22/07/2016

ANA RITA GUERRA

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Pokémon Go é mais 
que uma brincadeira

Suspira-se pelos jogos de rua de antigamente, como a sirumba e o mata, como se o Pokémon Go fosse uma regressão.

No meio da loucura instalada com o Pokémon Go, que chegou a Portugal no final da semana passada, muitas pessoas manifestaram a sua perplexidade com o sucesso do jogo. 

Há quem goze com a amálgama de gente que se tem juntado ao pé de “ginásios” e PokéStops um pouco por todo o lado. Há quem questione porque é que adultos andam de cara no smartphone, à procura das pequenas criaturas que foram criadas nos anos noventa e eram coisa reservada à miudagem. O papel afixado algures no Canadá por alguém que diz aos jogadores para irem fazer qualquer coisa da vida tornou-se viral. Suspira-se pelos jogos de rua de antigamente, como a sirumba e o mata, como se o Pokémon Go fosse uma regressão.

Mas eis porque não é: este jogo para smartphones é muito mais que um jogo para smartphones. A componente de realidade aumentada é a verdadeira chave para o impacto que já está a ter no mercado – a capacidade de sobrepor elementos digitais no mundo real. Vemos os Pokémon a surgirem no meio de um jardim que existe, é palpável, através do ecrã do telemóvel. Somos levados a andar quilómetros até uma PokéStop para ir buscar mais bolas de ataque aos monstrinhos ou outros “bens”, como poções e ovos, porque o telemóvel tem GPS. 

 É certo que nada disto é novo. Em 2007, a YDreams já implementava projetos de realidade aumentada dentro e fora de Portugal. E nem é particularmente fascinante, pelo menos quando comparado com óculos de realidade virtual ou com os óculos de 3000 dólares que a Microsoft está a desenvolver para realidade aumentada “a sério”, os HoloLens. 

No entanto, nunca houve uma experiência tão coletiva, popular e barata como esta. O jogo é quase secundário. A experiência é que conta: ter de andar de um lado para o outro, socializar com outros jogadores, pertencer a uma equipa e desenvolver estratégias para vencer as batalhas. Melhor, ficar com o gostinho de uma forma de interagir que se vai espalhar como fogo.

Há qualquer coisa no sucesso que cria anti-corpos nas pessoas – se toda a gente vê Guerra dos Tronos, vou ser aquele que nunca tocou num episódio. Se agora há dezenas de milhões de jogadores de Pokémon Go a tentarem “apanhá-los a todos”, vou lamentar ao que isto chegou e fazer umas piadas com esses tontos. Mas se formos ver a casa de muitos críticos, se calhar há lá uma consola por baixo da televisão. Ou o Candy Crush instalado no telemóvel. Não se fala tanto de gamificação na educação e nas estratégias empresariais? Alguns jogos são melhores que outros; este é simplesmente diferente. Pensemos no Pokémon Go em versão visita de estudo para descobrir poetas portugueses ou estilos de arquitetura. Pensemos além deste jogo específico.

É que realidade aumentada é a forma como vamos interagir com aplicações e outros gadgets no futuro – e próximo. Não é à toa que se fala do mundo pós-apps e pós-smartphones, mas ninguém sabe bem como isso se vai processar. Será pela invasão de wearables? Será com hologramas? Ambos? O certo é que estamos cada vez mais próximos de viver numa realidade em que o físico e o digital se misturam. E o Pokémon Go é um vislumbre disso. 

IN "DINHEIRO VIVO"
19/07/16


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