16/11/2016

HELDER LOPES

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Credibilidade ...

Nos mais variados contextos ouve-se dizer com alguma frequência: “já não sei em quem acreditar” ou “já não podemos acreditar em nada”...

Ora, isso dever-nos-ia deixar muito preocupados pois é um claro indicador de uma sociedade doente, de relações pouco transparentes, de falta de confiança nas pessoas e nas instituições, etc. No fundo, trata-se de um atestado generalizado de falta de credibilidade ...

Contudo, tal parece ser encarado com naturalidade, como algo inevitável numa sociedade que funciona em roda livre onde o lema parece ser “salve-se quem puder”.

O problema é que não se afigura ser algo passageiro, antes pelo contrário. É alimentado diariamente através da “imposição e aceitação” de ídolos com pés de barro, ao nível do desporto, da banca, da política, da educação, da ciência, do espetáculo, da economia, da justiça, etc. sendo que, normalmente, mais tarde muitos desses ídolos são apedrejados e retirados do pedestal pelos mesmos que, de forma leviana, irresponsável e apressada lá os colocaram e aplaudiram.

É assim que, com uma frequência assinalável, vemos muitas pessoas ditas responsáveis fazerem (ou dizerem) precisamente o contrário do que antes defendiam. Ou seja, presenciamos autênticos espetáculos de contorcionismo, alguns fruto de incoerências básicas que não vale a pena qualificar e outros decorrentes de não se assumirem mudanças de posição, esquecendo-se que, algumas vezes, mudar de posição é uma manifestação de inteligência e honestidade.

Podemos dizer que basta não ligar, virar a página do jornal, mudar de canal ou de site, mas infelizmente não é assim. Alguns destes contorcionistas bem-falantes e respetivas instituições (muitas ditas independentes) têm influência direta sobre o modo de vida coletivo, condicionando fortemente o nosso dia a dia.

A título de exemplo, uma das principais armas que temos à disposição para combater este estado de coisas é o desenvolvimento do espírito crítico alicerçado na compreensão dos fenómenos, no conhecimento de como se pode atuar sobre eles, na capacidade de levantar hipóteses e de perceber as possíveis implicações das opções que se venham a tomar. Isto permitirá, por um lado, tomar decisões mais adequadas e, por outro, em simultâneo, denunciar e expor as incoerências e malabarismos dos bem-falantes.

A Escola e o Clube, como locais privilegiados do processo educativo, podem e devem assumir-se como instrumentos de mudança. Para isso terão de conseguir “desenlear-se” dos constrangimentos que lhes são impostos e de algum conformismo e desencanto que parece andar de mãos dadas com o “deixar andar” e o “não vale a pena remar contra a maré”.

Por mais condicionalismos que existam é possível modificar o processo pedagógico ao nível da sala de aula ou sessão de treino, que não podem continuar a ser locais onde predomina a transmissão de conhecimentos e a reprodução de estereótipos e soluções pré-formatadas.

O fantasma dos programas e dos exames e a pseudo necessidade de ganhar o jogo no próximo fim de semana, apesar de serem fortes condicionadores dos comportamentos (na Escola e no Clube), não podem continuar a servir de desculpa para não se introduzirem mudanças que ajudem a médio e longo prazo as pessoas, entre muitas outras coisas, a terem princípios e valores, pensarem pela sua cabeça e a não terem receio de assumir as suas opções...

IN "DIÁRIO DE NOTÍCIAS DA MADEIRA"
09/10/16 

Credibilidade... (parte II) 

No seguimento do que defendemos no mês passado nesta coluna, e na linha do que temos vindo a defender há mais de seis anos de ininterrupta colaboração mensal com o Diário, hoje voltamos ao tema da credibilidade como elemento fulcral do sucesso nos mais variados setores e áreas profissionais.

Uma das formas que pensamos ser importante utilizar para nos ajudar a elaborar uma opinião sobre a credibilidade de um indivíduo que seja candidato a integrar uma equipa de trabalho ou a liderá-la (por exemplo, jogador, aluno, treinador, professor, dirigente, político...), para além da habitual “análise curricular” e daquilo em que ele diz acreditar e promete fazer, é a recolha de informações (de forma criteriosa) junto daqueles que trabalham ou tiveram oportunidade de trabalhar com ele.

Temos de ver para além do embrulho, da forma como as pessoas nos são apresentadas ou como se autopromovem. É necessário analisar, por exemplo, a coerência que demonstram ao longo do tempo, como agem quando têm algum poder, a forma como se relacionam com os outros, como atuam em situação de crise ou de insucesso, se têm mais propensão a servir as instituições a que pertencem ou, pelo contrário, pensam essencialmente no seu umbigo e em servir-se, mesmo que para isso tenham de passar por cima de tudo e de todos, inclusive daqueles que, em certas ocasiões, os ajudaram e deram a mão, etc.,etc.

Qualquer bem-falante (com melhor ou pior aspeto, com ou sem empresário e máquina de propaganda de suporte) tem possibilidades de “chegar ao coração das pessoas” prometendo o que elas querem ouvir, sendo que, muitas vezes, as probabilidades de ser escolhido aumentam de forma proporcional ao descaramento e à falta de pudor e de vergonha. É por isso que a credibilidade da pessoa é importante pois pode ser decisiva para que valorizemos ou não o que ela diz e se propõe fazer.

Podemos dizer que as pessoas são inteligentes e que não se deixam enganar com facilidade. Queremos acreditar que sim e que, normalmente, escolhem com sabedoria (por exemplo, nos clubes, nas escolas, nas universidades, nas empresas, nos cargos políticos, etc.).Porém, todos sabemos que, por vezes, demasiadas vezes, isso não acontece.

É preciso ter consciência que as consequências (positivas ou negativas), relativas às pessoas que se escolhem ou deixam de escolher seja para integrar equipas de trabalho ou para as liderar, normalmente prolongam-se no tempo e não se limitam ao prazo do contrato ou mandato. Basta pensarmos o que tem acontecido com alguns clubes desportivos, algumas empresas e instituições públicas e privadas, ou mesmo com alguns governos. Na esmagadora maioria das vezes essas pessoas foram eleitas ou nomeadas pelos que foram eleitos (pelos eleitores em geral, os sócios, os acionistas, os próprios pares, etc.) e, dessa forma, quando mais tarde nos lamentamos pelo fracasso dessas escolhas, temos que questionar se não fomos daqueles que, “embalados na canção do bandido”, não nos informámos devidamente e, por isso, por ação ou omissão, contribuímos para que fossem escolhidos/eleitos.

Mas não é fácil sair das análises superficiais, dos juízos de valor telegráficos e do “diz-se, diz-se”, uma vez que o processo pedagógico que nos formou, e predominantemente nos continua a formar, acaba por nos formatar a olhar mais para a aparência que para o conteúdo.

Contudo, convém não esquecer que se é verdade que, muitas vezes, por exemplo, ao nível do desporto e da nossa vida privada e profissional a “sorte e o azar” também condicionam o sucesso, já no que diz respeito à escolha de pessoas não podemos continuar a dizer que é como os melões: “só se sabe se é bom depois de abrir”.

Num processo de seleção é imperioso analisar as diferentes variáveis em jogo, devendo a credibilidade assumir um papel fundamental, de modo a que mais tarde uns não se lamentem dizendo “se eu soubesse o que sei hoje...” e outros não se limitem a ter o fraco consolo do “eu bem te avisei...”.

* Professor Universitário

IN "DIÁRIO DE NOTÍCIAS DA MADEIRA"
11/11/16

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