18/09/2014

FILIPE ALVES

.




Quem tramou o 
Novo Banco?

Na altura em que escrevo estas linhas, a venda rápida do Novo Banco é uma inevitabilidade.

Se o banco não for vendido no curto prazo, o risco para o Estado e para o sistema bancário será cada vez maior. Mas nem sempre foi assim: o Novo Banco poderia ter sido uma estória completamente diferente, se o Governo e o Banco de Portugal (BdP) quisessem.

Recuemos um pouco no tempo, para melhor analisar o que está em causa. Até porque há duas questões a que as autoridades ainda não responderam com clareza.

A primeira é o porquê de se utilizar o Fundo de Resolução para resgatar o BES, quando existia a alternativa da capitalização por instrumentos híbridos convertíveis (‘CoCo bonds'), como foi feito no BCP (três mil milhões), BPI (1,3 mil milhões) e na própria CGD (900 milhões). Estes bancos também tinham créditos "tóxicos", mas não foi necessário retalhá-los em "bons" e "maus".

A solução foi simples e eficaz: o Estado injectou dinheiro e cobrou um juro considerável (cerca de 9% ao ano). Em troca, os bancos têm feito a sua parte: colocando a casa em ordem e, a custo, reembolsando as ‘CoCo bonds'. Sob o olhar atento do Estado, que tem uma palavra a dizer.

Apesar do sucesso destas capitalizações realizadas no auge da crise, o Governo e o BdP alegam que tal não seria possível no BES, devido às novas regras europeias e ao facto de a capitalização por ‘CoCo bonds' expôr o Estado ao risco dos bancos. Haverá também outra razão, que é o facto de o Novo Banco não conseguir pagar um juro de 9% sobre 4,9 mil milhões.

Desta forma, a capitalização por ‘CoCo bonds', durante anos propagandeada como ideia genial que até trazia lucros ao Estado, depressa passou de bestial a besta. O que era bom para o Estado no BCP e no BPI, deixou de servir para o BES, disseram-nos. Explicação difícil de entender, dado que o mesmo Governo que alterou leis num fim-de-semana, para viabilizar a resolução, também poderia, se quisesse, encontrar soluções que permitissem os ‘CoCo bonds'.

O Governo e o supervisor optaram, em vez disso, pela divisão do BES em dois bancos, o "bom" (Novo Banco) e o "mau" (BES, S.A.). O primeiro foi transferido para o Fundo de Resolução (entidade pública tutelada pelas Finanças) e o segundo ficou nas mãos dos accionistas do "velho" BES.

E que vemos seis semanas depois?

Vemos que a opção pela resolução pode fazer com que o banco "bom" se transforme em "mau". Assim, em vez de um banco "mau", ficaríamos com dois bancos "maus". E porquê?

Porque com a resolução, o Novo Banco foi colocado em gestão corrente e impedido de competir verdadeiramente com os outros bancos, que, compreensivelmente, não aceitam contribuir para um fundo público que sustente um concorrente directo.

Tornou-se assim um alvo fácil, sendo toureado pelos concorrentes, que lhe ‘roubam' clientes e quadros. Isto porque Vítor Bento precisava do ‘OK' do Banco de Portugal para as decisões mais comezinhas, desde o reembolso de obrigações à aprovação de linhas de crédito para empresas.´
Independentemente da responsabilidade de Vítor Bento - e de concordarmos ou não com a forma como abandonou o barco - a verdade é que o Novo Banco foi asfixiado no berço. Como a borboleta que o simboliza, foi condenado a uma existência efémera.

O que nos leva à segunda questão. Porque é que as autoridades optaram pela venda rápida do banco?
Os outros bancos - incluindo os que querem comprar o Novo Banco a preço de saldo - têm interesses legítimos a defender, mas, até à data, o Estado é, de longe, o maior contribuinte do Fundo e quem mais tem a perder. Assim, porque não deu tempo e poder a Vítor Bento para valorizar o Novo Banco o mais possível?

IN "DIÁRIO ECONÓMICO"
15/09/14

.

Sem comentários:

Enviar um comentário