28/01/2018

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ESTA SEMANA NO
"SOL"
Nomeações promíscuas 
na aviação e aeroportos

Ponce de Leão foi nomeado pelo Governo para presidir à NAV. A mesma pessoa que esteve envolvida no processo de privatização da ANA, como consultor e também como mediador das negociações. E que presidiu à ANA de capitais públicos e à ANA da Vinci. Nesta, foi rendido por José Luís Arnaut, que tem Luís Patrão na sua administração.

O Governo de António Costa nomeou Jorge Ponce de Leão para o  cargo de presidente do Conselho de Administração da Navegação Aérea de Portugal – NAV Portugal. O mesmo nome que esteve como responsável pelo processo de privatização da ANA e um dos responsáveis por desenhar a alienação da empresa no Executivo de Passos Coelho, enquanto consultor da PLMJ. A sua nomeação foi aprovada em Conselho de Ministros do passado dia 11 de janeiro, depois de a empresa de tráfego aéreo nacional estar sem presidente desde final de setembro, altura em que Albano Coutinho apresentou a demissão do cargo.
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Ponce de Leão deixou o cargo de presidente da ANA para aceitar o convite do Governo de António Costa (feito a 4 de Dezembro de 2017), tendo sido substituído no cargo pelo ex-ministro social-democrata José Luís Arnaut.

Privatização a 100%
Quando, em 2012, o Executivo de Pedro Passos Coelho decidiu privatizar a ANA Aeroportos, apesar do memorando de entendimento da troika prever uma alienação parcial, optou por alienar a empresa a 100%. Para apoiar juridicamente este processo, foi contratado o escritório de advogados PLMJ, cujo consultor  de alta direção de gestão jurídica era Ponce de Leão. Curiosamente, seis meses mais tarde, é ele o nome escolhido pelo Governo de Passos Coelho para presidir à ANA, em substituição do socialista Guilhermino Rodrigues.

Já com Ponce de Leão à frente da empresa de tráfego aéreo, foi aprovado o processo de privatização. No entanto, em vez de ser por concurso público, o Executivo optou por avançar por ajuste direto, ou seja, mantendo a negociação direta com os potenciais interessados. E, mais uma vez, o rosto responsável por essa negociação em nome do Estado português foi... Ponce de Leão.

Em reunião de Conselho de Ministros foi determinada a admissão dos potenciais investidores de referência para procederem à apresentação de intenções de aquisição a participar na fase subsequente do processo de venda por negociação particular no âmbito deste processo de alienação. Mas, ao contrário do que aconteceu até aqui – em processos de alienação semelhantes –, foi apenas a reunião de Conselho de Ministros o quadro jurídico da operação, uma vez que nem o contrato de concessão nem as suas bases foram objeto de apreciação.

A partir daí foi um passo até o ministro das Finanças publicar um despacho para fixar o prazo de apresentação das propostas vinculativas no âmbito desta operação.

Já nessa altura, os potenciais interessados na empresa tinham admitido publicamente que pretendiam manter à frente da gestão da ANA (de capitais privados) o gestor público da ANA (de capital público), ou seja, a mesma pessoa com quem eles tinham negociado o contrato de concessão: Ponce de Leão.

Negócio em causa
Na altura, também o grupo francês Vinci - um dos cinco candidatos que passaram à segunda fase da privatização da ANA e que acabou por sair vencedor desta corrida - garantiu que queria manter a atual equipa à frente da empresa.  «Não temos uma equipa para a substituir e por isso vamos manter a equipa na qual depositamos uma grande confiança. Ela conseguiu dominar o negócio e também as áreas fora do negócio [aeroportuário]», disse Louis-Roch Burgard, durante a apresentação da proposta.

Curiosamente, a comissão de acompanhamento de privatização da empresa só foi nomeada no final de 2012, três dias antes de ter sido assinado o contrato de concessão entre a ANA e o Estado português e 12 dias antes de ser revelado o vencedor: grupo Vinci. Um negócio que permitiu aos cofres do Estado um encaixe de 3.080 milhões de euros.

Só mais tarde é que esta comissão de acompanhamento deixou alguns alertas em relação a todo este processo: «As regras do jogo, quadro regulatório, foram alteradas no decurso do processo. No inicio deste, havia um quadro regulatório preciso, em especial no que diz respeito às taxas de tráfego (...). Mas essa regulação desapareceu a meio, com a aprovação do Dec. Lei nº254/2012, de 28 de Novembro».

Aliás, as negociações com todos os concorrentes foram concluídas já no decorrer do processo de privatização. Um facto que chegou a ser confirmado pela empresa vencedora - o próprio presidente da Vinci chegou a admitir essa situação.

E o contrato, além de alterar o modelo de regulação - daí a empresa ter avançado com aumentos das taxas aeroportuárias, e já vai a caminho do décimo aumento -, também liberta o próprio concessionário da responsabilidade de financiar o investimento no novo aeroporto. «A regulação económica do serviço concessionado passou, também a meio do processo, da lei para o contrato. (...) presente processo de privatização foi acompanhado de uma desregulação legal dos aspetos económicos do serviço público aeroportuário», diz a comissão de acompanhamento, acrescentando ainda que, no seu lugar, surgiu «uma regulação económica de índole meramente contratual e o contrato não exclui que venha a recair sobre o Estado o investimento necessário à construção do aeroporto».

 Isto significa que o grupo francês passou a ter apenas a responsabilidade de propor uma solução. No entanto, se esta não for aprovada, após uma série de períodos negociais, o Estado é declarado incumpridor e responsável por indemnizar o privado.

Os riscos deste negócio também estiveram presentes num estudo realizado pela Universidade Católica, que apontou para um retrocesso face ao modelo que estava anteriormente em vigor. Já Pedro Marques, ministro do Planeamento e das Infraestruturas, disse, no início deste ano, numa audição na Assembleia da República, que um novo aeroporto para a região de Lisboa deixou de ser possível depois do anterior Governo ter optado pelo modelo de privatização da ANA: «Com o modelo de privatização da ANA que o anterior Governo aplicou (recebimento do preço ‘à cabeça’ como receita extraordinária para baixar o défice), comprometeu-se a construção de um novo aeroporto de raiz financiado por taxas aeroportuárias».

Montijo e mais interesses
O que é certo é que ficou estabelecido que o país avançaria para a construção de um novo aeroporto de Lisboa quando a Portela atingisse os 22 milhões de passageiros. Uma barreira foi ultrapassada já em 2016 , mas o processo só teve desenvolvimentos em 2017, com a assinatura, em fevereiro, de um memorando de entendimento para o futuro aeroporto complementar do Montijo.

No entanto, ao que o SOL apurou, a decisão de investimento no Montijo necessita de tecnicamente ser justificada e, para isso, é necessário eliminar as atuais restrições existentes na gestão do espaço aéreo que limitam a capacidade da Portela + Montijo. Desta forma, aparece a necessidade da NAV flexibilizar as suas exigências e proceder à implementação de novos padrões de gestão do espaço aéreo, sabe o SOL. Mais um trabalho que estará a cargo de... Ponce de Leão.

Mas os interesses não ficam por aqui. Para levar a cabo a reformulação da gestão do espaço aéreo é necessário investir numa nova solução tecnológica. E já começaram a surgir no terreno dois potenciais fornecedores para esta solução: os espanhóis da Indra e os franceses da Thales. 

Curiosamente, a Vinci tem no seu Board of Directors a presidente da Thales International, Pascale Sourisse, e também o próprio Ponce de Leão apareceu, no passado recente, como subscritor de uma parceria entre a ANA/Vinci e a Thales.

* Se perguntar não ofende atão perguntamos: Esta promiscuidade referida na notícia tem a ver com prostíbulos e lenocínio políticos?

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