17/11/2016

MARGARIDA CRUZ PEREIRA

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"Andanças", 
que responsáveis?

Três meses volvidos e continua por se apurar a causa do incêndio que deflagrou no parque de estacionamento do festival Andanças, em Castelo de Vide. Neste estado das coisas, se se chegar à conclusão de que a causa do sinistro, aqui o incêndio, proveio de um determinado veículo, a responsabilidade pelo pagamento de todos os danos irá recair sobre o proprietário do mesmo.

Tendo o proprietário do veículo em causa transferido a sua responsabilidade civil para uma seguradora, através da celebração de um contrato de seguro de responsabilidade civil automóvel obrigatório, será essa seguradora a responsável pelo ressarcimento de todos os danos, até ao montante do capital mínimo de seguro obrigatório.

Inexistindo, porém, contrato de seguro obrigatório, será o Fundo de Garantia Automóvel que assumirá, em primeira linha, a responsabilidade pelo pagamento de todos os prejuízos causados, mas sempre até ao limite do capital mínimo obrigatoriamente seguro e sem prejuízo de, em momento posterior, vir a exercer o seu direito de regresso contra o proprietário do veículo que deu causa ao sinistro.

A questão reveste-se, porém, de maior acuidade se não se conseguir apurar qual a origem do sinistro ou se o Ministério Público concluir pela existência da prática de crime negligente sem que consiga apurar a identificação do autor, o que levará, inevitavelmente, ao arquivamento do processo-crime em curso.

Nestes casos poderá, ainda assim, ser discutida a contribuição de culpa na produção do sinistro por parte da associação promotora do evento e, eventualmente, de algumas entidades públicas, designadamente, da Câmara Municipal de Castelo de Vide, da Proteção Civil Municipal e do próprio Estado, através da entidade responsável pelo licenciamento e fiscalização de eventos desta natureza, a Inspeção-Geral das Atividades Culturais.

Isto porque sempre se poderá apurar que o sinistro em causa só ocorreu, ou que só ocorreu naquela dimensão e naquele lapso temporal, devido ao facto de, porventura, o parque de estacionamento apresentar condições propícias ao alastramento imediato das chamas e/ou não apresentar as condições de segurança mínimas exigidas.

De salientar um aspeto importante, independentemente da(s) responsabilidade(s) que possa(m) vir a ser apurada(s), a verdade é que o montante do(s) capital(ais) seguro(s), com muita probabilidade, não será suficiente para o pagamento de todos os danos decorrentes deste sinistro.

Se as indemnizações excederem a quantia obrigatoriamente segura, o direito dos lesados contra a(s) seguradora(s) reduzir-se-á(ão) proporcionalmente até à concorrência daquela quantia.

O valor excedente será imputado àquele(s) que venha(m) a ser declarado(s) responsável(eis).

Não é de facto usual a verificação de danos desta dimensão decorrentes de um só sinistro. De todo o modo, a complexidade jurídica associada à resolução deste caso concreto poderá ser entendida como um ponto de partida para que se proceda, desde logo, à atualização do sistema de proteção de lesados por acidentes de viação com base no seguro de responsabilidade civil automóvel obrigatório, em moldes a que seja possível dar uma resposta célere e uma resolução efetiva em situações similares a esta.

* ADVOGADA

IN "JORNAL DE NOTÍCIAS"
15/11/16

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