27/09/2018

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HOJE NO
"OBSERVADOR"
Temperaturas de setembro estão até 7ºC mais altas do que a média. Porquê?

Não, este calor em setembro não é normal. As temperaturas dos últimos dias estão entre 4ºC e 7ºC acima da média calculada nos últimos 30 anos. E a culpa não é apenas do anticiclone dos Açores.

Há uma semana que o hemisfério norte do planeta entrou no outono e com ele deviam ter chegado as temperaturas gradualmente mais baixas. É o que dizem os meteorologistas, explicam os professores e sugerem os manuais científicos há centenas de anos: desde o primeiro dia de verão até ao primeiro dia de inverno, a inclinação dos raios que chegam à Terra aumenta, com ela aumenta a distância percorrida e também a área por onde se distribuem. Consequência: está mais frio. Ou pelo menos devia estar. Então, porque é que não está?

Apesar dos alertas de trovoada emitidos para o interior norte do país — em Vila Real o granizo até já está a provocar estragos — a verdade é que o mercúrio dos termómetros continua a atingir valores estranhos para a época. Os índices de risco de incêndio mais baixos são os amarelos para Lisboa e Évora: Faro, Bragança e Castelo Branco até estão com índices vermelhos. E enquanto a chuva provoca inundações e derrocadas nos Açores, em território continental há cidades a chegar aos 36ºC de temperatura máxima às portas de outubro.

De quem é a culpa? A resposta é a do costume: do anticiclone dos Açores. Mas não só.

Este calor é normal para esta época do ano?
Não. De norte a sul do país, a tendência em setembro tem sido sempre a mesma: as temperaturas registadas em 2018 estão entre quatro graus e sete graus acima do que era expectável para este mês, tendo em conta a média calculada pelo Instituto Português do Mar e da Atmosfera nas últimas décadas. E tanto as temperaturas máximas como as mínimas estão acima do normal para o final do mês de setembro.


Em entrevista ao Observador, a meteorologista Patrícia Gomes, do Instituto Português do Mar e da Atmosfera, confirma que o calor dos últimos dias não é normal para esta época do ano. O mês de setembro é um mês de transição porque “nos primeiros dez dias ou na primeira quinzena as temperaturas costumam ser mais elevadas e mais próximas das do verão, mas na segunda semana costumam ser mais baixas e amenizam”.

Não é o que está a acontecer: as temperaturas dos últimos dias são mais elevadas do que é a média de valores registados nos últimos trinta anos pelo Instituto Português do Mar e da Atmosfera — uma média que, apesar de tudo, “não é muito elevada”. Alguns exemplos: no Porto, a média de temperaturas registadas é de 23,4ºC mas na quarta-feira o mercúrio dos termómetros subiu até aos 30ºC. Em Santarém, a média de temperaturas em setembro é de 28,9ºC mas registaram-se valores a rondar os 36ºC na quarta-feira. E em Lisboa, a média de setembro é 26,7ºC mas a capital chegou aos 33,7ºC na quarta-feira.

Porque é que está tanto calor?
Este calor está a atingir Portugal Continental porque o anticiclone dos Açores, um grande centro de altas pressões atmosféricas perto do arquipélago, “não está na posição habitual para esta época do ano”, explicou Patrícia Gomes.

De acordo com a meteorologista, “neste momento há um núcleo desse anticiclone por cima da Europa Central e outro a oeste nas Ilhas Britânicas”. Entre esses dois núcleos do anticiclone dos Açores apontados por Patrícia Gomes, o que está a oeste das Ilhas Britânicas é o que mais está a influenciar o estado do tempo em Portugal Continental, porque está “numa posição de bloqueio” que impede as perturbações frontais vindas do norte da Europa de chegar ao país. Essas são as perturbações que costumam trazer temperaturas mais baixas, vento mais húmido e nebulosidade de entre 50% e 60% no final de setembro.

Além de o país estar resguardado do tempo mais fresco vindo do norte da Europa, há mais dois aspetos que também justificam porque é que está tanto calor, uma semana depois de o outono ter chegado ao hemisfério norte. O primeiro aspeto é o facto de Portugal Continental estar na rota de uma massa de ar quente e seco vindo do norte de África e de algum ar quente vindo do interior da Europa.

O segundo aspeto é que a crista do anticiclone dos Açores — uma região alongada de altas pressões atmosférica onde o ar fica mais seco, há menos humidade e, portanto, menos formação de nuvens que possam dar origem à chuva — estende-se até ao espaço entre o arquipélago dos Açores e o da Madeira. Por isso, a humidade relativa do ar trazida do mar não é muito elevada. E como a brisa marítima, que já devia soprar com mais intensidade nesta altura do ano, continua fraca, a sensação de calor ainda se acentua mais.

Até quando vai durar este calor?
Ainda esta quinta-feira pode haver alguma chuva e trovoada no interior norte e centro de Portugal Continental até pelo menos às dez da noite. Desta noite para a frente também pode haver algumas nuvens, mais vento no litoral oeste e uma brisa marítima mais forte. Mas embora seja difícil fazer previsões meteorológicas a partir de segunda-feira, o calor deve continuar por cá pelo menos até ao fim de semana ou início da próxima semana.

E a culpa disso, desta vez, não é apenas do anticiclone dos Açores. É de um ciclone pós-tropical “com alguma atividade” que “desagravou, mas que agora está outra vez a agravar” e que, neste momento, está a passar a oeste dos Açores, alertou a meteorologista: chama-se depressão Leslie, tem “uma grande dimensão” e entrou num jogo de forças com o anticiclone dos Açores. Esse tipo de depressões são normais para a época do ano em que estamos: o período de ciclones tropicais começam em junho, terminam a 30 de novembro e acentua-se na última metade de agosto e durante o mês de setembro. Mas este é especial porque está numa luta de poder com o anticiclone dos Açores.

Enquanto assim for, uma brisa mais fria pode chegar a Portugal Continental e aliviar o calor. Só que o resultado dessa batalha entre a depressão Leslie e o anticiclone dos Açores já é conhecido: o anticiclone vai levar a melhor. De acordo com o Instituto Português do Mar e da Atmosfera, o Leslie vai começar a encaminhar-se mais para oeste deixando de influenciar tanto o tempo em Portugal Continental. E não só o anticiclone vai deixar de ter concorrência, como até se vai intensificar. E, com isso, o calor vai continuar por cá.

* Está explicado porque devemos ter cuidado.

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