10/07/2018

CARMO MACHADO

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 STOP

Parem com esta vergonha, senhores políticos! Porque nós estamos fartos de ver a educação ser tratada como uma mulher de alterne, por quem se vive uma paixão que logo desaparece na legislatura seguinte

Sim, parem. Mas parem de vez. Se não vivem o vosso dia a dia numa escola pública, se não vos passa pela cabeça o que é ensinar alunos de escolas de territórios educativos de intervenção prioritária ou outros, se nunca foram professores na vossa vida ou se o foram apenas em ambientes controlados como é ensinar no ensino universitário ou em colégios privados de elite, caros senhores, por favor, calem-se! Posso excluir deste rol aqueles que fizeram da sua vida e da sua carreira um estudo permanente das Ciências de Educação mas mesmo vós, excelentíssimos doutores, peçam aos políticos que nos consultem antes de legislar porque, de mudanças coladas com cuspo, estamos já fartos. Eis chegada a hora de dizermos Basta! Consultem-nos com tempo e honestidade. Consultem-nos para saber que projeto temos nós, professores, para a Educação em Portugal. E a vós, caríssimos diretores escolares, façam reuniões gerais para discutirmos medidas de inovação, medidas de combate à indisciplina, estratégias de motivação dos nossos alunos que estão, muitas vezes, tão fartos deste sistema quanto nós... Parem de nos convocar para nos contarem novamente quais as regras a cumprir nas vigilâncias dos exames nacionais, por amor de Deus!
 
Vivemos tempos difíceis para os professores. Como é injusta esta afirmação! Vivem-se tempos difíceis para quase todos, exceção feita a alguns banqueiros e a todos os corruptos, políticos ou não, com contas chorudas adormecidas à sombra de offshores. O resto vai vivendo como pode. E os professores carregam às costas as disfunções deste país desgovernado, desta justiça em banho-maria, desta saúde adoentada e, sobretudo, desta sociedade onde os atores de telenovela, os futebolistas, os presidentes dos clubes de futebol e os participantes nas casas dos segredos são hoje os verdadeiros heróis nacionais.

Os professores têm feito milagres nas últimas décadas com matéria-prima de fraca qualidade e recursos que deixam muito a desejar. Já não bastava andarmos com a casa às costas, termos seis turmas diferentes, darmos aulas a trinta alunos numa sala apertada, passarmos humilhações difíceis de imaginar, darmos aulas em horário não letivo (que ninguém nos paga), sermos verdadeiros administrativos quando deveríamos era termos tempo para pesquisar, ler e estudar, termos a culpa pelos maus resultados dos alunos, sermos agredidos por pais e encarregados de educação... como agora também sermos alvo desta grande injustiça nacional: apagar nove anos, quatro meses e dois dias de vida profissional aos docentes. Parece estar encontrado o verdadeiro saco de boxe da sociedade portuguesa da atualidade.

Parem com esta vergonha, senhores políticos! Porque nós estamos fartos de ver a educação ser tratada como uma mulher de alterne, por quem se vive uma paixão que logo desaparece na legislatura seguinte. Não podemos, professores, alunos, pais e encarregados de educação, continuar a depender destas alternâncias políticas nem dos caprichos de ministros que nunca deram uma aula na escola básica e/ou secundária e que, por isso mesmo, não sentem nem sabem o que os livros sobre educação não lhes podem contar. A educação tem de deixar de ser uma paixão para ser um amor para a vida inteira.

A sociedade mudou, meus senhores. A mobilidade social é cada vez mais difícil de alcançar. A educação não pode ser um uniforme de tamanho único que, nestas condições, acabamos por ser obrigados a vestir a todos os alunos (com a tão proclamada redução, parece que iremos passar de 30 para 28 alunos, o que fará certamente toda a diferença), quer eles caibam lá dentro quer não. Porque, meus senhores, a dinâmica das estratégias políticas limita a implementação e o desenvolvimento dos processo de mudança. E além disso, não há nem haverá nunca mudanças sem os professores. Não há, os professores sabem disso, um projeto estruturado para a Educação em Portugal. Fazem-se mudanças – geralmente abruptas - de acordo com quem entre e quem sai dos cargos políticos, mudanças que nos chegam desse Deus invisível que se chama Ministro da Educação mas a quem, nós, professores, não conseguimos nunca rezar. Por que será? Seremos todos nós descrentes e vazios de fé, esta classe de gente perdida, estes insatisfeitos e exigentes funcionários do estado, com a vida tão facilitada e férias a não ter fim? Ou seremos nós, professores de Portugal, demasiado pacientes? Talvez... talvez seja defeito profissional visto trabalharmos diariamente com crianças e jovens - muitos deles provenientes de famílias desestruturadas - que connosco contam como âncora ao longo de tantos anos das suas vidas.

Não, senhor Ministro, nós não somos meros funcionários do Estado. Talvez não saiba mas somos muito mais do que isso! E dizemos-lhe que até funcionamos muito bem tendo em conta os contextos de mudança em que temos vivido desde a revolução de abril. Mas, senhor Ministro, agora chegou a hora de lhe dizermos que estamos cansados de funcionar.

Saberá o senhor Ministro que a concretização das políticas educativas falha e falhará sempre sem os professores? Saberá ainda, caro Ministro da Educação, que estamos velhos e cansados, alguns até mortos já? Mas não se iluda, caro senhor. Os professores nunca até aqui mostraram a sua força. Estamos divididos. Contando por alto, são catorze estruturas da FNE e da Fenprof, mais oito sindicatos independentes e o recentemente criado S.T.O.P., feito (segundo parece) por professores que dão aulas para professores que dão aulas e ainda por cima, apartidário. Mas não deixa de ser demasiada gente a decidir, ou pior, a dividir...

Senhor Ministro: os professores precisam do respeito da sociedade, dos pais, dos alunos. Sejam vocês a dar o exemplo ao país. Ou então, só nos resta defender um novo caminho por onde a Educação deve seguir. Afastada dos partidos e dos seus interesses e ligada a uma sociedade livre, pensante, preocupada com o Presente e com o Futuro sem nunca se esquecer do seu Passado. Utopia? Talvez, senhor Ministro! Porém, lembre-se: somos professores, partilhamos o sonho e oferecemos criatividade. É que nem todos os professores deste país morreram ainda, senhor Ministro da Educação.

Sindicatos: a partir de setembro esqueçam as greves aos primeiros tempos da manha bem como as manifestações na avenida! A partir de setembro, quando quiserem abrir as escolas e começar as aulas, promovam a união da classe docente! Mostrem-nos que têm coragem para promover a verdadeira união da classe docente! Mostrem ao país que defendem a qualidade da educação. Convoquem a verdadeira revolução: que nos vistamos todos de preto e fiquemos às portas das escolas; que ninguém dê aulas; que os professores mais motivados arrastem consigo os colegas adormecidos; que os diretores se unam aos professores numa luta comum; que os pais e encarregados de educação se juntem a nós. Sem medo, colegas! Os alunos apoiar-nos-ão na nossa luta e os pais, que nos conhecem como bons professores e diretores de turma, seguir-nos-ão e trarão os outros. Porque só eles sabem que somos professores vinte e quatro horas por dia e estamos e estivemos sempre lá, desde o primeiro dia em que nos entregaram os seus filhos ainda pequenos... Eles sabem disso.

Colegas: uma vez o acesso à educação está praticamente garantido em Portugal, falta agora arregaçar as mangas e lutar pela sua qualidade. Somos nós professores, que temos de fazer esta luta. Mais ninguém – exceto por razões e com fins políticos - parece ter coragem ou capacidade de a iniciar. O que ensinar? Como? Com que fins? Somos nós, colegas, que temos de tomar içar as velas desta barca que naufraga. Os problemas da escola são os problemas da sociedade e vice-versa mas a sociedade parece ainda não ter entendido isto.

Chegou a hora de pararmos de obedecer cega e estupidamente a este desnorte! Somos profissionais pensantes. Queremos mudanças! Queremos o tempo de serviço a que temos direito (nem sequer estamos a pedir retroativos)! Exigimos qualidade! Exigimos respeito! Se somos nós que no terreno lutamos diariamente contra os muitos constrangimentos do sistema, seremos nós também que temos de mostrar aos nossos políticos que não estamos interessados nos seus jogos de poder. Sem medo, colegas!

Pessoa, tu sim, tu tinhas razão. É hora!


*Carmo Miranda Machado é formadora profissional na área comportamental e professora de Português no ensino público há vinte e sete anos, tendo trabalhado com alunos do 7º ao 12º anos de escolaridade. Possui um Mestrado em Ciências da Educação (Orientação das Aprendizagens) pela Universidade Católica Portuguesa e tem como formação base uma Licenciatura em Línguas e Literaturas Modernas pela Universidade Nova de Lisboa. Tem dedicado a sua vida às suas três grandes paixões: o ensino, a escrita e as viagens pelo mundo. Colabora na Revista Mais Alentejo desde Fevereiro de 2010 como autora da crónica Ruas do Mundo, tendo ganho o Prémio Mais Literatura atribuído por esta revista nesse mesmo ano. Publicou até ao momento, os seguintes títulos pela editora Colibri: Entre Dois Mundos, Entre Duas Línguas (2007); Eu Mulher de Mim (2009); O Homem das Violetas Roxas (2011) e Rios de Paixão (2015).

IN "VISÃO"
05/07/18

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