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Cabeça de cartaz
Sim, o
grande tema destas legislativas são os cartazes. É compreensível;
discutir se são bonitos ou feios, se modelos são portugueses ou
estrangeiros, se os partidos pagaram pelas imagens e se as pessoas que
neles figuram têm alguma coisa a ver com as mensagens, é muito mais giro
e dá bué menos trabalho que ler programas, compará-los com os
anteriores e como estes foram (in)cumpridos, ver se têm contas (não é
suposto as contas serem o mais importante?) e se estas batem certo, etc.
O interesse pelo que está antes, durante e depois dos cartazes é
aliás tão raro que foi possível ao diretor da campanha do PS Ascenso
Simões acabar demitido por causa de outdoors sem que alguém parecesse
reparar que defende publicamente ideias que contradizem não só o
património histórico como o programa atual do partido do qual é (ainda)
cabeça de lista em Vila Real. E, no entanto, fez disso alarde num artigo
no Sol, em Junho, intitulado "Pelo fim dos contratos de trabalho." Onde
se lê que Mário Centeno, principal autor do cenário macroeconómico do
PS, é "ainda muito recuado". E que "as leis do trabalho só são motivo de
conversa entre associações de patrões, sindicatos funcionalizados,
especialistas marxistas do Direito do trabalho e amanuenses da
concertação social." Porque "o contrato de trabalho cristaliza a
dicotomia tradicional da luta de classes. Mas, se olharmos para a vida
de hoje, essa luta de classes é cada vez mais um passado distante."
Sem dúvida. Nem se passou 2014 a debater O Capital no Século XXI, obra
na qual o francês Thomas Piketty defende rumar-se uma situação de
desigualdade social comparável è espelhada nas obras de Hugo e Dickens,
com imensa riqueza nas mãos de meia dúzia e restante socieadade na
miséria. Nem estamos a observar, em Portugal (e não só), com a pressão
de um brutal desemprego, tal diminuição salarial que o PS propõe
atribuir um subsídio aos trabalhadores que auferem menos de 411 euros.
Não, a situação está de tal modo equilibrada que Ascenso quer "que se
avance para a consagração do contrato livre, com regras de protecção
bilateral da relação entre as partes."
Entendamo-nos: Ascenso,
grande apologista da "ordem natural das coisas", na qual inclui a
emigração ("A minha filha adolescente sabe que o mundo dela é o mundo em
que se transita de acordo com interesses dos promotores"), tem direito a
pensar e dizer o que entender (e a formar um Tea Party luso em
consonância). Mas vê-lo, mês e meio após o citado artigo, declarar ao
Observador que "a maioria fala muito em bancarrota mas a atual é pior
porque é uma bancarrota social, com o desemprego, a emigração, a
incapacidade de fixar os jovens no nosso país" deixa qualquer um
confuso. Afinal, que pensa Ascenso? A cara dele dá com que frases? Ou
será que, como aos trabalhadores da Junta de Arroios retratados nos
malfadados cartazes, não houve ninguém no PS para lhe explicar o básico,
ou seja, que não é só posar para a foto?
IN "DIÁRIO DE NOTÍCIAS"
21/08/15
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