10/01/2017

PAULA FERREIRA

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O homem que lutou até ao fim

Os acontecimentos de ontem nas ruas de Lisboa e no Mosteiro dos Jerónimos espelham tudo daquilo que foi Mário Soares. O povo quis estar presente na última homenagem ao homem que marcou o século XX português. Ofereceram-lhe flores e, no silêncio exigido pela cerimónia fúnebre, irromperam as velhas palavras de ordem que fazem parte das nossas vidas. "Soares é fixe!" Haverá homenagem mais bonita?

Sim, Soares é fixe. Só um homem assim podia juntar, na hora da despedida, um desfile tão heterogéneo e democrático nos Jerónimos. Os portugueses foram verdadeiramente iguais no último adeus a Mário Soares. Notáveis e anónimos lado a lado: por momentos, esquecemos que Pedro Passos Coelho, na fila da homenagem, foi primeiro-ministro. E tantos outros ilustres que por ali passaram, e a todos João e Isabel Soares, com uma enorme dignidade, abraçaram e beijaram.
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Soares foi estadista, estratega, ideólogo, um grande político. Todos reconhecem esse legado. O que mais importante fica do último adeus é o homem. O que lutou até ao fim por ideais democráticos, embora alguns, usando tática do apoucamento para as vozes incómodas, dissessem que tinha perdido o filtro. Soares apenas foi coerente consigo próprio, até ao fim. Sempre abominou o politicamente correto e, também nesse capítulo, foi fiel até ao fim.
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Fica também a enorme homenagem a um homem comum, tão forte e, ao mesmo tempo, com as fragilidades de tantos outros: a sua vontade de viver ressentiu-se quando Maria Jesus Barroso, a companheira de uma vida, partiu. Lá estava, aos pés da urna, uma enorme coroas de botões de rosa amarelos, a flor preferida de Maria Barroso, com "o amor dos filhos e dos netos".
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Com a morte de Mário Soares, desaparece um dos últimos senadores da política europeia. Ele parte sem que o futuro da Europa, este grupo de países nascido para ser solidário, seja claramente definido.
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Como Francisco, o Papa que o agnóstico Soares admirava, ontem disse, "é muito urgente atualizar a ideia da Europa para dar à luz um novo humanismo, baseado na capacidade de integrar, dialogar e gerar". O nosso antigo presidente da República concordaria. Soares cumpriu o seu papel neste caminho de uma União Europeia fraterna, inclusiva, das pessoas, apesar de nem todos o terem reconhecido, tanto aqui como lá fora. A história, porém, cumprirá o seu papel.

IN "JORNAL DE NOTÍCIAS"
10/01/17

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