25/03/2016

ANDRÉ MACEDO

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Não somos todos iguais

Os últimos dias foram preenchidos com os elogios à visita de Barack Obama a Cuba e aos modos suaves do presidente americano, decisivos para que o degelo com meio século abra uma nova oportunidade nas relações entre os dois países. Apesar de a prisão de Guantánamo não ter sido ainda encerrada, o caminho também começou a ser feito, reforçando esta ideia de grande moderação estratégica da Casa Branca nas relações externas.
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No Iraque e no Afeganistão, embora em ritmos diferentes, aconteceu o mesmo. Obama adotou a mesma suavidade, lançando as bases para o diálogo e a retirada militar onde antes reinava apenas confronto e belicismo. O acordo da América com o Irão, permitindo o regresso de Teerão ao comércio internacional de petróleo e a alguma normalidade nas relações diplomáticas, é outro dos exemplos mais recentes desta viragem da Casa Branca, que tem na Síria e no caos que a envolve mais um sinal da vontade do atual poder de Washington de deixar de ser o promotor único da paz mundial, reduzindo a sua esfera de influência.
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Os EUA, com Barack Obama, deixaram de ser o polícia irrefletido que se impunha no centro de grande parte dos principais conflitos planetários e, depois, pagava a fatura. A América não saiu de cena, mas já não quer assumir a liderança da mesma forma explícita, como aliás ficou claro a seguir aos atentados de novembro em Paris. Na altura, o presidente americano sublinhou que o terrorismo islâmico era uma ameaça, mas que teria de ser combatido de outra maneira, com mais diálogo, com mais paciência e com espaço para que os europeus, vizinhos do caos, dessem um passo em frente. Isto Obama não disse, não assim, não com estas palavras, mas estava no subtexto.
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O que os atentados de ontem em Bruxelas, capital política europeia - que não restem dúvidas nenhumas disto -, vieram confirmar foi que este recuo dos EUA, concretizado ao longo dos últimos oito anos, deixou um vazio explosivo que expôs a fragilidade da União Europeia e as suas enormes e talvez insanáveis contradições.
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A guerra na Síria confrontou e confronta os europeus com a chegada de milhões de refugiados - um problema que não se resolve com um cheque endossado à Turquia - e tornou ainda mais evidente a indisponibilidade das comunidades imigrantes islâmicas para respeitarem os princípios e os valores dos povos que as acolheram. O que acontece em Molenbeek, o que se passa em Paris e em várias cidades francesas e noutras pela Europa fora traduz esta intolerância militante e abrasiva que, de recuo em recuo, cedência em cedência politicamente correta - a permissão do uso de hijab sem limites, a eleição de fundamentalistas para cargos públicos, o financiamento das mesquitas por países que sustentam o terrorismo -, permitiu que o islamismo radical explorasse a desigualdade em seu benefício.
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O proselitismo islâmico agressivo, ancorado em versões primárias e primitivas da religião, alimentou descaradamente esta espécie de niilismo geracional que nos trouxe até aqui. E onde estamos hoje?

Estamos em guerra, embora muitos não queiram acreditar e insistam nas virtudes mágicas da tolerância universal. A paz e a grande moderação americana de Obama são, em si, saudáveis, são desejáveis, são para onde devemos caminhar. Mas não resolvem sozinhas o problema. A desintegração de Schengen, o regresso das fronteiras por razões de sobrevivência - não apenas de segurança - é a prova de uma derrota cultural e política que, a não ser emendada, rasgará a Europa.

Estamos em guerra, disse ontem François Hollande - e disse bem. O medo está entre nós. Viajar significa arriscar - porque os atentados já entraram na rotina. Tiramos os sapatos no aeroporto, fiscalizamos o passageiro do lado, olhamos por cima do ombro, habituamo-nos ao terror. Comecemos então pelo óbvio: não somos todos iguais. Ao reconhecer essa diferença - evitando a islamofobia - fica mais claro quem somos, o que temos de fazer, quem e o que devemos combater.

IN "DIÁRIO DE NOTÍCIAS"
23/03/16

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