24/05/2018

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Quase metade dos portugueses entre os
.25 e os 34 anos ainda vivem com os pais

O juiz ainda tentou convencer o homem de 30 anos a seguir a vontade dos pais e sair de casa, mas não conseguiu. Num caso insólito, a justiça americana deu 30 dias a Michael Corrondo para ir à sua vida. Os jovens portugueses também adiam cada vez mais a saída de casa. Pode não chegar a este extremo, mas há quem precise de muitos sinais para largar o ninho


Ricardo não acredita que os pais alguma vez chegassem ao ponto de o expulsar de casa, mas agora que olha para trás lembra que foram muitos os sinais “simpáticos” de que estava na altura de sair.
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Tinha 30 e poucos anos, trabalhava desde os 18, até já tinha um apartamento equipado, mas era o conforto da cama feita, da roupa lavada, da comida na mesa ao final do dia. “Sabia-me bem estar em casa, estar ali quente no ninho, não me preocupava em sair. Isto é feio de dizer mas é a mais pura das realidades”.
Os pais, a certa altura, é que terão deixado de achar tanta graça. Primeiro foi o pedido para que começasse a pagar de vez em quando as contas do supermercado. “Não era que precisassem de ajuda, penso que foi uma forma de pressionar”.

Não funcionou e seguiram-se as instruções para que passasse a pôr o carro na rua de trás em vez de ocupar espaço na garagem. Depois veio o problema da internet: se queria estar online no quarto, que arranjasse linha própria para não ter o telefone sempre impedido. A roupa que desde adolescente deixava no chão deixou de aparecer misteriosamente no cesto e o jantar também já não o esperava todas as noites na mesa.

“Uma vez, a meio da semana, foram passar uns dias a casa de um tio no Algarve e liguei-lhes para saber onde estavam. Não me tinham dito nada, nem tinham de dizer, mas comecei a perceber”, conta Ricardo Gonçalves, hoje com 46 anos. “Nunca me disseram abertamente para sair, ainda que a minha mãe na brincadeira sublinhasse que eu já era um homem”.

As palavras da namorada de então e as bocas do irmão mais novo, que já tinha saído de casa há muito, revelaram-se decisivas. Mas há sempre um mas. “Ainda hoje a minha mãe ao fim de semana vai buscar-me a roupa a casa para lavar, esteja eu ou não. E como temos a mesma empregada, se é preciso comprar alguma coisa para a casa, diz-lhe e ela compra. Eu pago”.

Ricardo saiu de casa por volta dos 34 anos, o que é um pouco acima da média para Portugal mas é a realidade de muitos jovens portugueses, de cada vez mais. Segundo os últimos dados do Eurostat, atualizados há dias, na última década a idade média para sair de casa dos pais em Portugal subiu dos 28,5 anos para 29,2 anos. Cerca de 62% dos jovens entre os 18 e os 34 anos vivem com os pais, quando há dez anos esta era uma realidade para 56,6% dos portugueses nesta faixa etária. Estreitando um pouco as idades, entre os 25 e os 34, quase metade dos jovens portugueses (45,6%) ainda não abandonou o ninho, segundo dados de 2016. Em 2006 eram 39,3%. Uma percentagem que ontem, como hoje, é bastante superior à média da União Europeia, onde apenas 28,5% dos jovens destas idades continuam a viver com a família.

O tema tem merecido várias análises, do prolongamento dos estudos à precariedade do mundo do trabalho, onde a taxa de desemprego entre os jovens é superior à da população em geral. Esta semana, porém, uma sentença nos EUA abriu uma espécie de caixa de pandora: o Supremo Tribunal do Condado de Onondaga, em Nova Iorque, condenou um homem de 30 anos a sair de casa dos pais, num processo movido pelos próprios. A imprensa local fala de uma audiência “surreal”, em que o juiz tentou convencer durante meia hora Michael Rotondo a sair pelo próprio pé, depois de os pais já lhe terem passado várias ordens de despejo e de até já lhe terem dado dinheiro para encontrar um novo poiso.

Rotondo alegou que tinha direito a ficar mais seis meses na casa da família, dizendo que não estava preparado para sair, embora os pais não lhe tratem da roupa nem lhe façam a comida. O jornal “Syracuse” conta que o juiz chegou a sugerir-lhe o Airbnb para uma estadia temporária, mas nem assim. Resultado: deixou o tribunal com uma ordem para sair de casa no prazo de 30 dias, da qual tenciona recorrer.

O caso poderá ter outros contornos e parece algo extremo, admitem Ricardo e também Isabel Ribeiro, que acredita ainda menos que os pais algum dia fizessem algo do género para a pôr fora de casa.
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Quanto à sensação de querer ficar em casa dos pais, não causa tanta estranheza. Isabel não teve sentimentos de culpa quando a casa onde cresceu passou a funcionar como uma espécie de hotel e admite que eles ficaram felizes quando finalmente saiu, aos 37 anos, mas sobretudo por ser sinal de que finalmente ia orientar a sua vida. “A minha mãe pensava que eu ia ficar lá para o resto da vida”, sorri.
Tal como Ricardo, Isabel não tinha tarefas domésticas. Quando deixou de aparecer em casa para jantar, e a mãe começou a acusar ficar chateada com a comida desperdiçada, acabou por acordar com os pais que, quando fosse comer, avisava. De resto, não havia mais momentos de tensão. “Havia semanas em que basicamente só os via ao sábado, deixava recados à minha mãe na cozinha”, lembra Isabel, hoje com 40 anos e que mesmo assim mantém o cordão umbilical: a mãe faz-lhe o almoço e também lhe trata das roupas mais delicadas. “Saí quando o meu namorado veio para Lisboa e decidimos que íamos viver juntos, mas hoje os meus pais ainda dizem que a casa é minha, que tenho o meu quarto. E eu continuo a referir-me à casa dos meus pais como sendo ‘a minha casa’”.

* E assim se formatam adultos infatilizados.

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