30/06/2018

ALEXANDRA ALMEIDA FERREIRA

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A sorte que tivemos com  o
presidente Bruno de Carvalho!

Não foram poucos os “letrados”, “educados” e “ricos” que aplaudiram Bruno de Carvalho contra os viscondes que o antecederam. Na política não é muito diferente.

Não ligo a futebol. É a primeira declaração de (des)interesse a fazer. Quando assim é, e no caso de uma mulher, herdamos o clube do pai. Fica-nos bem. A segunda declaração de interesse é que este artigo não é sobre futebol ou gestões desportivas, vitórias ou derrotas no campeonato. Na verdade, não quero saber. Este artigo é sobre política, governos e governados.

Poucos dias antes da eleição de Bruno de Carvalho – uma vez mais para ter assunto ao jantar com o meu pai – dei-me ao trabalho de ouvir a entrevista, porventura a última, do presidente sportinguista antes de uma reeleição esmagadora com quase 90% dos votos. Indiferente que sou ao Sporting ou adversários, ouvi o político. Um lunático carregado em ombros por uma multidão de adeptos frustrados com as derrotas de um clube. Um homem obcecado consigo próprio que pensava carregar aos ombros o peso da Humanidade. Um salvador. Mal-educado, agressivo. Compulsivo. Um ditador. 

“A partir de hoje eu sou o presidente de todos os sportinguistas e isso é o mais importante”. Bruno de Carvalho, dixit. Eu represento a vontade de todos. Eu tenho todos em mim.

Agora a política. O descontentamento das massas é terreno fértil para o populismo e para os líderes populistas que encerram em si a tentação da ditadura. Portugal é um país sortudo porque lidou com o problema numa esfera pouco relevante que é o futebol. A Alemanha lidou com Hitler. Agora que as lutas se fazem pela economia e não pelas armas, a Grécia provou do pior do populismo com um governo que primeiro faliu o país para depois se resignar e reconstruí-lo em democracia europeia. Os EUA elegeram Trump. Espanha levou a governo movimentos nacionalistas musculados. Itália, os partidos de extrema-esquerda e direita.

Há reflexões a fazer sobre o que cega as multidões, sem distinção de grau literário ou nível de rendimento. Não foram poucos os “letrados”, “educados” e “ricos” que aplaudiram Bruno de Carvalho contra os viscondes que o antecederam. Em política, um Bloco de Esquerda chegou ao Governo, ainda que por via do apoio parlamentar, porque uma fatia relevante da sociedade se quis zangar com os “viscondes” e resolveu votar em protesto.

Hoje temos um Governo refém dos sindicatos por causa desse voto de protesto. Um país que não cresce porque governa em minoria se as políticas forem orientadas para as empresas e não para aumentos inconsequentes de rendimento à custa de endividamento. Um país de défice artificial (à custa de retenções de impostos e manutenção de austeridade) mas de dívida descontrolada. Eis o preço a pagar por eleições que acontecem contra o status quo a todo o custo e não numa perspetiva de construção. Sem olhar aos protagonistas ou simplesmente sendo vulneráveis a frases eloquentes e galvanizadoras que têm tanto de canto de sereia como de absoluto vazio de realidade.

Por isso, obrigada Bruno de Carvalho. Obrigada por, à custa de uma coisa pouco importante como é o futebol, ter dado uma lição de política aos portugueses, porque a de José Sócrates aprendemo-la tarde demais: pior do que viscondes, pior do que o “antes”, é a cegueira do povo que se encanta com nada porque estava desencantado com tudo.

IN "O JORNAL ECONÓMICO"
29/06/18

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