01/11/2017

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HOJE  NO 
"RECORD"
Carla Oliveira: 
«Passei a ver o que há de bom no mau» 

Atleta de boccia padece de distrofia muscular das cinturas, mas nunca virou a cara à luta

Quando, em plena adolescência, lhe foi diagnosticada uma distrofia muscular das cinturas (doença que lhe retirou toda a mobilidade nos membros inferiores), Carla Oliveira poderia ter-se ‘rendido’.
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CORAJOSA E LINDA

Mas não lhe estava no sangue voltar a cara à luta. O problema, detetado aos 10 anos, começou a fazer-se sentir aos 8, quando passou a ter problemas de equilíbrio e as quedas se tornaram frequentes. Inicialmente, os médicos pensavam tratar-se de algo associado à fase de crescimento, mas não era bem assim. De forma gradual a doença fez-se notar e, aos 15, acabou por tornar-se mais evidente.

Carla assume ter passado por uma "fase complicada", especialmente por ter sido enfrentada durante a adolescência, mas com a ajuda da sua mãe conseguiu dar a volta por cima.

"Ela viu muito potencial onde ninguém conseguia ver, sempre me valorizou pelas coisas boas que tinha e conseguiu ver além do momento. Lembro-me que me levava a jantares de turma, quase me obrigava a ir, de surpresa… Fez-me ver o que de bom existia no mau", recorda-nos a atleta de boccia do FC Porto, de 28 anos, que começou na modalidade… aos ‘soluços’.
Tudo se iniciou aos 14, quando aquela "criança supernormal, que corria, saltava e brincava" foi abordada pelos dragões para assistir a uma demonstração de boccia. O primeiro impacto não levava a crer que, por estes dias, o boccia seja o principal foco desta atleta. "Não gostei da modalidade, pois achava-a muito calma, muito pacífica." O boccia ficou por aí, mas apenas em ‘stand by’.

Seis anos volvidos, depois de já se ter formado em Educação Social – já tem um mestrado em Ciências da Educação –, surgiu novo convite dos dragões. Desta feita, como o coração também fala mais alto, decidiu aceitar, mas "sem grandes expectativas". "À medida que ia entrando em competição é que fui percebendo quanto o boccia me podia dar e quanto eu estava envolvida na modalidade", admite Carla Oliveira, que, no domingo, ajudou Portugal a conquistar o ouro na prova de pares BC4 nos Europeus.

Atualmente, para lá de ser atleta do FC Porto, a atleta natural de Lourosa é igualmente responsável da área social da secção de desporto adaptado dos dragões, tendo como missão "dar resposta às necessidades dos atletas", mas também "fazer uma intervenção mais comunitária e trabalhar as questões da deficiência e da inclusão".

Problemas e os ‘probleminhas’
Com a necessidade de se adaptar a uma nova realidade, Carla Oliveira admite que muito mudou na sua vida, a começar pela forma como começou a ver tudo em perspetiva. "O que era um problema antes de ter passado por tudo isto, agora passa a ser insignificante, porque lidamos com tantos problemas grandes, que depois simplificamos e desvalorizamos tudo o que são os outros ‘probleminhas’", admitiu. 

«É bom porque estás entretida...»
A frase que dá título a este artigo faz Carla ficar de cabelos em pé, pois é desta forma que a abordam quando diz que pratica boccia. "Quando me dizem isso percebo que não há valorização nenhuma do trabalho, porque independentemente de estar ocupada com o boccia, eu sacrifico-me em função do que é o desporto. Quando digo eu, falo também por todos os meus colegas, porque treinamos mesmo muito! É um trabalho que nos sai do corpo, para o qual temos de fazer esforços. Esforços como qualquer atleta olímpico, como qualquer outro atleta independentemente da modalidade, um atleta que leva as coisas a sério! E essa valorização não existe por parte da sociedade de uma forma geral", admite.

Por isso, defende que, para lá das barreiras arquitetónicas, um dos grandes problemas que as pessoas com deficiência enfrentam "passa muito pelas barreiras atitudinais", já que "as pessoas não têm noção da forma como falam e que isso pode ser até ofensivo".

E como pode essa abordagem alterar-se? Carla Oliveira admite que tudo muda com um contacto mais habitual com a realidade. Aí tudo passa a ser visto de uma forma mais natural: "Quem lida com pessoas com deficiência, consegue ver muito para além daquilo que é a deficiência. Veem a verdadeira pessoa e a sua essência."

* Sabemos o que é ser atingido por uma doença quase desconhecida e traiçoeira, a vida fica muito complicada, por isso temos grande admiração por quem no desporto supera a adversidade.

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