03/09/2016

NUNO FRANCISCO

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E novidades?

A CAUSA e o efeito. São muitas as discussões em torno da interioridade que situam entre o que originou o atual estado da arte a benevolência com que se aceita a lógica do “ajuste”. Esta abordagem é, aliás, a causa primeira do vingar da tese de que nos territórios eufemisticamente chamados “de baixa densidade” tem que se adequar os serviços à população residente. A fórmula que se segue é conhecida: menos gente, logo, a necessidade de menos serviços públicos e, por arrasto, de menos serviços privados. O que se tem passado ao longo das últimas décadas é precisamente a tradução dessa tese nos territórios e que está muito bem documentada nos arquivos dos jornais. Escolas fechadas, freguesias extintas e agregadas, extensões de saúde encerradas, postos de correio de portas definitivamente fechadas, etc, etc. É isto que se vê e é isto que é explicado como a derradeira inevitabilidade: “Se não há pessoas, para que é que precisam de serviços?” Supostamente esta seria a inabalável justificação que nos levaria a encolher os ombros e seguir o trilho da resignação. Porque, de facto, somos cada vez menos e, bem vistas as coisas, para que é que precisamos de serviços para tão poucos? É; a racionalidade é espantosa e não deveria dar motivo a contestações. 

Mas o problema será, provavelmente, outro. Tentemos ver nesta triste constatação do despovoamento do Interior – o encerramento de serviços – não como um efeito, mas como uma das causas do perpetuar deste ciclo de agonia. Quem, no seu perfeito juízo – e agora que todos os municípios lutam declaradamente pela captação de investimento para os seus territórios – não levará em conta, na hora da ponderação, que estes são territórios onde as estruturas básicas foram sucessivamente sonegadas? A questão de encerramento de serviços e do não investimento justificado pela demografia não é um sinal de desistência de um território? A métrica que leva ao encerramento de escolas e de outros equipamentos, não é só a matemática do ajuste à suposta realidade. É, também, a equação que compromete o futuro. A ausência do Estado – e é bom que isto se entenda para além das fronteiras da Beira Interior – é um sinal de conformismo e de total ausência de esperança na alteração do status quo. Fechar uma escola é a constatação de que não há alunos. Mas é mais do que isso: colocar-se o cadeado na porta é também selar o sequestro da esperança e enviar um sinal de repulsa para o exterior. É esta métrica linear e simplista de “poupança” de recursos que também alimenta o ciclo de abandono, porque, sejamos claros, é bem mais fácil (e sobretudo barato) encerrar serviços. Mesmo que fique a vã promessa de um dia, se tal se justificar, tudo voltar a abrir portas em resplandecente e miraculoso esplendor. A questão dos médicos que o Jornal do Fundão tem vindo a acompanhar ao longo das últimas edições é apenas um dos derivados desta lógica sobre a interioridade. Se os tradicionais concursos não permitem fixar médicos no Interior, porque em (des)igualdade de circunstâncias preferem o Litoral, então que se reverta esta lógica da simplicidade, criando mecanismos legislativos para garantir a fixação nestes territórios. E não, isto não seria a tradução da famosa “discriminação positiva. Seria tão-só um frémito de justiça.

IN "JORNAL DO FUNDÃO"
31/08/16

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