13/05/2014

FRANCISCO SARSFIELD CABRAL

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Optimismos perigosos


Está em curso uma retoma do consumo privado, que estimula a economia, mas será insustentável se o investimento empresarial não recuperar

 Há duas semanas informava o SOL estarem esgotados os voos charter para o estrangeiro no período da Páscoa. Os voos low cost para a Eurodisney em Paris, para o Brasil, para as Caraíbas, etc., esgotaram-se mais de um mês antes da Páscoa. Nas agências de viagens as reservas subiram este ano 20%, 30% ou mesmo 40%.

“A classe média está a voltar a viajar”, comentou ao SOL o presidente da Associação Portuguesa de Agências de Viagens e Turismo. Os que viajam serão apenas uma parte da classe média. Mas é curioso que tantos voem para férias longe do país, quando se diz que a austeridade teria liquidado a classe média.
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Entretanto, no primeiro trimestre deste ano as vendas de carros em Portugal tiveram o maior aumento de toda a União Europeia - mais de 40%, comparando com o primeiro trimestre de 2013. É certo que há um ano a venda de carros registava valores baixos e que ainda hoje é inferior ao que era há anos atrás. Mas queremos regressar à situação absurda de sermos o terceiro país europeu com maior número de automóveis ligeiros por cada cem habitantes, a seguir ao Luxemburgo e à Itália, quando nem de longe somos a terceira nação mais rica da UE?

Em 2013 a subida dos impostos mais do que compensou a reposição, ordenada pelo Tribunal Constitucional, dos subsídios de férias e Natal dos funcionários públicos e pensionistas. Por isso o rendimento disponível médio das famílias continuou a descer. Cortando no consumo, a taxa de poupança das famílias subiu para 12,6% desse rendimento - mas este ano já baixou.

Está em curso uma retoma do consumo privado, que estimula a economia, mas será insustentável se o investimento empresarial não recuperar. O indicador do Banco de Portugal sobre o consumo atingiu em Março passado o valor mais alto desde Agosto de 2010. A expansão do consumo privado já ultrapassa o crescimento global da economia.

O apertar do cinto feito pelas famílias foi bem superior ao realizado pelas empresas e pelo Estado. Por isso é normal, agora, alguma retoma do consumo, desde que não se entre de novo em exageros despesistas - a recuperação económica é modesta.

O risco será agravado se, como aconteceu na fase que quase nos levou à bancarrota, se multiplicarem os sinais errados no espaço público. Por exemplo, o CDS tem criado expectativas pouco sensatas sobre o significado prático da saída da troika e insiste em baixar impostos.

O Presidente da República apelou a que, agora com a economia a crescer, se corrijam injustiças da austeridade. Mas, se existe alguma folga (o que é duvidoso, até porque o Tribunal Constitucional ainda não se pronunciou), ela deveria ser encaminhada para os mais pobres e os desempregados, não para quem tem rendimentos acima da média.

E o PS acusa o Governo de querer um 'Estado mínimo', quando a despesa pública continua a subir. Os socialistas opõem-se a cortes nessa despesa, afirmando ao mesmo tempo que cumprirão as estritas regras de eliminação do défice impostas pelo Tratado Orçamental, que o PS apoiou...

Há evoluções económicas e financeiras positivas em Portugal. Mas temos as empresas mais endividadas da Europa e a dívida pública ultrapassará em breve 130% do PIB. Os credores só nos financiarão a juros razoáveis se não tornarmos insustentável essa dívida. Cuidado com os optimismos irrealistas ou eleitoralistas.

IN "SOL"
09/05/14


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