16/08/2014

ANA BACALHAU

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Vilar de Mouros 


 Nos anos 1960, nos Estados Unidos, o choque geracional entre pais e filhos levou a que os últimos escolhessem uma vida que em tudo se opunha às expectativas que a geração anterior tinha para si, gritando bem alto o lema «Paz e Amor» em tempo de guerra no Vietname.

Obviamente que, mesmo resistindo a um mundo cheio de regras, não deixaram de utilizar o que de melhor a civilização tinha para oferecer. Os carros, os rádios, a electricidade, tudo comodidades indispensáveis a um modo de vida que fazia da música um dos seus mais altos estandartes.

A ligação entre uma certa simplicidade de vida, baseada num sentido comunitário forte e a música ligada à corrente deu vida ao conceito de festival de música, feito no Verão e inserido num espaço verde perto de alguma aldeia ou vila. Se Monterey Pop Festival foi o primeiro a apresentar ao mundo alguns dos músicos mais importan­tes da década, Woodstock foi o mais marcante, ditando as regras do que viria a ser o festival de música em conceito e na prática.
Em Portugal, tentava romper-se com algo mais do que con­venções e ditames. A ditadura não permitia as liberdades essen­ciais ao modo de vida «made in USA», mas, com a morte de Sala­zar, no início da década de 1970, começaram a perceber-se os pri­meiros sinais de que já não estaria tão forte.

Foi nesta conjuntura que se organizou o primeiro festi­val de música no país, mais propriamente, em Vilar de Mouros, no Alto Minho. A segunda edição só viria a ser realizada 11 anos de­pois, em 1982 e, desde então, o festival mais antigo em Portugal foi organizado de forma intermitente até 2006. Pelo palco passa­ram alguns dos nomes mais importantes do rock, pop e da música popular portuguesa. Para além da música, uma das mais-valias do festival é a sua localização, junto ao rio Coura, rodeado pelos in­contáveis tons de verde que se espalham paisagem fora, apenas cortados pelas tendas dos campistas-festivaleiros.

Desde então, já quase não se consegue contar pelos dedos da mão os festivais de música portugueses que seguem a ideia e o ambiente de Vilar de Mouros. O Festival Sudoeste, o Bons Sons, Paredes de Coura, são alguns dos maiores.
Uma das coisas mais importantes para quem se apresenta em cima de um palco é ter à sua frente um público que esteja aten­to à música. Por isso, para além das boas condições técnicas é essencial acrescentar um ambiente propício à fruição dos concer­tos e um público aberto a descobrir novas propostas musicais. É já histórico o ambiente de liberdade e comunhão que se viveu na primeira edição do Festival Vilar de Mouros, pelo que quando se marcou o concerto de Deolinda para a edição de 2014, a possibilidade de podermos participar num pedaço da história da música portuguesa deixou-nos muito felizes.

Passeámos pelo recinto, vimos o palco original (aque­le onde tocou Elton John e os U2), que agora é o palco secundário, passámos a ponte romana que dá para o parque de campismo. Só não demos um mergulho no rio, porque o tempo não o permitiu.

Ao cair da noite, terminávamos a nossa prestação e saía­mos com um sorriso. O regresso do Woodstock português não esqueceu o ambiente comunitário e acolheu propostas tão dife­rentes quanto Deolinda, The Legendary Tigerman, Xutos, Tricky e Guano Apes. E como o espírito de partilha se estende a todos os que por lá passam, tivemos o prazer de ter em palco, para tocar uma canção connosco, Paulo Furtado ou The Legendary Tigerman.

Foram momentos bonitos que saudaram o regresso do pai dos festivais de música portugueses.


IN  "NOTÍCIAS MAGAZINE"
10/08/14


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