13/12/2018

IVONE ROCHA

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Em busca de um novo
 mercado elétrico

A procura de um novo mercado energético centrado nas renováveis, na descentralização da produção e na proteção dos consumidores é o debate que se impõe.

Do Bloco de Esquerda ao CDS, dos produtores aos consumidores, das associações profissionais aos comentadores, as opiniões sobre energia multiplicam-se. Inspirados ou não pela comissão de inquérito parlamentar em curso, a verdade é que fora dela ou dentro dela, as opiniões divergem, numa discussão estéril onde se fala do passado e não se prepara o futuro.

Uma coisa parece certa, as fórmulas de remuneração energética, onde se inclui a eletricidade, são de tal modo complexas que, não sendo percetíveis pela generalidade, são explicadas por alguns – pelos que precisam de protagonismo político e fazem demagogia, pelos que são contra as renováveis, pelos que apenas querem especular e, pelos que simplesmente esclarecem, mas que a generalidade não consegue separar do ruído.

Importa, pois, identificar consensos:

O primeiro é, desde logo, a necessidade de um novo mercado energético, com novas regras, transparente, seguro e estável. Sob pena de ficarmos para trás na transição energética necessária até 2050, os produtores, transportadores e distribuidores precisam de sinais claros da regulação desse novo mercado. Convém lembrar que a eletricidade que vamos produzir nas próximas décadas é a que planeamos hoje e que a produção de energia elétrica é uma atividade económica de capital intensivo.

O segundo consenso é que a transição para um novo paradigma energético começou e é irreversível, acarretando custos elevados para quem não a acompanhar. O Acordo de Paris foi assinado e a União Europeia apresentou um novo pacote energético, o “Pacote de Inverno – Energias Limpas para Todos” com orientações e obrigações claras para a descarbonização da economia. Portugal não pode ficar de fora!

O terceiro consenso é que as regras têm que ser estáveis cabendo ao poder político criar o contexto regulatório e legal, de forma a receber investimento nacional e estrangeiro, como de resto o impõe a Carta da Energia.

A estes consensos há que acrescentar dois factos. O facto de os modelos de regulação económica na energia não serem tipo cost for services puro. O mercado energético é uma construção com abordagens de Regulação por Incentivos, aplicadas a todo o tipo de energia primária, onde o regulador estabelece os custos e ganhos permitidos.

O melhor exemplo deste procedimento está no facto de o mercado SPOT atual ter sido construído a partir e para as energias de origem fóssil, o que, por si só, demonstra a sua difícil compatibilização com a descarbonização energética que se avizinha. A penalização do carbono tem que ser uma realidade.

Tudo isto, sem esquecer que Portugal não é uma ilha, para além de membro do mercado europeu, constitui, com Espanha, o MIBEL, pelo que as suas opções em matéria de política energética têm de ser capazes de “conviver” com o mercado Espanhol, sendo certo que Espanha já aprendeu, à sua custa e com penalizações enormes, que a estabilidade é fundamental.

Tendo em conta tudo isto, há que olhar para o futuro. De acordo com os compromissos assumidos, teremos uma eletricidade – renovável – produzida com base num custo de investimento de infraestrutura de capital intensivo, com uma matéria-prima gratuita – sol e vento – mas variável, cuja viabilidade depende do retorno desse preço fixo, acrescido da respetiva operação e manutenção, sem deixar de ter em conta o período de vida dos equipamentos.

Sendo uma infraestrutura de capital intensivo, o êxito e a garantia na obtenção de uma energia de produção o mais barata possível depende em larga medida da taxa de remuneração do investimento e esta, como se sabe, é tanto mais baixa quanto mais estável for o enquadramento regulatório e legislativo.  Por isso, hoje, mais do que nunca, é preciso estabilidade e visibilidade nas políticas no setor elétrico, sob pena de estarmos a hipotecar a nossa economia.

Como tem acontecido em outros países da União Europeia, a determinação do valor inicial deve ser efetuada a partir de valores de mercado – concursos públicos ou leilões – efetuados com uma visibilidade e estabilidade para o próximo horizonte de 3 a 5 anos, com previsibilidade da capacidade a concurso, tal como determina a nova Diretiva das Renováveis incluída no Clean Energy Package, e nunca poderá esquecer a remuneração da externalidade positiva. Se não o fizermos estaremos a financiar a energia de origem fóssil e a isolar Portugal.

Este é o debate que se impõe: a procura de um novo mercado energético centrado nas renováveis, na descentralização da produção e na proteção dos consumidores. Sem sinais claros de estabilidade e clareza na regulação, não há investimento eficiente e sem ele não haverá energia elétrica fiável e disponibilizada a preços competitivos. Nunca cumpriremos o Acordo de Paris sem renováveis.

* Advogada responsável pela área de Energia da Telles de Abreu – Sociedade de Advogados

IN "O JORNAL ECONÓMICO"
11/12/18

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