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* Investigador em Trabalho e Segurança Social
IN "O JORNAL ECONÓMICO"
13/12/18
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Entrecampos:
quando a Fidelidade
perdeu a vergonha
A Fidelidade vendeu os prédios que detinha com um objetivo agora claro: capitalizar-se e apostar num negócio de milhões em habitação de luxo e escritórios em Lisboa.
Esta quarta-feira soube-se que a
Fidelidade comprou os terrenos da antiga Feira Popular em Entrecampos,
Lisboa. A seguradora desembolsou mais de 270 milhões de euros na compra
dos terrenos, quando ainda há poucas semanas finalizou a venda de
património que tinha por todo o país, no valor de 425 milhões de euros.
Ou
seja, a Fidelidade vendeu a quatro subsidiárias do fundo abutre Apollo
os prédios que detinha e onde moravam cerca de 1.500 famílias, só em
Lisboa, com um objetivo agora claro: capitalizar-se e apostar num
negócio de milhões em habitação de luxo e escritórios naquela zona nobre
de Lisboa.
O problema com a Fidelidade remonta a 2014, aquando da
sua privatização pelo CDS e PSD, que permitiu que a seguradora pública
passasse para o grupo chinês Fosun sem qualquer contrapartida na
segurança dos inquilinos que habitavam nas casas que pertenciam à
seguradora do Estado.
Mais recentemente, o movimento de venda
criou problemas imensos aos inquilinos das casas que eram da Fidelidade e
que, até 2013, foram controladas por uma empresa pública. Onde antes
estes arrendamentos eram protegidos, o CDS permitiu que fossem
liberalizados com a lei das rendas de Assunção Cristas. Como esperado, o
fundo Apollo está a rescindir centenas de contratos com estas pessoas,
sendo que já há queixas de bullying imobiliário para empurrar
gente para fora das casas onde vivem. Existem casos em que nem a
moratória aos despejos no caso de pessoas com mais de 60% de
incapacidade está a ser respeitada. É uma violência inaceitável sobre
estas famílias.
A venda das casas da Fidelidade esteve desde o
primeiro momento envolta em polémica. O Bloco de Esquerda fez aprovar
uma lei na Assembleia da República para proteger os inquilinos da
seguradora, permitindo-lhes exercer o direito de preferência. O veto
inicial do Presidente da República, alegadamente assessorado por um
jurista com ligações à Fidelidade, permitiu atrasar o processo o
suficiente para a seguradora vender os imóveis à Apollo sem garantir o
direito de preferência aos inquilinos proposto pelo Parlamento.
Rui
Moreira, presidente da Câmara Municipal do Porto, anunciou recentemente
que o município iria exercer o direito de preferência. Em Lisboa, o
grupo municipal do Bloco de Esquerda desafiou Fernando Medina a fazê-lo,
tendo esbarrado na desculpa de que o valor era demasiado oneroso.
Segundo a vereadora Paula Marques ascenderia a 300 milhões.
Os
terrenos da antiga Feira Popular foram entretanto vendidos pela Câmara
Municipal de Lisboa em leilão livre, no qual participaram outros
investidores. A hasta fazia parte da Operação Integrada de Entrecampos,
que inclui ainda um forte investimento público do município com a
construção e reabilitação de 700 casas em regime de renda acessível na
Av. das Forças Armadas e em prédios até ao Saldanha, para além de vários
equipamentos, como creches e centros intergeracionais para idosos.
Esta
ação da Fidelidade demonstra, como se houvesse dúvidas, que as empresas
uma vez privatizadas procuram unicamente o lucro, neste caso com
prejuízo de milhares de pessoas que vão perder as suas casas por todo o
país em prol de um negócio para construir casas de luxo e escritórios no
centro de Lisboa. Sem vergonha.
* Investigador em Trabalho e Segurança Social
IN "O JORNAL ECONÓMICO"
13/12/18
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