12/09/2014

MARTIN FELDSTEIN

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Levar o dinheiro 
de volta a casa

Um crescente número de empresas norte-americanas planeia transferir as suas sedes para a Europa. Estas chamadas "inversões" reduzirão a factura fiscal total dessas companhias, permitindo-lhes escapar às desfavoráveis regras tributárias dos EUA. O que devem então fazer os legisladores norte-americanos?
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A Administração do presidente Barack Obama está a tentar bloquear a inversão corporativa através de medidas administrativas que poderão não ter o aval dos tribunais norte-americanos. Seria muito melhor desenvolver um plano legislativo bipartidário destinado, antes de mais, a eliminar a tentação de transferir as sedes das empresas. Um plano desses, se fosse atractivo para as multinacionais norte-americanas, poderia resultar numa transferência do emprego e da produção para os EUA e em maiores receitas fiscais.

Nos termos da actual legislação, os lucros empresariais nos EUA são tributados a uma taxa de 35% - a maior entre os países da OCDE, onde a média é de 25%. Esse imposto é pago sobre os lucros obtidos nos Estados Unidos e sobre os lucros repatriados obtidos por subsidiárias estrangeiras de empresas norte-americanas.

A título de exemplo, a subsidiária de uma empresa norte-americana que opera na Irlanda paga o imposto irlandês sobre o rendimento colectivo, de 12,5%, sobre os lucros obtidos no país. Se o repatriar após o pagamento dos impostos, paga um imposto de 22,5% (a diferença entre o imposto norte-americano de 35% e o imposto de 12,5% que já pagou ao governo irlandês). Mas se reinvestir os lucros na Irlanda – ou em qualquer outro país – não tem de pagar qualquer outro imposto adicional.

Não é pois de surpreender que as empresas norte-americanas prefiram deixar esses lucros no estrangeiro, aplicados em instrumentos financeiros ou investidos em novas subsidiárias ou nas já existentes. Consequentemente, as empresas dos EUA detém actualmente no estrangeiro cerca de dois biliões de dólares em lucros que nunca foram taxados nos Estados Unidos.

Todos os outros países da OCDE tratam de forma bastante diferente os lucros das suas subsidiárias no estrangeiro, baseando-se no chamado método "territorial" de tributação dos lucros obtidos "lá fora". A título de exemplo, uma empresa francesa que investe na Irlanda paga os 12,5% de imposto corporativo irlandês (IRC), mas depois tem liberdade para repatriar os lucros após impostos a uma taxa de menos de 5%.

O actual sistema fiscal dos Estados Unidos afecta adversamente a economia norte-americana, e de várias formas. O imposto extra que as empresas norte-americanas pagam se repatriarem os seus lucros faz aumentar os seus custos de capital, reduzindo assim a sua capacidade para competirem nos mercados internacionais. As empresas estrangeiras conseguem também superar as ofertas das suas congéneres norte-americanas na aquisição de novas empresas tecnológicas noutros países. E quando uma companhia estrangeira compra uma empresa norte-americana, paga o imposto norte-americano sobre os lucros obtidos nos EUA, mas não sobre os lucros obtidos pelas suas subsidiárias estrangeiras, o que baixa o total da sua factura fiscal.

Uma transição para um sistema territorial de tributação eliminaria as desvantagens com que se deparam as multinacionais norte-americanas e iria incentivá-las a reinvestirem nos EUA os lucros obtidos no estrangeiro, aumentando assim o emprego e os lucros nos Estados Unidos. Uma vez que, actualmente, apenas uma pequena parte dos lucros obtidos no estrangeiro é repatriada, o governo norte-americano perderia poucas receitas fiscais ao mudar para um sistema territorial. Há alguns anos, o Departamento norte-americano do Tesouro estimou que a transição para um sistema territorial reduziria as receitas fiscais provenientes das empresas em apenas 130 mil milhões de dólares ao longo de 10 anos.

Seria igualmente desejável reduzir gradualmente a taxa do imposto corporativo nos EUA, aproximando-o da média de 25% que se aplica na OCDE. Também isso encorajaria a que mais lucros obtidos no estrangeiro entrassem nos EUA.

Atendendo a que as empresas norte-americanas têm grandes volumes de lucros no estrangeiro que nunca foram tributados nos EUA, a transição poderia ser mesmo implementada de uma forma que aumentasse a receita líquida. Em troca da transição para um sistema territorial e da redução da taxa do imposto, o governo federal poderia tributar todos esses lucros passados não taxados, a uma taxa mais baixa e com um pagamento faseado por 10 anos. As empresas teriam então a liberdade de repatriar os seus lucros pré-existentes sem pagarem qualquer imposto adicional, ao passo que os seus futuros lucros obtidos no estrangeiro poderiam, tal como acontece noutros países, ser repatriados mediante o pagamento de um imposto de 5%.

Um imposto de 10% sobre esses lucros existentes e acumulados "lá fora" levaria a um encaixe de cerca de 200 mil milhões de dólares ao longo dos referidos 10 anos. Um imposto de 15% levaria a um encaixe de 300 mil milhões de dólares. A escolha da taxa de imposto faria parte da negociação sobre quanto se deve reduzir a taxa total do imposto sobre o rendimento colectivo cobrada nos EUA.

A título de exemplo, com um imposto de 10%, uma empresa com 500 milhões de dólares de lucros acumulados no estrangeiro incorreria no pagamento de 50 milhões de dólares, a serem pagos em 10 anos. Poderia repatriar 500 milhões de dólares a qualquer momento, sem qualquer pagamento fiscal adicional. Repatriar quaisquer lucros acima de 500 milhões estaria sujeito a um imposto de 5%.

A passagem para um sistema territorial e para um "IRC" mais baixo atrairia as multinacionais norte-americanas, mesmo que tivesse de pagar um imposto entre 10% a 15% sobre os lucros acumulados nos anos anteriores. Se Obama está à procura de uma oportunidade para negociar um acordo bipartidário que fortaleça a economia norte-americana e aumenta o emprego, então deve ponderar seriamente num pacote de reformas desta natureza.

Professor de Economia na Universidade de Harvard e presidente emérito do Departamento Nacional de Investigação Económica nos EUA, presidiu ao Conselho de Assessores Económicos do presidente Ronald Reagan de 1982 a 1984.

www.project-syndicate.org

IN "JORNAL DE NEGÓCIOS"
08/09/14

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