23/09/2016

ANTÓNIO MOITA

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A tentação de Cristas

Assunção Cristas quer ser uma voz diferente neste espaço político pouco esperançoso, que anda à procura de qualquer coisa diferente embora não saiba bem o quê.

Ao entrar na corrida à Câmara Municipal de Lisboa, Assunção Cristas assume de uma só vez que se quer afirmar por si própria dentro e fora do seu Partido, que a coligação Portugal à Frente acabou definitivamente e que as próximas eleições autárquicas servirão para confirmar as lideranças partidárias quer do CDS/PP quer do PPD/PSD.

Passada que está a fase em que os partidos do centro e da direita davam como certa a queda a breve prazo da “geringonça”, entrámos num tempo em que a liderança do CDS percebeu que tem de se afirmar num espaço político muito marcado pelos quatro anos de governação da ‘troika’.

Passos Coelho continua igual a si próprio e terá sempre do seu lado aqueles que acreditam que o atual Governo não alcançará nenhum dos objetivos de crescimento económico a que se propôs e que no final estaremos de novo condenados a pedir auxílio externo. É a teoria do quanto pior melhor em que a frase da próxima campanha eleitoral será qualquer coisa como “eu bem vos avisei …”. Até lá nada de novo. Nem consensos pedidos pelo Presidente da República nem propostas alternativas. A receita é esperar para ver.

Assunção Cristas quer ser uma voz diferente neste espaço político pouco esperançoso, que anda à procura de qualquer coisa diferente embora não saiba bem o quê. A afirmação da sua liderança, muito marcada ainda pela influência de um Paulo Portas sempre presente, ainda que de forma indireta, passa por garantir internamente que o seu caminho não será minado e por conseguir legitimar o seu papel através do voto popular. Nada melhor do que anunciar uma candidatura à Câmara da principal cidade do país sabendo que desta forma não terá lutas internas no próximo ano e que a fasquia do bom resultado andará à volta dos 7% (resultado sofrível obtido por Portas em 2001 que não impediu a vitória de Santana Lopes).

No atual deserto de ideias e de novas caras que caracteriza a política portuguesa, Cristas poderá trazer uma lufada de ar fresco se for capaz de moderar a necessidade de afirmação que demonstra (não há revista cor-de-rosa em que não apareça ora com chapéu de palha ora com fruta estampada no vestido), se definir com precisão as mensagens que quer passar (falar de tudo ao mesmo tempo com uma velocidade supersónica tem como efeito que ninguém percebe ou retém a sua mensagem) e se concentrar na agenda que verdadeiramente interessa à classe média portuguesa, em especial a da sua faixa etária, pode ser que consiga afirmar a sua posição.

Portas garantiu votos junto de setores mais tradicionais da sociedade portuguesa e montou o seu bastião junto dos reformados e pensionistas e na defesa da lavoura. Se nesta última Cristas também pontuou, a verdade é que enquanto os reformados se lembrarem dos quatro anos de governo de coligação dificilmente aceitarão voltar a confiar no CDS.

O CDS terá assim de procurar afirmar-se noutros setores mais dinâmicos da sociedade portuguesa como sejam os pequenos e médios empresários ou os empreendedores e dirigir o seu discurso para todos aqueles que, não precisando do Estado para viver ou trabalhar, sabem que é fundamental garantir a existência de serviços públicos de qualidade em setores tão importantes como os da educação, da saúde, da segurança social e da ordem pública.

A tentação de Cristas é um sinal de inconformismo e de vontade em afirmar um novo discurso. Se tiver êxito, conseguirá afirmar o novo CDS como uma força indispensável à construção de um novo espaço do centro e da direita em Portugal. Se falhar, irá naturalmente deixar a liderança em Outubro do próximo ano e abrirá um longo e difícil período em que o CDS continuará a tentar encontrar uma identidade e lutar uma vez mais para assegurar a sua sobrevivência.

* Jurista

IN "DIÁRIO ECONÓMICO"
14/09/16

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