27/11/2017

JOSÉ PACHECO PEREIRA

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Uma campanha que 
não leva a lado nenhum

Será que o PSD tem mesmo os militantes que diz que tem, ou a sangria dos últimos anos tornou-o um partido muito mais pequeno do que os falaciosos números oficiais? Será que um elemento importante não seria conhecer, nos últimos 20 anos, o movimento real de entradas e saídas de militantes?

Como se os problemas do PSD não fossem bastantes, a actual campanha eleitoral não defronta nenhum deles a sério. Porque é que sabendo todos os militantes, a começar pelos candidatos, dos graves problemas políticos que tem o partido nenhum fala deles preferindo formulações vagas e juras de continuidade não se sabe bem a quê? A resposta e simples: é que a doença ainda é maior do que se podia pensar. E o possível debate faz-se no meio dos rodriguinhos e dos salamaleques com que em Portugal se discute qualquer coisa, com as maiores baias possíveis, e com uma enorme discrepância entre o que se diz em público e o que se faz na intriga. Esta distância entre o discurso oficial e a intriga, com prevalência desta, não revela apenas uma hipocrisia institucionalizada, mas também que os mecanismos do poder interior dependem muito mais da "contagem de espingardas" do que do esclarecimento e do convencimento.

Quando no PSD se precisa urgentemente de levar a sério a discussão sobre o que se passou nos últimos anos, quer do "ajustamento", quer do pós -geringonça, tudo se refugia em innuendos, sugestões, quando não omissões e mesmo mentiras. Parece que a principal obsessão é parecerem puros e inocentes, como se fosse um crime discordar do curso do partido que o levou à actual situação, a começar pelo abandono da referência social-democrática genética, o namoro com o neoliberalismo e a direita, o crescente caciquismo interior e o seu correlativo carreirismo. Ou nada disto aconteceu? Vá, convençam-me de que nada disto aconteceu.

Será que o PSD ainda é um partido com o tamanho do passado?
Será que não merece reflexão como um partido como o PSD foi deixado de herança a esta campanha eleitoral com cerca de 10% dos militantes a pagarem as quotas, pelos vistos sem qualquer alarme prévio? Será que se cumprem com rigor as normas que impedem os pagamentos colectivos de quotas, herança aliás de Rui Rio com a oposição de todo o aparelho, para impedir o caciquismo e a corrupção do voto? Será que o PSD tem mesmo os militantes que diz que tem, ou a sangria dos últimos anos tornou -o um partido muito mais pequeno do que os falaciosos números oficiais? Será que um elemento importante não seria conhecer, nos últimos 20 anos, o movimento real de entradas e saídas de militantes? Que partido vai decidir nestas eleições internas, a meia dúzia de militantes que fazem parte das estruturas, dos lugares a que o partido ainda tem acesso, seja de deputados, seja de autarcas, seja nas estruturas do Estado, ou os militantes que se tem afastado e quando muito mantêm o vínculo do voto? Na verdade, sempre se podia aprender com o PS no confronto Seguro-Costa e se não querem que o exemplo seja o do PS com os partidos europeus, em França, por exemplo, que tem aberto as votações internas aos simpatizantes não filiados, logo menos atreitos a terem o seu voto, com um grande sucesso de participação. Num confronto eleitoral que foi esticado até aos limites do tempo para favorecer Santana Lopes, não seria possível introduzir uma alteração estatutária com um sistema aberto de votações a simpatizantes inscritos, para alargar os cadernos eleitorais de modo a minimizar o controlo aparelhístico? Poder, podia-se, mas pelos vistos ninguém o quer.

Falar para dentro e falar para fora
Um bom exemplo das enormes contradições em que ambas as candidaturas caem é afirmarem ao mesmo tempo que a campanha é para os militantes e é para dentro, e depois dizerem que o objectivo é encontrarem o melhor candidato a primeiro -ministro. Ora que eu saiba não é falando para dentro, para os poucos militantes que ainda são activos, que se percebe qual é o melhor candidato para ganhar eleições e governar o País. É exactamente ao contrário. As melhores campanhas internas, como a paradigmática entre Barroso e Nogueira, foram aquelas que mobilizaram a opinião pública exterior ao PSD. É o efeito da mobilização de fora, o reconhecimento em vários sectores da sociedade de que um candidato é mais capaz do que o outro, que funciona depois por osmose para dentro, mobilizando os militantes. Num partido político tudo que é só para dentro de um modo geral é mau. Convém lembrar o congresso albanês que escolheu Santana Lopes antes das eleições legislativas de 2005, para depois este ter dado ao PS a sua primeira maioria absoluta.


Sem discutirem o papel do partido no "ajustamento" não vão a lado nenhum
Refugiam-se os dois candidatos numa diferença entre o Passos Coelho antes das eleições de 2016, altamente louvável, e depois na oposição, altamente critícável, o que é uma dicotomia falaciosa. Justiça lhe seja feita, o Passos Coelho do pior das ideias do "ajustamento" é exactamente o mesmo do Diabo que devia aparecer há uns meses e não apareceu. Do ponto de vista político, Passos nunca abandonou os parâmetros da política de austeridade, nunca defendeu (a não ser nalgumas proclamações eleitorais em 2015), uma política de recuperação de rendimentos, nunca abandonou a ideia de que era preciso ir mais longe nos cortes na segurança social e nas pensões, e exprimiu sempre uma dúvida coerente, embora muitas vezes contra os factos, de que seria possível uma política alternativa à do PSD mais a troika. Não há ruptura nenhuma se tudo isto ficar na ambiguidade.

IN "SÁBADO"
26/11/17

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