11/12/2016

CRISTINA CASALINHO

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"Será que os androides 
sonham com ovelhas elétricas?"

Um dos temas económicos mais polémicos dos últimos anos é o abrandamento do crescimento económico. Existem vários campos: uns situam a desaceleração económica na estagnação secular, caracterizada por insuficiência de procura, designadamente de investimento.

Por essa razão, defendem o incremento do investimento público, designadamente em infraestruturas, educação e saúde. Noutro campo, encontram-se os que explicam o arrefecimento com falhas de oferta, justificando a queda de investimento com menor necessidade de capital associada a inovações e ao menor acréscimo de produtividade gerado por nova onda de alterações tecnológicas.

Será fácil concordar que a introdução do motor de explosão fez mais pela produtividade do que a proliferação do uso da internet. Contudo, o mundo está a mudar e será interessante estudar como os ganhos de produtividade serão aferidos no futuro. Detenhamo-nos nos mais recentes desenvolvimentos tecnológicos. Em termos de inovação, ouve-se crescentemente falar de inteligência artificial, algoritmos ou máquinas com autoaprendizagem, digitalização de serviços financeiros.

Em países como a China ou o Quénia, os serviços financeiros dão interessantes passos em frente. No Quénia, os particulares podem subscrever produtos financeiros através do telemóvel, não carecendo de abertura de conta num banco. A sua conta na operadora de telecomunicações funciona como conta bancária, onde é realizado o serviço de custódia de títulos ou reside o microcrédito. A atribuição de notação financeira a um cliente é baseada na informação disponível enquanto cliente de serviços de telecomunicações e o empréstimo assume a forma de saldo na conta do telemóvel podendo ser repassado para terceiros como forma de pagamento. Na China, a disseminação do crédito ao consumo assenta em fornecedores de serviços eletrónicos. O maior sítio chinês de compras disponibiliza um cartão de crédito virtual que agiliza compras online. O limite do cartão e as taxas associadas dependem da qualidade creditícia do seu detentor, a qual é determinada pela informação derivada da atividade do prospetivo detentor do cartão/cliente nesse sítio. Outros fornecedores de avaliação creditícia de particulares na China são empresas de jogos ou de social media online.

Quase nos antípodas, a capacidade de processar volumes avassaladores de informação ou a existência de algoritmos que aprendem sozinhos está a mudar a face da tradicional banca de investimento. Grande parte das transações financeiras passou a ocorrer em plataformas eletrónicas, sendo ditada por ordens automáticas inseridas no sistema por algoritmos. Deste modo, garante-se eficiência, igualdade de tratamento e transparência na formação de preços, embora se torne o sistema potencialmente mais propenso a movimentos em dominó ou cascata, ampliando períodos de acentuada volatilidade. A indústria de fundos de investimento corteja a possibilidade de, a prazo, a intervenção humana ser reduzida, substituída por redes neuronais de última geração (ou algoritmos com capacidade de autoaprendizagem). Segundo promotores desta tendência, neste universo, qualquer coisa que um humano possa fazer poderá ser mais bem feito por inteligência artificial. Mesmo os acontecimentos mais inesperados podem ser antecipados e absorvidos, gerando estratégias de investimento coerentes com estes eventos não-antecipados.

Outros líderes industriais mundiais estão a olhar para a inteligência artificial, desenvolvendo equipamentos que exploram a aplicabilidade desta tecnologia. Perfilham que tais desenvolvimentos forçarão as empresas a deslocar-se de uma lógica centrada no produto para uma perspetiva dedicada ao ser humano.

No futuro próximo, ao alcance de um dedo apenas, ter-se-á crédito, roupa, alimentos, e investimentos selecionados a pensar num ser humano melhorado. E a ciência económica, como incorporará estes desenvolvimentos na sua análise? Que impacto terão na medida da produtividade? Possivelmente, a avaliação dos ganhos de crescimento económico progredirá de uma lógica estrita de produtividade para uma perspetiva de bem.

IN "JORNAL DE NEGÓCIOS"
08/12/16

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