Adivinhem quem lixou a Caixa
Com Armando Vara, a Caixa transformou-se num imenso caldeirão onde os mais variados interesses se foram servir.
José Sócrates foi eleito primeiro-ministro em Março de 2005. Três
meses e meio depois (Agosto de 2005) correu com o anterior presidente da
Caixa Geral Depósitos, que não chegou a aquecer o lugar (Vítor Martins,
10 meses no cargo), e nomeou Armando Vara administrador, com a
responsabilidade de gerir as participações financeiras da CGD em várias
empresas estratégicas. Sete meses depois, a comunicação social anunciava
que os seus poderes haviam sido “reforçados”. Cito o PÚBLICO de 9 de
Março de 2006: “Armando Vara assumiu agora as direcções de particulares e
de negócios das regiões de Lisboa e do Sul, assim como a direcção de
empresas da zona Sul. Entre as suas competências estão ainda a
coordenação das participações financeiras do banco público, EDP (4,78%),
PT (4,58%), PT Multimédia (1,27%), BCP (2,11%) e Cimpor (1,55%).”
Vara
permaneceu três anos como administrador da Caixa Geral de Depósitos,
até sair em 2008 para a vice-presidência do Millenium BCP, com o dobro
do salário, o sucesso que se conhece e um pedido de licença sem
vencimento para poder continuar nos quadros da Caixa. Ainda em
representação da CGD, Vara foi administrador não-executivo da PT,
desempenhando um papel decisivo na oposição à OPA da Sonae em 2006,
devido aos poderes mágicos da golden share. Justiça lhe seja
feita: não se pode dizer que a CGD tenha sido um tacho para Armando
Vara. Foi muito pior do que isso: a Caixa transformou-se num imenso
caldeirão onde os mais variados interesses se foram servir, cabendo a
Vara decidir quem enchia a gamela. (Ouvido no âmbito da Operação Marquês
a propósito do empreendimento de Vale do Lobo, Armando Vara recusou tal
ideia, tendo declarado que estas decisões nunca eram aprovadas por uma
só pessoa, mas por um colectivo da CGD.)
E que gamelas encheu a Caixa nos últimos anos? O Correio da Manhã
teve acesso a uma auditoria recente e revelou a lista dos maiores
credores do banco. A lista está ordenada por exposição ao risco de
crédito, mas eu prefiro ordená-la pelas imparidades já registadas – e aí
o cenário é simultaneamente desolador e esclarecedor. No topo da lista
está o grupo Artlant, que tencionava construir em Sines um daqueles
megaprojectos PIN pelos quais o engenheiro Sócrates se pelava: uma
“unidade industrial de escala mundial” para a produção de 700.000
toneladas/ano de um componente do poliéster, que levaria à “consolidação
do cluster petroquímico da região de Sines”, segundo um
comunicado do Conselho de Ministros de Junho de 2007. José Sócrates
chegou a lançar a primeira pedra em Março de 2008 e agora cabe-nos a nós
apanhar os calhaus: 476 milhões de dívida, 214 milhões em imparidades.
Em
segundo lugar (imparidades: 181 milhões; exposição: 271 milhões) estão
as Auto-estradas Douro Litoral. São 79 quilómetros adjudicados em
Dezembro de 2007 e cada milímetro de alcatrão deve hoje três euros e
meio à CGD – ou seja, a mim e a si, caro leitor. Em terceiro vem o
famoso empreendimento de Vale do Lobo, o tal com o qual o Ministério
Público está a tentar agarrar José Sócrates, e que tem uma astronómica
dívida de 283 milhões (imparidades: 138 milhões). Segue-se um grupo
imobiliário espanhol que não conheço (Reyal Urbis), mas que fiquei com
muita vontade de conhecer, e dois nossos velhos conhecidos: o grupo
Espírito Santo e o grupo Lena, todos com dívidas acima dos 200 milhões.
Digam-me: com uma lista destas, alguém se espanta por a Caixa estar a
precisar de quatro mil milhões? Eu não.
IN "PÚBLICO"
16/06/16
.
Sem comentários:
Enviar um comentário