06/11/2016

EDUARDO MONTEIRO

.


Espaço Universidade
Recrutamento de jogadores 
- NBA Draft

Nos EUA e no Canadá, o “Draft” é um sistema de recrutamento de jogadores que, tendo em vista a sua contratação pelos clubes, tem por objetivo estabelecer o maior equilíbrio competitivo possível entre as equipas que participam no mesmo quadro competitivo.

A fim de conseguir tal desiderato é desencadeado um processo global de contratação de jogadores em que a prioridade de escolha de cada clube segue na ordem inversa da tabela classificativa da época anterior. Assim, relativamente aos jogadores disponíveis no mercado, o último clube classificado é o primeiro a escolher e assim, sucessivamente, de baixo para cima, sendo o clube campeão da época anterior o último a fazê-lo.

Este sistema é utilizado, com bons resultados, nas Ligas Profissionais fechadas, quer dizer, quando se trata de competições sem subidas nem descidas de divisão. Quando um clube escolhe um jogador, fica com direitos de exclusividade para assinar contrato com esse jogador e mais nenhum clube da mesma liga pode efectuar qualquer tipo de acordo com o referido jogador.

O “Draft” é desencadeado através da candidatura prévia dos jogadores, de acordo com as regras estabelecidas pela respectiva Liga Profissional. Para se poderem candidatar os jogadores devem ser praticantes do respetivo desporto nos liceus, universidades, ou até mesmo estrangeiros e, no caso de serem estudantes, terem tido aproveitamento escolar. No respeito pelas regras nacionais em vigor no sistema educativo, de forma a evitar o abandono escolar prematuro, cabe às Ligas Profissionais definirem a idade mínima dos jogadores candidatos a jogadores profissionais.

Este sistema de recrutamento de jogadores decorre fundamentalmente de as ligas americanas serem um negócio pelo que os seus proprietários procuram evitar a inflação dos contratos dos jogadores bem como todo o tipo de conflito externo à própria competição desportiva que desvalorizam o valor económico da respetiva liga bem como dos clubes que a compõem.
Podemos apontar alguns exemplos, fora dos USA e Canadá, onde o recrutamento de jogadores se processa pelo sistema do Draft:

- A Federação de Futebol da Austrália introduziu, em 1986, na sua principal competição, um sistema de Draft no recrutamento de jogadores para combater a inflação, que se estava a verificar, nas transferências e ordenados dos jogadores, assim como, na diminuição assustadora de público;

- A Associação de Basquetebol das Filipinas também adoptou o sistema de Draft, em 1985, realizado anualmente, mas dirigido exclusivamente aos jogadores nativos, de forma a haver uma distribuição dos novos valores por todos os clubes participantes na principal competição;

- As principais Ligas de Cricket da India e do Paquistão também utilizam sistemas semelhantes ao Draft, tendo em vista um equilíbrio competitivo das equipas e o respeito pelos tectos salariais consagrados na regulamentação;

- A Superliga Russa de Hóquei no Gelo que se tornou na Liga Continental da modalidade, estabeleceu um acordo colectivo celebrado entre a Liga e os jogadores que determinava a realização de um Draft anual para o recrutamento de jogadores, logo no primeiro ano das competições.

As Ligas Profissionais que aplicam regulamentação semelhante são as que, por força das dificuldades sentidas no passado, aquando da criação das suas estruturas organizativas e implementação dos seus campeonatos, enfrentaram problemas económicos e financeiros de sustentabilidade. No desporto profissional não se cativam espectadores, não se conseguem transmissões televisivas, nem se fazem receitas, se os jogos não forem aliciantes, competitivos, sem vencedores antecipados. Trata-se de conseguir uma incógnita permanente acerca do vencedor, de maneira a que o público se mantenha na bancada até aos derradeiros segundos do campeonato, tal qual acontece num filme de “suspense”. É a qualidade do espectáculo que enche de público os recintos desportivos e preenche os programas desportivos televisivos em qualquer lugar do planeta. Nos Estados Unidos, quase todas as Ligas Profissionais de desportos colectivos adoptaram o sistema de Draft no recrutamento de jogadores, diferindo na metodologia processual na medida em que os desportos envolvidos são bastante diferenciados: Basebol, Basquetebol, Futebol Americano, Hóquei no Gelo, Soccer (football association), etc., tendo sempre bem presente que, quanto mais niveladas forem as equipas participantes, haverá jogos mais equilibrados, mais competitivos serão os diferentes campeonatos e por conseguinte mais atraentes serão os espectáculos desportivos. Só com estas premissas asseguradas é que é possível a sustentabilidade financeira das equipas participantes e das Ligas Profissionais responsáveis pela organização dos quadros competitivos.

Neste modelo de organização podem surgir situações especiais de recrutamento:

Admissão de novos Clubes: – É uma situação em que a Liga Profissional resolveu aceitar a candidatura de novos clubes e, por conseguinte, a sua própria expansão, permitindo à nova equipa o recrutamento de 1 ou 2 jogadores de cada um dos outros clubes da liga. Neste caso, os clubes residentes têm o direito de bloquear a saída de um determinado número de jogadores, definido pela liga, para não ficarem prejudicados e manterem a estrutura base da sua equipa de competição;

Exclusão de Clubes: - Acontece quando um clube entrou em falência e, como tal, deixou de ter condições para fazer parte da Liga Profissional. Os jogadores com contrato em vigor devem ser resgatados pelos outros clubes (1 ou 2 por clube residente) de forma a manter os postos de trabalho e, assim, evitar a ocorrência de processos judiciais contra o clube ou a própria Liga, por força dos contratos colectivos de trabalho existentes entre a respectiva Liga e as Associações ou Sindicatos dos Jogadores Profissionais;

Acidentes graves de Clubes: - Quando ocorrem acidentes graves nas deslocações aéreas ou terrestres, havendo incapacidade física permanente ou mesmo morte de jogadores, existe um plano especial de contingência, uma acção conjunta de solidariedade para salvar o clube sinistrado, que permita o recrutamento de jogadores junto dos clubes residentes que, de igual modo, também têm o direito de protecção dos seus principais jogadores.

Fora dos Estados Unidos e Canadá, os clubes profissionais contratam os jovens talentos, através de transferências, nos clubes com menos poder económico. Nos últimos anos, os clubes começaram a criar as suas próprias Academias tendo em vista a formação e aperfeiçoamento dos jogadores mais novos, com o objectivo de, a médio prazo, integrarem a principal equipa do clube evitando, deste modo, o dispêndio de grandes verbas na aquisição de novos valores.

O “Draft” tem expressão máxima na National Basketball Association (NBA) por ser a modalidade desportiva em maior expansão à escala mundial e, igualmente, por ser a única que, também, tem uma liga feminina profissional (WNBA) com prestígio internacional. O Draft da NBA, que foi posto em prática desde o início da liga e que se realiza anualmente na pré-temporada (final de junho) é sempre antecedido, durante um determinado período (60 dias), para a apresentação das candidaturas dos jogadores interessados, de acordo com as normas estabelecidas pela NBA. As principais regras são as seguintes:

- Jogadores universitários que completaram 4 anos de universidade são considerados elegíveis;

- Jogadores universitários que não completaram os estudos universitários necessitam de declarar a sua candidatura e desistir da universidade para poderem ser declarados elegíveis, desde que tenham 19 anos de idade;

- Jogadores oriundos do High School (ensino secundário) já não podem candidatar-se directamente, o que acontecia antes de 2006. Para que a sua candidatura seja aceite terão que esperar um ano após o final do curso liceal;

- Jogadores norte-americanos com contrato profissional fora dos USA podem candidatar-se desde que tenham 19 anos de idade;

- Jogadores internacionais (não nascidos nos Estados Unidos) são considerados elegíveis desde que tenham a idade mínima de 22 anos.

No sentido de evitar que algumas equipas fizessem jogo sujo, perdendo jogos propositadamente para se classificarem na última posição, a fim de serem os primeiros a escolher um determinado talento que iria entrar no Draft seguinte, foi introduzido um sorteio entre as equipas pior classificadas que ao longo dos anos foi evoluindo até se chegar ao actual modelo, em que participam as 14 equipas que não foram apuradas para os playoffs. No actual sorteio, está regulamentado que as equipas mais mal classificadas têm sempre mais probabilidades, em termos percentuais, de serem selecionadas para fazer as três primeiras escolhas, já que a partir daí o que conta é a classificação obtida na época regular. Ao longo dos anos o sistema do sorteio tem decorrido sem problemas, até porque se têm introduzido, pontualmente, as alterações consideradas mais ajustadas. Também acontece, em períodos pré-determinados, a realização de trocas de jogadores entre as equipas e pode surgir, como moeda de troca, a cedência do direito de escolha no Draft por acordo entre os clubes envolvidos.

Nas semanas que antecedem, o Draft as equipas organizam Campos de Observação com os jogadores que lhes interessa recrutar, em função da sua posição de escolha, com o objectivo de os testar nos seus aspectos físicos e técnicos, tendo em vista uma melhor fundamentação das referidas escolhas.

O atleta universitário que pretenda testar as suas capacidades para integrar uma equipa profissional, antes da conclusão do seu curso, poderá fazê-lo e prestar provas nos referidos Campos de Observação. Caso não se considere ainda apto para “dar o salto” poderá desistir, sem qualquer problema, até 30 dias antes do Draft e regressar à sua universidade, desde que não tenha assinado, entretanto, nenhum acordo/contrato com um agente.

No Draft participam os representantes das 30 equipas que escolhem, em duas voltas, os jogadores que irão contratar para as épocas seguintes. São ao todo 60 novos jogadores escolhidos (dois por equipa) que irão ser integrados nos planteis das diferentes formações da NBA. Para estes jovens praticantes de basquetebol é uma espécie de “Sorte Grande”, que lhes saiu na lotaria, que terão de aproveitar com muito trabalho, humildade e perseverança porque esta oportunidade só está ao alcance dos grandes talentos deste desporto e acontece poucas vezes na vida.

O “Draft” é um dos pilares centrais do modelo de negócio das Ligas Profissionais do desporto americano que, enquanto espetáculo de superior qualidade se está a espalhar pelo mundo.

* Eduardo Monteiro é ex-treinador do SL Benfica e das Seleções Nacionais

IN "A BOLA"
30/10/16

.

Sem comentários:

Enviar um comentário