24/09/2014

JORGE FIEL

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Morte ao Estado obeso 
e absolutista!

Arruma para que lado? A pergunta do alfaiate apanhou--me desprevenido. Na verdade, nem agora tenho consciência do lado para que arrumo a fábrica quando visto as calças. É mais ou menos à balda. O casamento da prima Milice foi o pretexto para o meu primeiro fato, um Príncipe de Gales de três peças, castanho com risca vermelha, feito por medida na Gentleman. Quando precisei de um segundo fato, reincidi no local e no padrão. Mas para ficar mais em conta, optei pelo pronto a vestir costumizado: calças 52, com dois dedos ganhos à bainha e casaco 54 com mais três dedos nas mangas. Depois passei para a MacModa, o número 56, e a política de ter sempre no roupeiro dois fatos de meia estação, um cinzento antracite e um azul-ultramarino, da marca Alto.

A Maconde faliu, mas ainda tenho a uso os últimos fatos que lá comprei, há meia dúzia de anos. Os bolsos estão deformados, ganharam um bocado de lustro, mas ainda rompem meias solas, até porque lhes tenho dado pouco uso. O maior problema são os casacos, que estão a ficar apertados. Creio que terei de ir para o tamanho 58 se voltar a ter de comprar fatos.

O Estado Novo estava em últimas exibições quando mandei fazer o primeiro fato, mas lembro-me de andar na faculdade e o nosso país já ser uma jovem democracia e ainda vestir as calças do Príncipe de Gales. Desde essa altura, há cerca de 40 anos, Portugal evoluiu mais do que nos quatro séculos anteriores, mas o sistema político que nos governa manteve-se intacto, apenas com alguns remendos, vãs tentativas de acompanhar a mudança sem mexer no essencial.

O contraste entre os 8% de abstenção nas eleições Constituintes de 1975, os 22% nas Legislativas de 87 e os 66% nas Europeias deste ano é a prova dos nove de que a esmagadora maioria dos cidadãos está divorciada de um sistema político canceroso. E essa doença não se trata com as aspirinas de reduzir o número de deputados (se bem que 230 sejam claramente de mais, dá um deputado por 42 mil eleitores, quando a Alemanha tem um por cada 90 mil, e a Espanha um por cada 60 mil) ou a criação de círculos uninominais - se bem me seja imprescindível devolver aos eleitores a escolha de quem os representa, prerrogativa que agora é dos diretórios partidários.

Os políticos são as pessoas que gerem o nosso dinheiro e os assuntos públicos. Interessa-nos não só mudar a maneira como são eleitos, as regras éticas a que devem obedecer e os mecanismos de controlo da sua gestão, mas também a maneira como está organizado o aparelho de Estado em que se movem.

O escândalo da escola de Monsanto que custou 100 mil euros, foi inaugurada em junho e só funcionou uma semana, pois no entretanto foi fechada, é a prova dos nove da falência e desperdício do Estado centralizado, cego e absolutista que nos governa, tratando-nos como súbditos e não como cidadãos. A eficiência na gestão dos cada vez mais escassos recursos públicos exige uma rápida descentralização que passa pela criação de regiões político-administrativas.

É tão provável o país crescer mantendo este Estado obeso, corrupto e capturado pelas clientelas dos partidos, como o Príncipe de Gales que fiz para o casamento da Milice ainda me servir.

IN "JORNAL DE NOTÍCIAS"
21/09/14


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