07/06/2015

BAPTISTA BASTOS

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O embuste como norma
nestes tempos sombrios

Começámos a habituar-nos à mentira como suporte do poder. E o pior é que há, espalhados pelos jornais e pelas televisões, nefelibatas ao serviço de quem manda, que não desmontam o edifício de embustes com que este Governo nos encharca.

Com a irrevogável leviandade que constitui a marca d'água do seu excitado carácter, Paulo Portas afirmou, na terça-feira, que "há aves agoirentas que gostam de ver Portugal puxado para baixo". Não é só insólita, a afirmação é embusteira, o que não surpreende, dado o seu autor. Começámos a habituar-nos à mentira como suporte do poder. E o pior é que há, espalhados pelos jornais e pelas televisões, nefelibatas ao serviço de quem manda, que não desconstroem e desmontam o edifício de embustes e de dados viciados com que este Governo nos encharca.

Os comentadores são sempre os mesmos e minuciosamente escolhidos. A credibilidade da imprensa e das televisões perde-se num confuso emaranhado de palavras. Cronistas incómodos são mandados embora (sei muito bem do que falo, por experiência própria) e substituídos por uma miuçalha sem grandeza nem decência. Claro que há excepções, mas são tão raras, tão raras…

Uma dessas raridades ocorreu na manhã de terça-feira, nos programas "Discurso Directo", da TVI; e "Opinião Pública", da SIC. Devo dizer que não os perco, como antídoto à enxúndia de manipulações desavergonhadas. Ambos aqueles programas constituíram um desfile de verdades contra as aldrabices do Governo, e contra as despudoradas declarações do Portas. Dezenas de desempregados e outros denunciaram, em ambos os programas (conduzidos por duas excelentes profissionais, que respeito e admiro), as manobras usadas por este Governo para fazer crer que tudo vai no "bom rumo." Não vai. E basta ouvir esta gente para cauterizar o Executivo como um grupo de mentirosos. Um professor catedrático, na SIC, exerceu o seu dever, esclarecendo, através da pedagogia dos factos, o que nos é ocultado.

O escândalo assume proporções que nenhuma razão justifica. Nestes quarenta anos de democracia não assisti a nada de semelhante, nem, sequer, aquela sórdida história do "queijo limiano", urdida pelo católico António Guterres e pelo deputado do CDS, dito Campelo, atinge a altura do desmando actual.

Quando o Portas fala em "aves agoirentas" está a falar em todos aqueles que criticam a mentira organizada como um todo, que tem estruturado a acção política deste malfadado Executivo. Estamos em plena república do faz-de-conta, ante uma monstruosa manipulação de factos que tem desgraçado Portugal e encaminhado a pátria para um beco sem saída, cuja tragédia o próximo Governo terá de enfrentar. Espero é que, desta feita, os responsáveis por este crime nacional sejam levados à justiça e punidos com a severidade exigida.

As quadras da nossa satisfação
José Correia Tavares, um dos nossos intelectuais mais lúcidos, e cuja obra poética marca um destino incomum, "especializou-se", digamos assim, na técnica da quadra, dos géneros mais difíceis da lírica portuguesa. Acaba de publicar, com a chancela da Húmus, uma nova selecção, com o título "Livre do Desassossego", cuja ironia encerra a ternura e a compaixão que o poeta nutre pelo povo. É um regalo para o espírito ler este livro, cujas quadras são tudo menos inócuas ou imparciais. Correia Tavares sabe muito bem o papel que o escritor deve desempenhar, e a sua importante obra encaminha-nos, também, para uma lúdica reflexão. Uma boa, grande leitura, que nos anima nestes tempos sombrios.

IN "JORNAL DE NEGÓCIOS
05/06715


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