Resistir
Resistir não é suportar; não é o não redondo de uma oposição sem conteúdo, nem a tristeza vazia e fatalista.
Resistir é uma prova de vida, de ação efetiva por uma transformação do presente.
Há
gente que luta e morre na Venezuela. No dia 16 deste mês, 7,5 milhões
de pessoas responderam ao apelo da Oposição democrática ao regime (mesa
de Unidade Democrática) e numa votação fora do quadro legal instituído,
desceram às ruas, enfrentando milícias populares violentas, dizendo não à
convocatória para o dia 30 de uma Assembleia Constituinte que visa
alterar a Constituição e reforçar o poder do ditador vigente. A Oposição
convocou uma greve geral para anteontem e ontem, numa tentativa de
"ofensiva final". Mas o ditador insano não cede; antes assegura que a
par da Guarda Nacional vai colocar mais 230 soldados na rua.
Resiste-se na Venezuela, o país de maiores
reservas petrolíferas do Mundo, que já foi a mais próspera economia da
América Latina, agora transformado num caos económico e político, onde a
fome, a inflação na ordem dos 800%, falta de salubridade e a violência
alastram. Mas resiste-se. A consciência do valor da liberdade e
democracia como condições de paz e bem-estar económico e social não são
uma abstração teórica, mas uma ferida em carne viva.
Em
9 de julho, desaguou, em Istambul, a Marcha da Justiça. Durou 25 dias,
durante os quais foram percorridos 425 Km. Quando a marcha se iniciou em
Ancara, eram apenas algumas dezenas de pessoas; depois eram mil, depois
milhares, e, no fim, um milhão. Sob sol intenso da praça de Maltepe,
Kemal Kiliçdaroglu, líder da Oposição secularista, marchou sozinho,
ladeado por um cordão humano, assumindo como único pregão: adalet
(justiça). Durante o último ano, depois da simulada tentativa de um
golpe falhado, 50 mil pessoas foram presas, 5 mil permanecem detidas
(ente elas, a diretora da Amnistia Internacional na Turquia), 150 mil
(entre jornalistas, professores, militares...) foram suspensos ou
despedidos, o Estado confiscou bens pessoais no valor de milhões de
euros e assumiu o controlo quase total da Comunicação Social.
Resiste-se
na Turquia, na China, nos barcos da morte, no Sudão, nas paredes
apertadas da xenofobia, na brutalidade da ignorância e da banalidade do
mal, na solidão da dor cá dentro ou lá fora. E em cada gesto de
resistência há o preservar de uma esperança e o terrível silêncio de
quem não quer ver ou ouvir.
PRESIDENTE DO POLITÉCNICO DO PORTO
IN "JORNAL DE NOTÍCIAS"
28/07/17
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