23/06/2018

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HOJE NO 
"DIÁRIO DE NOTÍCIAS"
Ana Figueiredo, 100% no exame 
.de medicina mais temido: 
"Não recomendo a ninguém o que fiz"

Ana Figueiredo, 25 anos, 100% no Harrison, o exame mais difícil para os estudantes de medicina. "Podia ter terminado em burnout"

"Não recomendaria o que eu fiz a ninguém. Podia ter terminado em burnout, entrado em exaustão." Entre julho e novembro do ano passado, Ana Carolina Figueiredo, de 25 anos, estudou uma média de 12 horas diárias, sem um único dia de descanso. "Só tirei uma manhã para ir à Ordem dos Médicos", adianta. Reconhece que talvez lhe tenha faltado "o bom senso", mas o objetivo era difícil. "Queria tirar a melhor nota possível no Harrison [o exame que dita a ordem pela qual os médicos escolhem a especialidade]." Conseguiu o melhor resultado deste ano: 100%.
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Como acertou em todas as respostas, a jovem, natural da zona de Coimbra, foi a primeira médica do país a escolher a especialidade: dermatovenereologia, no Centro Hospitalar e Universitário de Coimbra (CHUC). Diz-nos que talvez não seja o melhor exemplo, porque, ao contrário do que acontece com muitos colegas, a qualidade de vida e a remuneração não pesaram muito na escolha. "Uma das razões foi a residência, pois tinha um serviço de qualidade perto de casa", adianta.

Tinha todas as possibilidades em aberto, mas dermatologia já lhe despertava interesse desde a licenciatura. "É uma especialidade muito visual, na qual o olho clínico é muito importante. Além disso, em contexto hospitalar, há várias patologias raras interessantes de seguir", justifica. Assume, no entanto, que a escolha não foi fácil. "Porque gosto de imensas especialidades. Cardiologia, por exemplo, captou-me a atenção. E medicina interna, que é a menos escolhida, também me interessa."

Américo Figueiredo, diretor do serviço de Dermatologia e Venereologia do CHUC, ainda não teve contacto com a jovem médica, que começa o internato médico em janeiro de 2019. Ao DN, aponta algumas das razões pelas quais os internos costumam escolher aquele serviço. "Temos uma equipa altamente diversificada. Temos quase metade do serviço com doutoramento e com capacidade de publicação e afirmação internacional." Segundo o especialista, "para um jovem com ambição, todos os caminhos se abrem".

Outro dos fatores é, de acordo com o professor catedrático, a existência de médicos brasileiros a realizar estágio no serviço. A qualidade, ressalva, estende-se aos restantes serviços de dermatologia do país, o que contribui para que esta tenha sido uma das primeiras especialidades a preencher todas as vagas. "E junta-se também um fator de rentabilidade económica. Há mais dermatologistas a trabalhar no privado do que no público."

Uma decisão para a vida
O Harrison - que ao que tudo indica tem os dias contados - é bastante temido pelos jovens médicos. "É um peso grande. Há muita pressão", diz Ana Carolina, não pondo de lado o fator sorte. Admite que queria tirar mais de 90%, mas não estava à espera do 100%. "Era uma utopia, que se tornou realidade."

Ver a nota "foi um alívio". Foi perceber que "não tinha limitações", pois podia escolher qualquer especialidade. "Parecia irreal", recorda a médica, que desde muito nova dizia que "gostava de picadas e enfermeiros".

Hospitais privados são primeira opção entre os melhores alunos
O Serviço Nacional de Saúde (SNS) continua a ser responsável pela formação da maioria dos médicos internos em Portugal, mas os privados são cada vez mais uma opção para os primeiros médicos a escolher a especialidade, ou seja, para os que têm melhores notas na prova nacional de seriação (Harrison). Duas unidades hospitalares geridas pelo Grupo Luz Saúde - o Hospital da Luz Lisboa e o Hospital Beatriz Ângelo (parceria público-privada) -, foram primeiras escolhas dos licenciados em Medicina para a formação pós-graduada em cinco especialidades.

Também o hospital de Braga e o hospital de Cascais, ambos PPP, foram selecionados por alunos com classificações superiores a 90% no famoso exame Harrison para a realização do internato médico em 2019.

Nas especialidades de gastroenterologia, ginecologia/obstetrícia e ortopedia, o Hospital Beatriz Ângelo (HBA) foi primeira escolha por parte dos internos de Medicina. Tal como medicina interna e anestesiologia no Hospital da Luz. Para Rui Maio, diretor clínico do HBA e diretor clínico adjunto da Luz, existem várias razões para a escolha daquelas unidades, nomeadamente o facto de serem "hospitais novos, que trabalham de forma multidisciplinar, com equipas jovens". Há um "trabalho sério, feito com respeito pelos protocolos, medicina baseada da evidência".

Na opinião do diretor clínico do HBA, a escolha é muito baseada no "passa-a-palavra". Enquanto professor catedrático de Cirurgia da Faculdade de Ciências Médicas da Universidade Nova de Lisboa, diz que muitos alunos passam pelo HBA e pelo Hospital da Luz durante a formação pré-graduada, o que lhe permite perceber a dinâmica do hospital. Daí que, nos últimos anos, estas unidades têm sido selecionadas para a formação de especialização por muitos dos médicos com melhores notas no Harrison.

Para os hospitais privados, existe todo o interesse em ter médicos a realizar o internato. "Está no nosso ADN formar. A formação é uma parte vital para os hospitais, porque cria uma dinâmica positiva nos serviços", refere Rui Maio.

* 100% é uma nota cósmica, revela capacidades de sacrifício e inteligência notáveis, desejamos também uma notável componente de humanidade.

** Especialidade médica que se ocupa do diagnóstico e tratamento medico-cirúrgico das doenças que afectam o maior órgão do corpo humano – a pele. Engloba ainda as doenças que atingem o cabelo, unhas, as mucosas, bem como as doenças de transmissão sexual venereologica.

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