instituição não se coibiu de voltar ao assunto. E o ministro da Presidência (que tutelava o desporto), Pedro Silva Pereira que participava na cerimónia foi apanhado completamente de surpresa. No seu discurso limitou-se, polidamente, a responder que “o país precisa de sonhos e ambições” mas frisou que “esses projetos têm de ser avaliados, sobretudo porque envolvem importantes recursos financeiros públicos” (Diário de Notícias, 2/11/2006). Uns dias depois, Laurentino Dias, ao tempo Secretário de Estado da Juventude e Desporto concluiu que o País não tinha condições para se envolver na organização de um evento desportivo da envergadura dos JO (Diário de Notícias, 25/11/2006).

Mas a comunicação social estava apanhada pela possibilidade da realização dos JO numa cidade portuguesa. Por isso, em 2007, depois de uma visita a Pequim do edil de Lisboa António Costa, onde teve a oportunidade de visitar as infraestruturas e equipamentos que iriam ser o palco da organização dos JO, perante as perguntas da comunicação social esclareceu (Lusa, 24/10/07) que Lisboa não ia candidatar-se à organização dos Jogos Olímpicos. A candidatura à organização dos Jogos Olímpicos é algo que a Câmara Municipal de Lisboa "nem sequer está a equacionar". E, acrescentou: “é algo que não está em cima da mesa (…) mas o futuro é muito longo”. Claro que o futuro é muito longo. O que presumimos que aconteceu foi que, como Liang Lijuang relatou no livro “He Zhenliang and the Olympic Dream”, alguém informou António Costa de que o processo de candidatura da China a receber os JO decorria de um projeto que tinha mais de cem anos.

Agora, inopinadamente, o atual presidente do COP foi mais longe no nosso triste nacional olimpismo e, sem falar com ninguém, desde logo com o governo português e o homólogo espanhol (não sabemos se, sequer, falou com os membros da sua direção, em especial com Rosa Mota, e se tal conversa ficou gravada numa acta da reunião da Direção), avançou, como diz o jornalista, com uma “ideia revolucionária que, para além de outros aspetos absurdos vai contra a Carta Olímpica ao sugerir a organização conjunta entre Portugal e Espanha de uma edição dos JO.

Hoje, o desporto é demasiado importante para, sem qualquer racionalidade lógica e sem qualquer preocupação estratégica que, por princípio, obriga a uma ampla decisão democrática, se pretender tirar efeitos políticos de anúncios de eventos desportivos de mais que duvidosa viabilidade de concretização. Uma candidatura aos Jogos Olímpicos exige um padrão de competência e responsabilidade que não se compadece com as habituais tiradas de alguns dirigentes políticos e desportivos em busca de um lugar no Olimpo.

Perante as dificuldades económicas e sociais que o país vive e que no quadro atual da economia mundial não têm fim à vista, não me parece minimamente sensato falar em receber os JO que, para além de se sugerir que aconteça numa ridícula para não dizer perigosa candidatura com os espanhóis, não considera o estado de desorganização total em que o desporto nacional se encontra como o País teve a oportunidade de constatar dos trabalhos do último Conselho Nacional do Desporto (Record, 20, 21, 22-12-2018). Consideramos mesmo ser uma falta de respeito para com os portugueses que vivem com dificuldades e não têm sequer acesso ao desporto avançar com tal proposta quando se sabe, que depois de tal aventura seriam os portugueses a pagarem a fatura e, como é habitual, os dirigentes políticos e desportivos a receberem as condecorações. Por isso, são de ponderar seriamente as palavras de Vasco Lince antigo presidente do COP teve ocasião de referir “a conjuntura não é favorável à candidatura de Portugal à realização de grandes eventos desportivos internacionais, desde logo porque a população não estaria mobilizada” (Dez, 25/11/06).

Lançar a ideia da realização de uns JO Ibéricos à revelia da posição do Governo, da ausência do envolvimento das Federações Desportivas, sem falar com o presidente  do CON espanhol, sem considerar a Situação Desportiva nacional e garantir a adesão dos portugueses e à margem da cultura olímpica expressa na Carta Olímpica, parece-nos um absurdo do tipo Alice no País das Maravilhas, que só pode prejudicar o desporto e o País.

No actual quadro de subdesenvolvimento do desporto nacional, perante a incultura que representa a hilariante perspetiva de uns JO da Península Ibérica, já vai sendo tempo das Federações Desportivas e demais membros da Assembleia Plenária começarem a construir uma alternativa aos atuais corpos gerentes do COP.

* Professor catedrático da Faculdade de Motricidade Humana

IN "A BOLA"
03/01/19

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