21/08/2018

RITA GARCIA PEREIRA

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Crónica de uma ilha 
(pouco) anunciada

Porto Santo tem muitos encantos e, por via de regra, quem os estraga são os de fora, as mais das vezes em Lisboa, mesmo quando afirmam “estar atentos”. Imagine-se se não estivessem.
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Desde que me lembro de mim mesma que venho para Porto Santo, essa ilha do arquipélago da Madeira que é anunciada como uma espécie de caraíbas portuguesas. Ainda antes de conhecer as praias algarvias, percorria, como hoje percorro, os mais de seis quilómetros de areal e entrava no mar que, quando o tempo ajuda, deve ser dos mais quentes de Portugal. A paisagem é, de facto, lindíssima mas esconde um conjunto de dificuldades de que a maior parte dos turistas só se apercebe quando se trata das idas e vindas. O postal retrata a praia mas omite as agruras de um povo que resiste, quando não com uma aceitação que me enerva, pelo menos com uma resiliência notável.

Para os que não sabem, as pessoas que moram em Porto Santo dependem (e em muito!) do barco e da ligação aérea para o Funchal, já que, por erros do passado, esta ilha vive fundamentalmente do turismo de Verão, quase nada sendo produzido aqui. Não nascem crianças aqui porque apenas existe um centro de saúde, pelo que quem aqui adoeça (depois de passar pelo crivo de uma certa médica e conseguindo sobreviver-lhe…) é evacuado para o Funchal. Uma extrema dependência da ilha maior que, ao invés de diminuir nos meses frios, se acentua.

Por outro lado e como os habituais sabem, um Verão mais fraco significa necessariamente fome no inverno, porque aqui as fichas foram todas jogadas nos três meses de férias e na construção civil desenfreada, com bastantes imóveis deixados ao abandono assim que estalou a crise. Não discuto as opções que foram tomadas porque sempre me pareceram erradas e, aliás, fazer depender a economia quase exclusivamente do turismo parece ser um fenómeno a alastrar para todo o terreno.

Daqui resulta, também e à semelhança do que sucede com o país, que Porto Santo precisa de turistas e, em larga medida, eles chegam de avião. Sucede que, tendo a TAP deixado de assegurar a designada “ponte” entre as duas ilhas e após dois concursos públicos (com a SATA e a Aerovip, sucessivamente, a encarregarem-se de tal), houve um manifesto atraso no lançamento daquele que deveria estar agora a satisfazer as necessidades de transporte, já que em Lisboa, pelos vistos, se esqueceram deste pedaço de Portugal.

Pela primeira vez, ganhou uma companhia das Canárias, sem que alguém tivesse questionado as suas motivações, capacidade ou (porque não?) consciência do serviço público que se propuseram realizar.

O resultado do dito concurso foi anunciado com pompa e circunstância, já que a Binter prometia uma qualidade de serviço superior – o que, diga-se, tendo presente a que existia, não era algo difícil de conseguir…

Contudo, o que é certo é que, em pleno mês de Agosto, tais ligações começaram a falhar clamorosamente, num primeiro momento justificadas com inexistentes questões climatéricas e, depois, anunciadas sem qualquer motivo. Se uns passageiros não conseguem sair de Porto Santo, muitos outros não chegam, sendo que a imagem deixada representa um dano irreparável para uma ilha que não o merece e que precisa de toda a boa publicidade que possa ter.

Dito de outra forma, Porto Santo tem muitos encantos e, por via de regra, quem os estraga são os de fora, as mais das vezes em Lisboa, mesmo quando afirmam “estar atentos”. Imagine-se se não estivessem.

IN "O JORNAL ECONÓMICO"
17/08/18

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