20/08/2018

FILIPE MORAIS

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Ultrapassar à má fila

Se ainda ninguém tinha reparado nos números, podem ver agora. São oficialmente preocupantes. Nesta semana estivemos nas freguesias com a habitação mais cara de Lisboa e Porto. Estão as duas a perder moradores a um ritmo acelerado, porque, na freguesia de Santo António, em Lisboa, o metro quadrado já chegou aos 4000 euros e na freguesia do centro histórico do Porto vai nos 1600 euros. 
 Uma valorização de 40% num ano em Lisboa e de 45,2% no Porto. 
 Há meses que o Banco de Portugal alertou oficialmente para os riscos de uma bolha imobiliária no mercado nacional, mas esta parece continuar a encher. E se os preços de casas, que deviam ser acessíveis à maioria da classe média, não assustam, talvez outros sejam mais preocupantes: no Porto, o centro histórico perdeu quase 1600 residentes em dois anos. Santo António, em Lisboa, lida diariamente com cerca de 200 mil pessoas, mas tem menos de 12 mil eleitores e o autarca Vasco Morgado admite ao Dinheiro Vivo que possa cair abaixo dos dez mil. E que a população de Lisboa, a capital, baixe para menos de 500 mil. Vasco Morgado fala mesmo no conceito de uma “cidade-cenário” e não tem problemas em dizer que quem compra casas com os preços atuais são estrangeiros, que estão nas cidades uns dias por ano e que deixam as casas vazias. Os sinais são mais do que evidentes, as medidas para regular o mercado ainda não.

É certo que o problema não é exclusivamente português. Nos nossos antípodas passa-se algo semelhante, mas as medidas foram bem mais radicais. A primeira-ministra neozelandesa prometeu durante a campanha e cumpriu. Depois de os preços médios das casas na Nova Zelândia terem disparado 57% desde 2010, e 5% só em 2018, Jacinda Ardern levou a votos a proposta de limitar a venda de casas a estrangeiros, porque “o governo acredita que os neozelandeses não devem ser ultrapassados por compradores estrangeiros com mais poder de compra”. Por cá, essa ultrapassagem acontece diariamente, num país ainda a sair de uma crise e sem o nível de vida da Nova Zelândia. Dificilmente Portugal tomaria uma medida como esta, mas a urgência de uma regulação eficaz do mercado imobiliário não podia ser mais clara.

IN "DINHEIRO VIVO"
19/08/18

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